01 de julho, de 2025 | 04:00

E murucututu assobiou...

Nena de Castro *

O sol já iluminou o firmamento com fogo e luz há bastante tempo e Tamara ainda dorme, encolhida em sua cama. A mãe já saiu pro trabalho tomando o ônibus velho e malcheiroso para o centro. Tamara dorme. Sonha um sonho confuso: está caminhando para a cachoeira próxima pela estradinha secundária, está só, mas tem a impressão de que alguém a segue. Olha para trás, confere a estrada, mas só vê algumas árvores, o capim seco, o chão repleto de folhas caídas... Apressa o passo, nervosa, não sabe porque caminha naquele local, sabe que precisa ir à cachoeira, contudo, não atina com o motivo. Caminha cada vez mais depressa, pensa ver um vulto e corre, mas percebe que o vulto também corre, passa por ela e se põe a esperá-la, meneando a cabeça em sinal de zombaria. Faz o sinal da cruz, invoca São Geraldo, o santo protetor de sua mãe e quer voltar, mas os pés parecem presos ao chão.

O vulto sai do caminho e desaparece com uma gargalhada e ela aterrorizada, percebe que os joelhos se dobram e cai sentada. Pensamentos cruzam sua mente atribulada, ela quer correr e se livrar do medo mas está paralisada! A custo, consegue se erguer e caminha de volta, embora pareça ouvir um chamado para voltar ao caminho que trilhava antes! No sonho, avista a casinha onde mora com a mãe e acorda assustada! O coração estremece, ela se levanta, pega o uniforme e seus objetos escolares e caminha na direção da escola.

Na verdade não quer ir para lá, tem cabulado aulas, no entanto, apreensiva como está, prefere não quer ficar só: vai esperar o início do turno na casa da amiga Madá, colega de turma. Com a amiga ela se acalma e juntas vão à escola. No final do turno um banho, dirão pra mãe de Madá que vão fazer trabalho escolar na casa de uma outra colega que mora no centro.

Na verdade, irão pro bar da beira do asfalto. Lá estará o crush Henrique e sua turma barra pesada com quem elas têm saído; vão beber, jogar sinuca, ouvir música, fumar e experimentar coisas proibidas. A mãe já aconselhara, as brigas eram sérias, falava em escolhas, em caminhos maus, mas nada fazia Tamara desistir da turma que a acolhera tão bem! Eles a entendiam, falavam a mesma linguagem e a defenderiam se preciso fosse, ela acreditava.

Tinha 16 anos e mal podia esperar os 18 para sumir daquele local tacanho onde viviam. Não conhecera o pai que fora embora e ela e a mãe viviam uma vida miserável e solitária depois da morte da avó. Tamara queria alçar outros voos, ia ser cantora, fazer sucesso e brilhar.

A noitada continua, a amiga volta para casa, ela permanece no bar e tudo ia bem até que sentiu uma friagem e pressentiu o vulto que vira no sonho! Viu também um rapaz magro, alto, vestido com jeans e camisa verde xadrez, encarando-a. Ele se aproxima, olha em seus olhos e lhe diz grave e sério! “Você precisa ir à cachoeira ou algo muito ruim vai lhe acontecer”. Súbito, ele desaparece e ela desmaia, o pessoal acode e lá fora, numa árvore uma coruja murucututu dá um assobio sinistro...

* Escritora e Encantadora de Histórias

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