13 de maio, de 2022 | 17:04

Mulher é resgatada em condições análogas ao trabalho escravo

Auditoria Fiscal do Trabalho/Divulgação
Idosa resgatada dormia em um sofá na antessala do quarto da empregadora, de quem era cuidadoraIdosa resgatada dormia em um sofá na antessala do quarto da empregadora, de quem era cuidadora

Um caso de trabalho escravo foi registrado no Rio de Janeiro. Uma mulher de 84 anos foi resgatada após 72 anos trabalhando como empregada doméstica para três gerações de uma mesma família. Nesse período, ela cuidou da casa e de seus moradores, todos os dias, sem receber salário, segundo a fiscalização.

De acordo com dados do Ministério do Trabalho e Previdência, essa é a mais longa duração de exploração de uma pessoa em escravidão contemporânea desde que o Brasil criou o sistema de fiscalização para enfrentar esse crime em maio de 1995. Nos últimos 27 anos, foram mais de 58 mil resgatados pelo poder público.

A ação de fiscalização começou em 15 de março e ainda não terminou, uma vez que está em negociação o pagamento dos salários e direitos atrasados. Mas configurou a situação como trabalho análogo ao de escravo.

O resgate foi coordenado pela Auditoria Fiscal do Trabalho no Rio e contou com a participação do Ministério Público do Trabalho e do programa Ação Integrada, que garante atendimento psicossocial. Ela está em um abrigo público sob acompanhamento desde a semana passada.

De acordo com a fiscalização, seus pais trabalhavam em uma fazenda no interior do estado. Aos 12 anos, ela se mudou para a residência do casal proprietário para realizar serviços domésticos. Quando faleceram, migrou para a casa da filha deles, onde manteve suas atividades, incluindo o cuidado com as crianças.

Hoje, atua como cuidadora da empregadora, apesar de ambas terem idade semelhante. Ao todo, serviu três gerações da família, uma vez que, na residência na Zona Norte da cidade, também reside o neto dos patrões originais.

O Ministério Público do Trabalho no Rio informa que o procedimento sobre o caso está em tramitação e não pode repassar informações, por enquanto, para não prejudicar a investigação.

Vizinhos confirmaram que ela era tratada como empregada doméstica pelos moradores da casa e não como um membro da família, como eles defendem. A fiscalização também ouviu a irmã e uma sobrinha da trabalhadora, que confirmaram a relação de emprego e contaram que ela havia se mudado com a família para o Rio sob a esperança de estudar ainda pequena. Segundo elas, o empregador controlava visitas e telefonemas, dificultando o contato com o mundo externo.

De acordo com o auditor fiscal do trabalho, Alexandre Lyra, que coordenou a ação, os empregadores afirmaram que os serviços domésticos não eram trabalho, mas uma colaboração voluntária no âmbito familiar. “Em casos como este ouvimos sempre a afirmação de que a vítima é ‘como se fosse da família’. Mas para essa pessoa da família não foi permitido estudo, nem laços de amizade externos ou mesmo conduzir a própria vida. Essa pessoa da família dorme em um sofá, em um espaço improvisado como dormitório em uma antessala do quarto da empregadora, de quem ela era cuidadora”, diz.

Outras cinco vítimas
Dos resgatados pelos grupos especiais de fiscalização móvel desde o início do ano, cinco mulheres estavam em trabalho escravo doméstico nos Estados do Rio Grande do Sul, Paraíba, Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Há outras ações em andamento.

Das 1.937 pessoas em situação de escravidão resgatadas no país em 2021, 27 vítimas estavam no serviço doméstico. Em 2020, haviam sido apenas três.

Ao contrário do trabalho para exploração econômica, como aquele em fazendas de gado e carvoarias, que costumam durar o tamanho de uma empreitada, ou seja, de meses a alguns poucos anos, é comum que casos de escravidão doméstica registre longos períodos de relacionamento entre patrões e empregados.

Casos como o de uma mulher de 89 anos resgatada em Santos (SP) e outra, de 61 anos, libertada em Salvador (BA), após terem permanecido 50 anos na escravidão doméstica, têm sido cada vez mais comuns. Não que o crime esteja aumentando, mas as repercussões dos casos levam a novas denúncias.

Uma das ações em andamento foi o caso de uma mulher que trabalhou por 32 anos como empregada doméstica, resgatada da residência de um pastor em Mossoró (RN). Segundo fiscais do trabalho, ela chegou ao local ainda adolescente, com 16 anos, e sofreu abuso e assédio sexual do empregador.

“Em razão da grande repercussão do resgate da trabalhadora doméstica Madalena Gordiano no final de 2020 em Patos de Minas, o número de denúncias aumentou”, afirmou o auditor fiscal Maurício Krepsky, chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) das Secretaria de Inspeção do Trabalho.

Nesta quinta (12), o Ministério Público Federal denunciou quatro membros de uma mesma família por reduzir Madalena à condição análoga à de escravo durante 38 anos, mas também por violência doméstica e roubo.

“A gente tem impressão que são gerações de mulheres que viveram as mesmas coisas e, hoje, estão vindo à tona o tempo todo. Vemos as histórias se repetindo, muitas vezes com os mesmos nomes, a mesma idade, a mesma cor”, afirma Yasmim França, do projeto Ação Integrada.

Apuração completa em: Mulher é resgatada após 72 anos de trabalho escravo doméstico no Rio
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