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21 de outubro, de 2025 | 06:00

Casa de marimbondos

Nena de Castro *


Dia! Dizem que a barafunda entre palestinos e israelenses acabou, por força de um acordo. Velha criada entre as montanhas de Minas, sabedora de segredos ancestrais, Lady Zefa segue com os olhos baços o fio de fumaça que sai de seu fogão a lenha e sobe pela chaminé enegrecida. Pita seu cigarrinho de palha e suspira: não é de hoje que sabe das ambições humanas e da destruição causada pelo bicho-homem em seu habitat! É uma ação destruidora, que vai, pouco a pouco aniquilando a vida do planeta. Destroços, ruínas, milhares de mortos, fome, doenças, crianças sem futuro e sem porvir... Eta ferro!

Lady Zefa sabe que a paz, da qual todos falam, é como algo inatingível pelos desejos insanos dos ditadores e homens maus, então prefere esperar; se na Faixa de Gaza a paz predominar, acharão um jeito de começar o furdunço em outro lugar e novamente a pombinha branca voará tristemente para Pasárgada em busca de abrigo.

Estou lendo “Terra Sonâmbula” que valeu o Prêmio CAMÕES de 2013 ao extraordinário escritor MIA COUTO. Ele evoca em material linguístico primordial, as mitologias tribais, os casos que circulam de boca em boca pela cultura oral africana em Moçambique, país devastado por quase 30 anos de guerra anticolonial e civil. Nesse país em conflito, caminham um velho, Tuahir, e o menino, Muidiga. Fugidos de um campo de refugiados, encontram um ônibus queimado, cheio de cadáveres. Enterram os mortos e ao voltar, encontram mais um.

Com ele, uma mala com alguns alimentos e cadernos com a história de Kindzu, um menino que narra sua vida. “quero pôr os tempos em sua mansa ordem, conforme esperas e sofrências. Mas as lembranças desobedecem, entre a vontade de serem nada e o gosto de me roubarem do presente. Acendo a história, me apago a mim”. E a respeito do conflito: “depois os tiroteios foram chegando mais perto e o sangue foi enchendo nossos medos. A guerra é uma cobra que usa nossos próprios dentes para nos morder. Seu veneno circulava agora em todos os rios da nossa alma. De dia, já não saíamos, de noite não sonhávamos. O sonho é o olho da vida.

Nós estávamos cegos”. E a narrativa prossegue, com sofrimento infindo de homens, mulheres, idosos, crianças. Será diferente do que acontece na Síria? Ou do que aconteceu no Vietnan? Coréia? Sudão? Azeibarjão X Romênia, Camboja X Tailândia, India e Paquistão que vivem se estranhando, e o que ocorre na Ucrânia, graças às ambições de Putin? O que aprendemos com tudo isso?

Ao que parece, nada! Perdoem o desânimo, meus amados cinco leitores. É que o trem tá feio e me chega a memória o conselho do feiticeiro ao menino moçambicano que quer entrar para um grupo de resistência: “a morte só ensina a matar”. Posé, cegos e surdos pela ambição, os ditos humanos tudo destroem. E penso nos versos que o poeta Davi Cohen escreveu para Carlos Drummond de Andrade:

RESSENTIMENTO DO MUNDO

Enquanto no mundo

Tem gente pensando

Que sabe muito,

Eu apenas sinto

Muito.

E nada mais digo, meus impávidos cinco leitores. Au revoir.

* Escritora e Encantadora de Histórias.

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