05 de novembro, de 2025 | 18:00
Parque Arqueológico revela pinturas rupestres milenares em Andrelândia
Um pedacinho de terra na Serra da Mantiqueira preserva vestígios de 3.500 anos do que podem ter sido os primeiros povos que habitaram Minas Gerais
Bruno Figueiredo/Secult-MG
Parque Arqueológico guarda vestígios milenares e impulsiona o turismo em Andrelândia
Parque Arqueológico guarda vestígios milenares e impulsiona o turismo em AndrelândiaPor Matheus Valadares - Repórter Diário do Aço
Localizado entre montanhas e memórias no Sul de Minas Gerais, o Parque Arqueológico da Serra de Santo Antônio, em Andrelândia, na Serra da Mantiqueira, une história e natureza. Com formações rochosas únicas, grutas e pinturas rupestres milenares, datadas em 3.500 anos, o local vem se consolidando como um dos principais atrativos turísticos da região, atraindo pesquisadores, aventureiros e visitantes interessados na história dos primeiros povos que habitaram o território mineiro.
Administrado pelo Núcleo de Pesquisas Arqueologia do Alto do Rio Grande (NPA), ONG dedicada à proteção do meio ambiente e patrimônio cultural, o espaço também recebe o cuidado e apoio da comunidade andrelandense. O terreno, com aproximadamente 12 hectares, e com altitudes que variam entre 1.000 e 1.300 metros, localiza-se em uma área rural, há cerca de 7 quilômetros do Centro Histórico do município.
A gente vai fazer um calçamento para dar acessibilidade para os turistas irem lá, porque na época da chuva fica difícil. E é um tesouro que nós temos ali, porque onde na região nós vamos encontrar um parque arqueológico com 3.500 anos de pinturas, e isso aí foi feito assim um estudo mesmo para ver de que época era”, afirmou Fernanda Campos, secretária municipal de Cultura, Turismo, Indústria e Comércio.
Evaristo Teixeira Neto, guia do parque, conta que a área estava desmatada e que a rocha que recebe as pinturas rupestres começou a ser vandalizada, antes do terreno ser adquirido pelo NPA.
Começou a reflorestar aqui por causa dos passarinhos, dos bichos, e foi reflorestando, arrumando, até chegar nesse ponto aqui. E agora não entra ninguém, a não ser comigo, com o outro guia, por exemplo. A portaria fica fechada, então, está bem preservada [a área de mata]. Ninguém mais fez bagunça”, contou Evaristo ao grupo de jornalistas que fizeram parte da Press Trip Cidades Históricas da Serra da Mantiqueira, promovida pela Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais (Secult-MG) e pela Codemge.
Em 70 descobriram as pinturas rupestres e o parque começou a funcionar em 1984. Apenas em 1992 que começou as visitas, que já estava tudo arrumadinho. E isso aqui não tinha trilha, não tinha nada. Aí fez o reflorestamento. Lá embaixo nós fizemos também um pomar lá para os passarinhos, com árvores frutíferas”, continuou a explicar o guia.
Memória preservada entre pinturas
As formações geológicas da Serra de Santo Antônio são compostas por rochas sedimentares que guardam sinais da presença humana há milênios. Para chegar ao paredão que preserva as pinturas milenares, é necessário fazer uma caminhada de quase cinco quilômetros, ida e volta, em meio à mata. Grande parte do trajeto é protegido do sol, devido às copas das árvores. São mais de 500 figuras geométricas e zoomorfas, dispostas ao longo de cerca de 50 metros da estrutura rochosa.
Estas pinturas foram as primeiras representantes conhecidas da Tradição São Francisco no Sul de Minas Gerais, anteriormente esta tradição só era conhecida no Norte do estado, junto ao Rio São Francisco e há evidências de terem sido feitas em pelo menos três épocas diferentes. As mais antigas são as vermelhas. As intermediárias são predominantemente em vermelho-amarelo. As mais recentes são em grandes linhas em vermelho-amarelo e algumas figuras brancas.
Bruno Figueiredo/Secult-MG
Foi criado uma passarela de madeira para que visitantes possam observar as pinturas sem tocar na formação rochosa
Foi criado uma passarela de madeira para que visitantes possam observar as pinturas sem tocar na formação rochosaO sítio arqueológico foi pesquisado por profissionais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) na década de 1980, que além de usarem o método do Carbono-14, fizeram escavação e descobriram vestígios como cacos cerâmicos de utensílios pré-históricos, pontas de flecha, restos de alimentação e fogueiras.
Enquanto a interpretação do significado das pinturas, ainda é um desafio. Evaristo, ao olhar para uma das pinturas, faz um exercício de imaginação. O desenho consiste em sete triângulos invertidos e um sol.
Pode ser um calendário, representando os sete dias da semana e o sol”, ressaltou.
Evaristo, o Guardião do parque
Mais do que um guia, Evaristo é um guardião das pedras e do tempo e mantém viva a história do parque arqueológico. Há 17 anos atua como monitor do espaço, recebe turistas, tece explicações, limpa as trilhas e guarda um imenso carinho e amor pelo parque. É notório o prazer que ele sente naquele espaço ao reparar o brilho em seu olhar ao falar do parque, das pinturas e dos mirantes. Simplesmente, um mensageiro natural de coisas naturais”.
Com 18 anos, ele esboça uma saúde de dar inveja em muitas pessoas. Com o uso do seu imponente cajado, transpõe degraus, vence subidas íngremes, passa em grutas, e caminha por longos caminhos, se preciso for. Tem a chave do parque, conhece cada canto e cada lenda criada naqueles 12 hectares de terra. Uma delas é a pedra dos amores. Reza a lenda que mulheres virgens eram sacrificadas do alto da pedra, ao serem levadas e jogadas de lá”. O mirante tem uma altitude de 1.212 metros.
Sempre que precisa se deslocar até o parque, Evaristo vai a pé. São cerca de 6 quilômetros de residência até o local, e segundo ele, corresponde a 1h30 de caminhada. O sol, a poeira da estrada não o intimidam. Nenhum obstáculo, nenhuma distância é maior que seu compromisso e paixão em cuidar daquele espaço milenar. Para mim o parque é muito importante. As rochas, as pinturas, a natureza, tudo isso é muito importante. É o tesouro, que eu chamo isso aqui. Tem um pessoal que não dá valor, mas isso aqui é um tesouro”, relatou o guardião, que não é o dono do lugar, mas cuida dele como tal.
Quando não tem visita, às vezes eu venho e às vezes não. Porque se não tem visita, às vezes tem um servicinho lá embaixo para fazer, aí eu venho. Se não tem, eu fico quieto em casa. Se alguém ligar para mim, eu estou em casa. Porque o telefone da visitação é o meu”, contou.
Visitação
Nos últimos anos, a prefeitura de Andrelândia e o NPA têm trabalhado na ampliação da infraestrutura de visitação e na divulgação do parque como destino de turismo histórico e científico, alinhado às ações de turismo sustentável. A presença de pesquisadores e estudantes têm ajudado a valorizar o potencial do espaço.
As visitas são permitidas mediante o acompanhamento de monitor (R$ 30 por grupo) e o pagamento de ingresso (R$ 15 por pessoa). Os recursos são utilizados para conservação e melhoramento da infraestrutura.
Conforme consta no portal da ONG, as visitas devem ser agendadas com Evaristo, pelo telefone (35) 98422-9623.
Aqui vem muita escola também, faculdade. Tem uma faculdade federal do Rio de Janeiro, da cidade de Seropédica, que vem duas vezes ao ano, em abril e setembro. Vamos receber 42 alunos de um colégio de Ubá”, afirmou ao falar sobre o fluxo de visitação ao parque.
Picos e mirantes
Além do valor arqueológico, o parque oferece paisagens de grande beleza cênica, com trilhas, mirantes e pontos de observação da fauna e da flora da Mantiqueira. Além da Pedra dos Amores, há a Pedra do Gavião, um mirante rochoso há 1.150 metros de altitude que permite ver todo o território do parque, o município de Andrelândia e as serras em municípios vizinhos.
Há também a Gruta dos Novatos, uma fenda rochosa que serve como o primeiro desafio de quem visita o parque. Fica no caminho que dá acesso às pinturas rupestres.
E apesar de Andrelândia não ser um município que faz parte da Estrada Real de forma oficial, há um totem no parque, devido a localidade estar nas proximidades dos antigos caminhos usados para escoar o ouro e as riquezas de Minas para o Rio de Janeiro.
Canoa indígena
Em um galpão próximo a portaria do parque está condicionada uma canoa indígena de 9,10 m de comprimento e 70 cm de largura, escavada em um único tronco de madeira de Araucária, sem qualquer sinal de utilização de ferramentas modernas como serras ou formões. Estima-se que o veículo de transporte foi confeccionado há aproximadamente 400 anos.
Além disso, a canoa apresenta sinais de utilização de fogo para a sua confecção, o que se sabe que era uma técnica dos indígenas, razão pela qual se acredita que o artefato tenha sido fabricado antes da chegada dos homens brancos na região.
Série especial
Essa é a terceira reportagem da série especial: Encantos da Mantiqueira Mineira, que aborda as experiências que integraram o roteiro da Press Trip Cidades Históricas da Serra da Mantiqueira, promovida pela Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais (Secult-MG) e pela Codemge.
A partir de amanhã serão abordados o potencial turístico, a devoção e fé, e as belezas naturais de Bom Jardim de Minas.
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