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12 de agosto, de 2025 | 07:00

Viver sem saber nada além do imediato é o que alimenta uma cultura sem profundidade

Miguel Souto *

Há alguns dias, assisti ao recorte de uma entrevista de um coach mirim. A modinha do momento são essas pessoas em tenra idade que já fizeram seu primeiro milhão e passam a dar “palestras” com base na sua experiência de vida, como se toda exceção pudesse ser aplicada como regra. Às vezes, quando você acha que se trata do fundo do poço ver, no púlpito, um moleque de 14 anos chamado, vulgo pastor mirim, que viralizou nas redes (anti) sociais com suas pregações polêmicas, estilo adulto e frases sem sentido, como a mais viral “Of The King The Power”, aí vem a realidade e mostra que o fundo do poço tem subsolo.

Pois eis que, em mais uma dessas situações surreais que surgem do nada, um mini coach afirma, com convicção, que não quer saber quem foi Aristóteles. Ora, ora. A viagem é longa, senhores e senhoras, segurem-se onde estiverem. “Por que que eu vou saber quem foi Aristóteles? Isso não vai me ajudar em nada em minha vida”, vocifera o pseudo mentor.

Mas, passada a raiva, voltemos à razão. Essa fala de uma criança, em um canal com milhares de seguidores, não deveria ser desprezada - pelo menos por quem ainda pensa que vivemos a era do conhecimento e da razão. A fala do menino reflete a lógica dominante da sociedade atual: se o conhecimento não resolve um problema imediato, então é inútil.
“A viagem é longa, senhores e senhoras, segurem-se onde estiverem”


Essa é, obviamente, uma visão empobrecida da educação e da própria vida. Conhecer Aristóteles, indiscutivelmente um dos filósofos mais influentes da história ocidental, e a filosofia em geral nos ajuda a desenvolver raciocínio, ética, linguagem e discernimento. Você não encontrará um grande orador, um escritor, um grande magistrado, uma pessoa em um cargo importante que não conheça filosofia ou não conheça Aristóteles. É o tipo de saber que não serve para uma emergência, mas serve para formar o sujeito que constrói um mundo com menos emergências.

Aqueles que se recusam a buscar conhecimento porque acreditam que já sabem o suficiente só demonstram o quanto não sabem nada. Esse é o efeito Dunning-Kruger, fenômeno psicológico em que pessoas com pouco conhecimento acreditam saber muito mais do que realmente sabem. Por não terem bagagem suficiente, não percebem sua própria incompetência.

Já quem sabe mais costuma ter mais consciência das coisas e de suas próprias limitações. Quem despreza o passado e as ideias que o sustentam vive uma vida rasa, repetitiva e sem perspectiva. A humanidade não avança com o “isso é tudo zero”. Ela cresce porque carrega, repensa e expande o que foi construído antes. Conhecer filosofia não resolve tudo, mas viver sem saber nada além do imediato é o que alimenta uma cultura sem profundidade.

E isso se aplica à História, à Geografia, às Ciências Naturais ou Biológicas, à Matemática e a tantas outras áreas do conhecimento. Se você segue um mini coach ou se é amigo ou parente de algum deles, repense para onde estamos indo.

* Consultor educacional.

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