10 de dezembro, de 2025 | 08:50
Dia Internacional dos Direitos Humanos expõe desafios para garantir dignidade no Vale do Aço
Para defensora pública, a prática dos direitos humanos deve ser uma escolha e há pessoas não conseguem ver a humanidade no que é diferente de nós”
Arquivo DA
A população em situação de rua é uma das camadas da sociedade que precisa de um olhar mais atento quanto aos direitos humanos
A população em situação de rua é uma das camadas da sociedade que precisa de um olhar mais atento quanto aos direitos humanosPor Matheus Valadares - Repórter Diário do Aço
Nesta quarta-feira (10) é celebrado o Dia Internacional dos Direitos Humanos. Embora as normas tenham o objetivo de reconhecer e proteger a dignidade de todos os seres humanos, no Brasil é recorrente a banalização dos direitos humanos, visto equivocadamente como algo que está em prol de condenados e desordeiros.
Os envolvidos no movimento, entretanto, dizem que os direitos humanos estabelecem obrigações para os governos protegerem e proverem o mínimo necessário para uma vida digna, além de preverem direitos sociais, econômicos e culturais. Mesmo assim, as violações às mais diversas garantias universais permanecem em todo o país, e no Vale do Aço não é diferente.
Em Coronel Fabriciano, um levantamento da Secretaria de Governança de Assistência Social feito a pedido da reportagem Diário do Aço mostra que negligência, violência psicológica, violência física, violência sexual e violência patrimonial continuam como os tipos de violações mais atendidos pela rede socioassistencial entre 2024 e 2025.
Segundo os dados do município, foram registrados 441 casos de negligência, 381 de violência psicológica, 334 de violência física, 186 de violência sexual e 58 de violência patrimonial nos dois anos. As ocorrências atingem perfis distintos: pessoas idosas concentram os casos de negligência e violência patrimonial; adultos, especialmente mulheres em situação de violência doméstica, aparecem com maior frequência em registros de violência psicológica e física; já crianças e adolescentes representam a maior parte das vítimas de violência sexual.
Aumento de demandas
Entre as demandas que têm aumentado nos últimos anos, a rede destaca o crescimento de atendimentos mais complexos, marcados por múltiplas vulnerabilidades, envolvendo negligência associada a uso abusivo de álcool e drogas, transtornos mentais, abandono e pobreza extrema. Outros pontos de atenção incluem o aumento da violência de gênero, a solicitação de acolhimento institucional para idosos, o trabalho infantil e a ampliação do envolvimento de adolescentes com uso e tráfico de drogas. Ainda segundo a pasta, as violações de direitos nas famílias, cada vez mais têm sido marcadas pelo uso abusivo de álcool e outras drogas.
Garantia de direitos
É nesse cenário que a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) desempenha papel central na garantia de direitos no Vale do Aço. A instituição aponta situações típicas que ajudam a compreender o estado dos direitos humanos na região.
A gente está vendo muito, não só na Defensoria de Ipatinga, como na realidade brasileira, a violação dos direitos da mulher, principalmente por seus companheiros. Isso é algo que principalmente a Defensoria de Famílias enfrenta muito aqui. A gente também enfrenta episódios da violência institucional, especialmente relacionadas com o sistema prisional. As casas prisionais aqui da região estão superlotadas, faltam alguns espaços adequados”, listou a defensora pública Marina Nogueira de Almeida, natural do Rio Grande do Sul, mas que atua na unidade de Ipatinga desde março deste ano.
Divulgação
Defensora pública que atua no Vale do Aço destaca desafios na garantia de direitos para todos os humanos
Defensora pública que atua no Vale do Aço destaca desafios na garantia de direitos para todos os humanosEu tenho reparado, desde que cheguei, que tem uma resistência muito grande em relação à população em situação de rua e aos seus direitos. Eu vejo uma visão de nós contra eles. Nós estamos aqui, somos cidadãos, e eles são os outros. Tem que fazer internação compulsória, tem que prender, tem que mandar para outras cidades, porque eles não são daqui. Tem um discurso que não reconhece essa população como titular de direitos. Um ponto que na região me é bastante marcante é a questão da violação ao direito humano a um meio ambiente adequado, porque aqui na região a gente tem uma usina, a gente sabe da importância, gera empregos, mas também tem um impacto ambiental grande”, acrescentou a defensora.
Ela também citou que a instituição teve um importante papel na defesa dos atingidos pelo rompimento da barragem do Fundão, em Mariana, em 2015.
Algumas demandas exigem resposta imediata, especialmente quando envolvem risco iminente à integridade física, violências graves, ameaça à moradia ou privação de direitos essenciais.
As situações mais urgentes são, naturalmente, as que envolvem risco à integridade. Pode haver alguma situação nesse sentido no sistema prisional, também em relação a mulheres vítimas de violência e alguma questão que proteja o patrimônio delas e o dos filhos, uma ação de alimentos com uma certa urgência. E também questões de saúde que demandem um atendimento mais imediato, porque a pessoa pode estar correndo algum tipo de risco se não receber o tratamento de saúde adequado que ela precisa”, explica Marina.
Orientação e educação
A instituição afirma ainda que desenvolve ações voltadas à orientação jurídica, educação em direitos e apoio a grupos vulneráveis, e que o trabalho não se restringe à via judicial.
Eu posso citar como exemplos o Defensoria nas Escolas, que é uma atuação que a Defensoria Pública vai até as escolas públicas e particulares da região, cada vez com uma palestra sobre um tema diferente. Em agosto a gente fez palestras relativas ao direito das mulheres, por exemplo. Tem o Direito a Ter Pai, que é um mutirão que a gente busca garantir a dignidade da pessoa humana por meio de exames de DNA e reconhecimento de paternidade extrajudicial.
Tem um projeto chamado Esse é meu nome, também pela via extrajudicial, para que pessoas trans consigam mudar o seu nome e o seu gênero na certidão de nascimento. E tem vários mutirões itinerantes que buscam levar o atendimento para as regiões mais afastadas”, detalhou Marina Nogueira.
Direito humanos para todos
Por fim, a defensora pública acrescenta que há uma dificuldade na concretização dos direitos humanos, que foi declarada ainda em 1948. Segundo ela, é uma tarefa difícil para a sociedade em geral, em enxergar a humanidade em quem é diferente de nós”.
A concretização dos direitos humanos é uma vontade política, não é espontânea, não é natural, é uma escolha social, um pacto que a gente traça enquanto sociedade de dar as mãos e falar não, a gente vai estabelecer um limite mínimo e abaixo desse limite mínimo ninguém vai ficar. Isso é um pacto, isso é uma escolha coletiva e é lindo que seja assim, é lindo que seja um pacto, porque a gente pode falar que a gente enquanto sociedade quer chegar nesse denominador comum de que existe um mínimo existencial, que não pode ser ultrapassado, ou cortado, ou restringido. E ao mesmo tempo, eu acho muito triste que algumas pessoas questionem ou debochem dessa escolha que a sociedade faz, porque essas pessoas não conseguem ver a humanidade no que é diferente de nós”, argumenta.
Marina Nogueira também reforça que o atendimento é gratuito e que a população pode procurar a Defensoria sempre que perceber violação ou ameaça a seus direitos. Para alguns casos, será considerada a renda da pessoa. A Defensoria Pública no Vale do Aço fica localizada na rua Poços de Caldas, número 69, Centro de Ipatinga, no segundo andar.
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