18 de maio, de 2024 | 12:00

O ineficiente revide brasileiro: a PEC das Drogas

Guilherme de Castro Resende *


O período atual é de polarização. A palavra dos últimos anos é repetida constantemente em qualquer roda de conversa, virtual ou física. Fale algumas frases sobre qualquer assunto e logo será tachado ou elogiado por ser de um espectro ou outro da política. Contudo, embora vários da esquerda tenham sido contra, outros vários, com a direita, uniram-se e aproveitaram-se da situação para conquistarem eleitores e seguidores na chamada PEC das Drogas. A PEC 45/2023 é uma maneira enganosa de persuadir os insipientes, por meio do chamado “backlash jurídico”, isto é, de um revide parlamentar contra medidas ditas liberalizantes do Poder Judiciário.

A PEC das Drogas foi colocada em pauta por iniciativa do presidente do Senado Federal (SF), Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para criminalizar o consumo de drogas no país. Por ser uma PEC, ou seja, um projeto de emenda à constituição, sua intenção aparente é positivar a posse como crime na Carta Magna; porém, sua intenção profunda é contrariar um julgamento ainda não finalizado no Supremo Tribunal Federal (STF). Esse revide, abraçado por senadores da esquerda e da direita, demonstra que a ineficiência é generalizada.

Enfrentando o STF, o senador Pacheco mira afagar a direita, talvez para eleger seu sucessor na presidência da Casa, ou para receber votos da direita na próxima eleição do seu estado. Seja qual for o motivo, o mineiro mira interesses exclusivamente privados em detrimento de um bom debate público a respeito de um tema grave como esse. A esquerda, contrariando seu histórico, talvez tenha se acovardado diante de alguma pressão das redes sociais, ou tenha simplesmente entrado na onda de atacar simploriamente o Supremo.

As “notícias” no Whatsapp aduzem que o STF está para legalizar as drogas no Brasil. Se acredita nisso, volte duas casas. O porte de drogas para consumo pessoal já é despenalizado desde 2006! A lei 11.343/2006 traz, em seu artigo 28, penas alternativas à prisão para aquele que consome drogas. Todavia, a legislação não apresenta padrão algum diferenciador entre consumo e tráfico, o que gera, na prática, situações esdrúxulas, como um filho de desembargadora com quilos de cocaína livre, leve e solto, mas um suburbano negro com gramas de maconha preso e sem julgamento. Esses eventos acontecem, porque, embora a lei diferencie o usuário do traficante, ela não contém um critério objetivo e claro para essa diferença. No dia a dia, o policial e o juiz definirão o status do cidadão.

A defensoria pública de São Paulo, patrona do recurso ao STF, argumenta que o artigo da lei antidrogas contraria princípios fundamentais da Constituição, por isso, a competência do STF. O presidente do Supremo, Ministro Barroso, expressamente colocou que “legalizar as drogas é uma decisão que cabe ao Poder Legislativo, e não ao Poder Judiciário”. Ou seja, não é o STF que retirou a pena de prisão para o usuário de drogas, foi exatamente o Poder Legislativo no começo do século. O Judiciário, nesse caso, de forma provocada, e não por ingerência, responde a uma problemática pública que não foi resolvida pelos outros Poderes.

O Poder Legislativo, com sanção do Executivo, estabeleceu o regramento do porte de drogas, entretanto, omitiu-se quanto a um critério que distinga traficante de usuário. Por enquanto, com o placar de 5 a 3 para se definir esse critério, o Ministro Toffoli pediu vista, suspendendo o processo temporariamente.
“As falsas notícias sobre ingerência do Poder Judiciário nesse assunto não prosperam nas mentes dos mais cuidadosos, seja da direita, seja da esquerda”


As falsas notícias sobre ingerência do Poder Judiciário nesse assunto não prosperam nas mentes dos mais cuidadosos, seja da direita, seja da esquerda. O Supremo age, ao ser provocado, com base nos fundamentos constitucionais, não podendo, nem devendo legislar.

Uma discussão científica a respeito dos efeitos perniciosos, como os do álcool; ou dos efeitos benéficos, como no uso compassivo para depressão, convulsão e ansiedade; ou das rendas auferidas com a geração de impostos do comércio legal; ou até da diminuição do mercado paralelo do tráfico, pode e deve ser realizado amplamente pela sociedade.

Direita, esquerda, centro, todos precisam debater, principalmente na Casa de representação do povo, que é a Câmara, uma solução para a crise de saúde e criminalidade que enfrentamos com o assunto droga. Há argumentos bons de todos os lados, argumentos embasados.

Até a direita mais conservadora norte-americana percebeu que a lei seca da maconha é contraproducente.

Especificamente, a parcela do agro do Meio Oeste dos EUA percebeu que plantar a cannabis tem recuperado cidades empobrecidas, gerado emprego e renda. Até Trump gagueja ao falar de maconha, porque poderia perder esses eleitores conservadores.

Países considerados desenvolvidos, como EUA, Espanha, Holanda, Portugal, vêm alterando suas legislações de olho na próspera indústria de cosméticos, de tecido, farmacêutica; além de terem compreendido a falência da política de guerra às drogas. O Brasil, novamente, afasta-se da vanguarda mundial ao não discutir qual é a melhor política sobre o assunto, dando vazão a notícias falsas e a manipulações eleitoreiras que atrasam a todos, da direita e da esquerda.

* Professor e Advogado do escritório Jayme Rezende, com canal no youtube direito de prosa.

Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço

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