07 de outubro, de 2025 | 07:00
Medo no trabalho: quando a pressão paralisa o trabalhador
Maria Inês Vasconcelos *
Medo no trabalho: pessoas acuadas são pessoas dóceis. É Leandro Karnal que toca numa agenda ácida, que muitos não querem conversar. O medo no ambiente de trabalho vivenciado pelos bancários, é ainda mais evidente. Sob o prisma da identidade, o trabalho, em tese, se define em múltiplos aspectos. Ele confere identidade social, possibilita interação entre o desenvolvimento do ser social, assegura cidadania e valores. Na realidade, o conceito de identidade e trabalho é tão grande que o homem se define pelo que faz. Ele é médico, ele é juiz, ele é um professor, ele é gerente de banco.
Mas, houve um deslocamento da identidade. Se antes do trabalho, em uma visão humanista, era quase uma commoditie existencial, que trazia significados desmedidos na vida do homem e o fazia um ser completo, hoje, o que vimos é que essa exultação tem se deslocado para outros campos. Essa desarticulação do sentido do trabalho nos remete a Hannah Arendt, quando propõe que o ser humano deve sempre refletir sobre o que está fazendo. Ela se posicionou quando escreveu sobre a privação de direitos e a perseguição de pessoas de origem judaica ocorrida na Alemanha a partir de 1933. Eram tempos sombrios marcados pelo medo.
Percebemos que o medo no trabalho é uma realidade. O fato social grita: bancários estão trabalhando com medo. Eles estão vivendo tempos de coerção. Assim, ao lado da valorização do trabalho, corre solto a banalização da injustiça social e da descartabilidade da mão de obra humana. A deterioração das condições de trabalho, marcadas intensamente pela gestão arrimada no medo e psicoterror, é narrada na mídia, rotineiramente, e na literatura, inclusive, científica. Esse sistema calculado, premeditado e perverso, aparentemente vantajoso de gerir, é uma grande derrota.
No cenário contemporâneo do trabalho, a imposição de medo é uma tentativa de adestramento”
O medo é uma poderosa ferramenta para provocar comportamentos. Com ele se obtém a modificação de ações, hábitos mentais e fisiológicos, pela sobrecarga psíquica imposta. No cenário contemporâneo do trabalho, a imposição de medo é uma tentativa de adestramento. Pelo medo tenta-se modelar o trabalhador. A instrumentalização do medo é sempre particular, customizada de maneira sofisticada, mas todas as técnicas gerenciais de imposição de medo têm uma unicidade: propulsão de resultados, vendas e dinheiro.
O objetivo central é gerir pelo medo os benefícios práticos no crescimento da produtividade. Quando na realidade esse estímulo nocivo tem trazido reações diferentes das pretendidas, que vão desde o adoecimento em massa na categoria; turnover; chuva de pedidos de demissão e a perda do sentido do trabalho.
Recentemente a mídia noticiou que o banco Itaú, um dos maiores do Brasil, demitiu cerca de mil empregados que trabalhavam em regime híbrido ou remoto após monitorar atividades em seus computadores. De acordo Maikon Azzi, diretor do sindicato e bancário do Itaú, o banco justificou os desligamentos com base em "registros de inatividade nas máquinas corporativas, em alguns casos, períodos de quatro horas ou mais de suposta ociosidade".
A repercussão da matéria mostrou que a monitoração permanente dos resultados e o controle da vida do trabalhador, é uma realidade. Seguimos com a disrupção digital e o esquema de monitoramento permanentemente para obter aumento da produção. As condições de trabalho seguem cada vez mais duras e é preciso sair em defesa dessa opressão, pois o medo de perder tira vontade de ganhar.
* Advogada Trabalhista e escritora.
Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
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