
01 de outubro, de 2025 | 07:30
Ser policial sem ter medo de ser mulher!
Eliene Lima *
Mulher não tem que ter medo de viver coisa de mulher!” Essa frase foi dita por uma tenente-coronel PM num evento que celebrava os 44 anos do ingresso da mulher na Polícia Militar de Minas Gerais. E a que ela se referia? A um conjunto de atributos que fazem parte da natureza feminina, e que foram justamente os atrativos que justificaram a abertura de vagas para mulheres na corporação, com o objetivo de equilibrar a prestação de serviços de segurança pública no nosso Estado, até então essencialmente masculina.
Em 1981 estabelecia-se um marco na estrutura da PMMG com o ingresso de 120 policiais do sexo feminino para compor o efetivo que apoiaria no cumprimento de sua missão, e muitos foram os desafios. Não havia alojamentos nem instalações sanitárias adequadas, os fardamentos eram incompatíveis com as especificidades do corpo feminino, além das cobranças para que comportamentos e reações típicos da mulher fossem moldados aos padrões já existentes. Até mesmo a forma de usar os cabelos foi padronizada: a mulher policial militar não poderia manter os cabelos compridos, e todas que ingressaram na primeira turma foram obrigadas a se enquadrar nas regras que definiam o modelo de corte permitido.
Com o tempo, muita negociação e demonstração de habilidade, as normas foram sendo flexibilizadas para uniformes e apresentação pessoal. Mas ainda estavam inseridas numa cultura essencialmente masculina, e a realidade de ser minoria foi capaz de fazer com que muitas vezes essas mulheres tivessem o ímpeto de negar a sua essência ou até mesmo de se envergonhar dela. Essa não é uma realidade exclusiva da mulher militar. Mulheres em várias outras carreiras também passam pela necessidade de se adequar a realidades que não lhes favorecem, mas, num ambiente de quartel, somam-se ainda as normas e tradições específicas de uma instituição que já existia 200 anos antes de abrir vagas femininas em seus quadros operacionais.
Mulheres precisam se apropriar da ideia que a sua maior contribuição reside na capacidade de ser diferente”
A fala da tenente-coronel se referia ao que há de mais sagrado na natureza feminina, que é sua capacidade de gerar uma vida. Entretanto, o medo de ser vista como profissional problema” nessa fase, faz com que seja comum ver uma grávida constrangida pelo seu estado. Constrangida em razão das ausências que podem ocorrer para consultas médicas; constrangida por sentir mal-estar; constrangida por ter que afastar-se das funções durante a licença maternidade; constrangida porque, a partir da maternidade, uma mulher passa a ter um chamado em casa, igualmente importante aos chamados que lhe trazem realização profissional. E ela se culpa e teme ver cair por terra toda uma reputação construída antes de desejar se tornar mãe.
Importante frisar que, no caso da Polícia Militar, esse temor está embasado muito mais nas próprias cobranças que a mulher se impõe, em todas as áreas da vida, que nas ações preconceituosas de uma corporação majoritariamente masculina. Os olhares e as falas desnecessárias e insensíveis existem, sim, e precisam ser reconsideradas, mas, é na percepção de valor da contribuição feminina que todos precisamos ainda avançar. Sobretudo, as próprias mulheres precisam se apropriar da ideia de que a sua maior contribuição na corporação, assim como na sociedade em geral, reside na capacidade de ser diferente, de ser ela mesma, de mostrar que a vulnerabilidade faz parte de ser humano” o humano que protege e aquele que pretendemos proteger!
* Psicóloga e autora do livro Pelo olhar do meu pai.
Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
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