25 de fevereiro, de 2021 | 15:51
MPMG pede na Justiça extinção da Fundação Renova
Divulgação CBMMG
Distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, é o "marco" da destruição provocada pela catástrofe da mineração em 2015
Distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, é o "marco" da destruição provocada pela catástrofe da mineração em 2015
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ajuizou Ação Civil Pública pedindo a extinção da Fundação Renova, instituída em 2016 para gerir e executar medidas previstas nos programas socioeconômicos e socioambientais estabelecidos no Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) em decorrência do desastre ambiental com o rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, ocorrida em novembro de 2015.
Conforme a ação, a fundação vem atuado muito mais como um instrumento de limitação da responsabilidade das empresas mantenedoras (Vale e BHP Billiton) do que como agente de efetiva reparação humana, social e ambiental.
O MPMG explica que, devido aos problemas de governança da entidade, traduzidos em desvio de finalidade e ineficiência - a prestação de contas da fundação foi rejeitada por quatro vezes -, o MPMG pede ainda, em caráter liminar, a intervenção judicial com a nomeação de uma junta interventora para exercer a função de conselho curador, incluindo um desenho institucional de transição.
É urgente a situação de perigo e de risco ao resultado útil do processo em razão da ineficácia dos programas geridos pela entidade, dos desvios de finalidade, como as propagandas enganosas praticadas e outras práticas ilícitas e inconstitucionais”, diz um trecho da ação.
O MPMG pede também que as empresas Samarco, Vale e BHP sejam condenadas à reparação dos danos materiais causados no desvio de finalidade e nos ilícitos praticados dentro e por intermédio da fundação, com a frustração dos programas acordados no TTAC, além de condenação por danos morais no valor de R$10 bilhões.
Irregularidades
Para o MPMG, no modelo por intermédio do qual a fundação está estruturada e em funcionamento, sem independência e autonomia e com práticas de desvios de finalidades, é evidente a sua ilicitude constitucional e legal e impossível a sua manutenção. Para se ter ideia, as ações em curso pela fundação consumiram até o momento um valor superior a R$10 bilhões, mas seguem sendo executadas com excessivo atraso e baixíssima eficácia”, enfatiza a ação.
Para o MPMG, é inconcebível que uma fundação funcione sem autonomia e independência, que são princípios que devem caracterizar a criação, a existência e o funcionamento de uma Fundação. Era para a fundação funcionar como se fosse uma instituição social, autônoma e independente, sem fins lucrativos, e canal de acesso à justiça na reparação e compensação dos gravíssimos danos sociais e ambientais causados pelo rompimento da Barragem do Fundão”, reforça outro trecho da ação.
Na prática, segundo o MPMG, a fundação, em suas decisões, é comandada pelas empresas responsáveis pelos ilícitos e pelos graves danos sociais e ambientais causados, Samarco, vale e BHP. É como se fosse autorizado que os acusados no processo penal e nos processos coletivos em geral pudessem decidir e gerir os direitos e as garantias fundamentais das suas próprias vítimas”, comparam os promotores de Justiça que assinam a ação, Gregório Assagra e Valma Leite.
Além disso, não obstante os altos salários praticados na fundação aos seus dirigentes, o que em tese deveria corresponder a um trabalho realizado com excelência, a entidade sempre teve dificuldades de gestão, até mesmo em observar simples regras previstas em seu estatuto fundacional, como o envio, dentro do prazo, de atas de reuniões de seus conselhos para análise e eventual aprovação pelo Ministério Público.
Entenda
No dia 2 de março de 2016, os entes federativos União, Estado do Espírito Santo e Estado de Minas Gerais firmaram, com as empresas Samarco Mineração S/A, Vale S/A e BHP Billiton Brasil Ltda., o Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC).
O termo estabeleceu 42 programas voltados à reparação socioambiental e socioeconômica dos territórios afetados em 40 municípios, inclusive o Vale do Aço, em um trecho de aproximadamente 650 km de extensão, o que foi ratificado pelo Termo de Ajuste de Conduta (TAC Governança), assinado em 2018 entre os signatários do TTAC, o Ministério Público Federal, os Ministérios Públicos Estaduais de Minas Gerais e Espírito Santo, as Defensorias Públicas da União e dos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo. Foi a partir do TTAC que o Poder Público e as empresas responsáveis pelo dano instituíram a Fundação Renova.
Rompimento e danos
O desastre, ocorrido em 5 de novembro de 2015, despejou mais de 44 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração na bacia do rio Doce, que seguiram o curso dos rios Gualaxo do Norte, Carmo, Piranga e Doce, em uma avalanche que, além de provocar a morte de 19 pessoas, arrasou rios e nascentes, dizimou parte da flora e fauna, destruiu vilas e comunidades, incluindo casas, empresas, hotéis, patrimônios públicos e históricos.
Foram atingidos 680 quilômetros desde o subdistrito de Bento Rodrigues, em Minas Gerais, até oceano Atlântico em Regência, no Espírito Santo. No mar, a lama com rejeitos de mineração, se espalhou, e atingiu a vida marinha numa área de 40 quilômetros quadrados. Deixou danos sociais e ambientais com extensão inédita no país e no mundo”, conclui a nota do MPMG.
Fundação anuncia que vai contestar
Em nota, a Fundação Renova informou que discorda das alegações feitas pelo MPMG relacionadas às contas da instituição e informa que vai contestar nas instâncias cabíveis o pedido de intervenção proposto em Ação Civil Pública.
Ainda segundo a nota, além da prestação de contas realizadas anualmente, a Fundação informa que também encaminha ao MPMG as respectivas aprovações de suas contas feitas pelo Conselho Curador, pelo Conselho Fiscal e pela empresa independente responsável pela auditoria das demonstrações financeiras, conforme prevê a Cláusula 53 do TTAC.
"As contas da Fundação Renova são ainda verificadas por auditorias externas independentes, que garantem transparência no acompanhamento e fiscalização dos investimentos realizados e dos resultados alcançados. As contas da Fundação foram aprovadas por essas auditorias", esclarece o texto.
Veja a íntegra da nota
A Fundação Renova discorda das alegações feitas pelo Ministério Público de Minas Gerais relacionadas às contas da instituição e informa que irá contestar nas instâncias cabíveis o pedido de intervenção proposto em Ação Civil Pública nesta quarta-feira (24).
Além das prestações de contas realizadas anualmente, a Fundação também encaminha ao MPMG as respectivas aprovações de suas contas feitas pelo Conselho Curador, pelo Conselho Fiscal e pela empresa independente responsável pela auditoria das demonstrações financeiras, conforme prevê a Cláusula 53 do TTAC.
As contas da Fundação Renova são ainda verificadas por auditorias externas independentes, que garantem transparência no acompanhamento e fiscalização dos investimentos realizados e dos resultados alcançados. As contas da Fundação foram aprovadas por essas auditorias.
A respeito do questionamento do MP relacionado ao superávit da Fundação Renova em 2019, é importante esclarecer que é recomendável que instituições do terceiro setor trabalhem com superávit, indicador de que o trabalho está sendo realizado de forma qualificada e técnica. No caso da Fundação Renova, o valor relativo ao superávit é reaplicado nas ações de reparação do ano seguinte.
Sobre a remuneração de seus executivos, a Fundação Renova esclarece que adota uma política de mercado, com valores compatíveis com as responsabilidades assumidas. Importante esclarecer que os valores aportados pelas mantenedoras para o custeio da fundação (salários e custos administrativos) não comprometem e não são contabilizados nos valores destinados à reparação e compensação dos danos causados pelo rompimento de Fundão.
Cabe ressaltar que a Fundação Renova é responsável pela mobilização para a reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, cujo escopo engloba 42 programas que se desdobram nos projetos que estão sendo implementados nos 670 quilômetros de área impactada ao longo do rio Doce e afluentes e em ações de longo prazo. Cerca de R$ 11,8 bilhões foram desembolsados pela Fundação Renova até o momento, tendo sido pagos R$ 3,26 bilhões em indenizações e auxílios financeiros para 320 mil pessoas até janeiro deste ano.
As indenizações ganharam novo impulso com o Sistema Indenizatório Simplificado, implementado pela Fundação Renova a partir de decisão da 12ª Vara Federal em ações apresentadas por Comissões de Atingidos dos municípios impactados. Ele tem possibilitado o pagamento de indenização a categorias com dificuldade de comprovação de danos. O primeiro pagamento por meio do sistema foi realizado em setembro. Até o início de fevereiro de 2021,mais de 5 mil pessoas foram pagas pelo Sistema Indenizatório Simplificado. O valor ultrapassou R$ 450 milhões.
Reparação
A Fundação Renova permanece dedicada ao trabalho de reparação dos danos provocados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), propósito para o qual foi criada.
As obras dos reassentamentos têm previsão de desembolso de R$ 1 bilhão para 2021, um aumento de 14% em relação ao ano anterior. O valor refere-se a todas as modalidades de reassentamento, englobando as construções dos novos distritos de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Gesteira, e, também, a modalidade de reassentamento Familiar e a reconstrução de residências em comunidades rurais. O avanço da infraestrutura, priorizado dentro do plano estratégico de prevenção contra a Covid-19, permitirá a aceleração da construção das residências das famílias atingidas. Assim, os reassentamentos coletivos ganham desenhos de cidades planejadas.
A questão do prazo de entrega dos reassentamentos está sendo discutida em um Ação Civil Pública (ACP) em curso na Comarca de Mariana, tendo sido submetido recurso para análise em segunda instância (TJMG), o qual ainda aguarda apreciação e julgamento. Nesse contexto, foram expostos os protocolos sanitários aplicáveis em razão da Covid-19, que obrigaram a Fundação a desmobilizar parte do efetivo e a trabalhar com equipes reduzidas, o que provocou a necessidade de reprogramação das atividades. A água do rio Doce pode ser consumida após passar por tratamento convencional em sistemas municipais de abastecimento. Além disso, foram recuperados 113 afluentes, pequenos rios que alimentam o alto rio Doce. Cerca de 888 nascentes estão com o processo de recuperação iniciado. Até o momento, as ações de restauração florestal alcançam mais de 1.000 hectares em Minas Gerais e no Espírito Santo, uma área equivalente a 1.000 campos de futebol.
Na área de saneamento, 9 municípios iniciaram obras para tratamento de esgoto e resíduos sólidos com recursos repassados pela Fundação Renova. Estão previstos R$ 600 milhões para projetos nos 39 municípios impactados.
Em 2020, a Fundação iniciou um repasse de R$ 830 milhões aos governos de Minas Gerais e do Espírito Santo e prefeituras da bacia do rio Doce, para investimentos em infraestrutura, saúde e educação. Esses recursos promoverão a reestruturação de mais de 150 quilômetros de estradas, de cerca de 900 escolas em 39 municípios e do Hospital Regional de Governador Valadares (MG), além de possibilitar a implantação do Distrito Industrial de Rio Doce (MG).
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