08 de junho, de 2025 | 05:00

Um museu que guarda a história viva de Ipatinga e região

Colaboração de Antônio Nahas Júnior
Na semana que passou, visitamos o Museu Vivo de Ipatinga, que fica localizado na rua Água Potável 398-A, no bairro das Fontes. Fomos lá conhecer a iniciativa e aproveitamos para apresentar ao leitor do jornal Diário do Aço algumas informações sobre este verdadeiro Patrimônio Cultural da nossa cidade.
Desde já, também, fomos convidados para o evento “Café com Rapadura”, organizado mensalmente na sede da entidade. Neste mês de junho, o encontro será no próximo dia 22 (domingo) e vai homenagear José Mariano de Melo, o Maestro Mariano, que rege a Orquestra de Viola Caipira do Vale do Aço. Todos estão convidados!
A seguir, a entrevista com Jeová Aguiar, que é fundador da Associação Cultural Museu Vivo.

Fotos: Antônio Nahas Jr.
O fundador Jeová Aguiar posa na janela do Museu VivoO fundador Jeová Aguiar posa na janela do Museu Vivo
DA - Bom dia, Jeová. Obrigado por me receber. Estou maravilhado com o que eu estou vendo e também pelo espaço, pelo capricho e pela quantidade de material que tem aqui. Eu gostaria que você, primeiro, se apresentasse: seu nome, sua história.

JA - Meu nome é Jeová . Eu nasci na Bahia e sou filho de uma família de retirantes, onde meus pais tiveram 14 filhos, e oito sobreviveram, né. Era época das parteiras e de tantas outras coisas. As dificuldades da vida eram muitas. Nós sempre fomos retirantes e trabalhamos de cidade em cidade. Na época era de região em região nas colheitas e, com isso, nós conhecemos vários estados do Brasil até chegar aqui, em Ipatinga, nos anos 70. Eu já vivi Rio de Janeiro e lá eu me casei com uma moça da cidade de Galileia, e depois voltei aqui pra Ipatinga. Eu já tinha bebido dessa água e não consegui ficar longe daqui.

DA - E de onde veio a ideia do Museu Vivo?
JA - Quando cheguei aqui, eu já tinha um conhecimento cultural das festas pelo Brasil, e eu vim aqui exatamente pra conhecer as festas que tinha aqui, na região, e com isso me apaixonei pelo lugar, pelo movimento que havia em Ipatinga. Isso foi nos anos 70, e então comecei a fazer a coleta do material pra montar o museu. Uma parte de peças para fazer exposições em festas e escolas. Assim, as pessoas viam que o trabalho que eu fazia era diferenciado, porque eu não colecionava só pra mim, mas pra mostrar. Então, comecei a batalhar um lugar para o museu ser um museu mesmo, e também fazer exposições em vários lugares, praças e escolas. Consegui o apoio da prefeitura, em 2012, quando foi alugada uma casa. Mas não pagou o aluguel e eu quebrei, fiquei devendo e quebrei. Com isso, eu recolhi o museu. Meu filho Thales me convenceu a ceder a casa que eu fiz para mim mesmo para ser o museu da Ipatinga histórica.

Espaço conta parte da história de formação do Vale do AçoEspaço conta parte da história de formação do Vale do Aço
DA - Estou vendo aqui a história de Borba Gato, que é um personagem importante da história de Minas, pois iniciou o ciclo do ouro em Minas. No século XVIII, ele realmente foi foragido da justiça portuguesa. Os cartazes que vi dizem que ele ficou foragido aqui onde seria Ipatinga...
JA - Nós conseguimos documentos que provam que ele se escondeu por aqui mesmo na confluência dos rios Doce com o Piracicaba, sim. Isso não é invenção. Na verdade, ele viveu aqui mesmo. Nós conferimos vários documentos e, se você garimpar direitinho, você encontra. Queremos mesmo é continuar a pesquisa para enriquecer a história de Ipatinga.

DA - O Museu possui peças históricas muito importantes. Eu vi uma cangalha para colocar no lombo do burro que era um esconderijo.
JA - A cangalha é aquele equipamento aonde você coloca as canastras. O baú cangalha era pra esconder o que não podia ser mostrado. Por exemplo, pedras preciosas, ouro, dinheiro, armas. Era tudo guardado e transportado na cangalha. E tem muito mais coisa no museu. Temos as roupas das costureiras, porque as roupas eram costuradas e feitas aqui na região. E a cachaça também era feita por aqui mesmo.

DA - Vi também um órgão que não toca. E um cinto de castidade.
JA - Sim. O teclado do órgão está intacto. Mas dentro dele, nos foles, não está funcionando. Não temos verba para restaura-lo. Já o cinto está intacto. É pesado. De ferro fundido. Tem uma tranca e a chave ainda está lá. As mulheres só podiam ir a festas usando ele.

Trajes típicos ajudam a preservar costumes da regiãoTrajes típicos ajudam a preservar costumes da região
Uma carta atribuída a D. João VI está colecionada Uma carta atribuída a D. João VI está colecionada
DA – Como é que o museu está organizado?
JA - Na entrada tem a primeira parte, onde nós colocamos os primeiros habitantes da região: os botocudos e outras tribos que moravam aqui. Temos uma carta de D. João VI, datada de 1808, onde ele manda fazer guerra para matar todos os índios. Colocamos aqui fotos e materiais dos índios que coletamos em toda a região. Na ala seguinte, expomos a história mais antiga de Ipatinga, que são documentos e peças de tropeiros e de carvoeiros. Tem um pouco da história da ferrovia, que vem pra cá em 1922, inaugurando a primeira estação de Ipatinga. Aqui falamos, também, das costureiras, pois as roupas eram costuradas e feitas aqui na própria região. Tem também o alambique, os carvoeiros e todo o material dos tropeiros, como a cangalha que você gostou. Ipatinga começou no século XIX. Tinha o pouso de água limpa no Barra Alegre e outro acampamento de tropeiros no Juá, na área central da cidade, que mais tarde foi chamada de zona boêmia. É onde a Prefeitura fez aquela estaçãozinha e a linha de ferro que vai seguindo o ribeirão Ipanema. E na rua que depois ia se chamar 28 de abril tinha ferreiro, costureira, parteira e comercio. Quando chegou a estrada de ferro já havia uma vila ali. Os documentos que temos aqui expostos contam a história da Ipatinga antes da ferrovia. Em nosso museu temos, ainda, a Oficina do Ferreiro, que mostra as peças que eram feitas na região. E você pode ver: todas as peças estão catalogadas e numeradas. Procuramos saber de onde elas vieram; quem as fabricou, aonde e em que data. Não temos verba para contratar um historiador permanente, mas tudo o que está aqui contém pelo menos uma parte da história bem contada.
DA - Quantas peças há no acervo do museu?
JA - O Museu expõe duas mil peças da Ipatinga antiga, antes da Usiminas. É o que temos verba para catalogar e organizar. Mas ali embaixo, do outro lado, temos outras 18 mil peças aguardando verba para serem organizadas, catalogadas e expostas.

DA - Dezoito mil?
JA - Isso mesmo! Material da época da ferrovia. Tudo mais recente. Então, o Museu Vivo pode ficar muito maior, o mais variado e com condições para contar com detalhes a história da cidade.

DA - Vocês contam com algum patrocínio?
JA - Nós temos uma verba de R$ 50.000 para o ano, todo ano. É uma verba muito engessada. Não podemos pagar um historiador, nem o IPTU ou mesmo uma pessoa para zelar o espaço. Só podemos gastar com o que está no projeto, mas ajuda muito. Nós estamos a cada dia preparando mais o Museu pra gente conseguir algum recurso estadual ou federal. Temos prontos projetos para conseguir financiamentos.

DA - O Museu tem uma agenda de visitação?
JA - Estamos preparados para receber estudantes de segunda a sexta-feira. Este ano, a visitação está sendo menor porque estamos com poucas condições de abrir o tempo todo, por falta de patrocínio. Temos também visitas guiadas para pessoas adultas, e solicitamos R$ 20 para ajudar na manutenção. Estamos fazendo das tripas o coração para manter tudo funcionando. As pessoas vêm cá e aprendem, né, e saem com entusiasmo para conhecer e reforçando o sentimento dela de ser ipatinguense.

Objetivos variados compõem o acervo: 2 mil peças catalogadasObjetivos variados compõem o acervo: 2 mil peças catalogadas
DA - O Museu é organizado como associação, certo? E como é o "Café com Rapadura"?
JA - Somos uma associação, temos um conselho consultivo e uma diretoria que se reúnem mensalmente. O ‘Café com Rapadura’ é feito aqui no museu, mesmo. As mulheres vêm pra cá, fabricam biscoito, e outros trazem broa ou bolo. Fazemos o café com rapadura no fogão a lenha e cantamos o Hino de Ipatinga e outras músicas antigas. Tem sempre um convidado, o último foi o ex-goleiro do Cruzeiro, Gomes, que foi também do Grêmio e da seleção brasileira. Nós o consideramos um cidadão mundial e um atleta ipatinguense!

DA - E quem vai ser o próximo convidado?
JA - O próximo convidado vai ser o Maestro José Mariano. Ele é da roda de viola, desenvolve um trabalho muito bom na região. Leva o nome de Ipatinga a vários lugares. E nós, aqui no Museu Vivo, homenageamos essas pessoas que promovem a cidade e juntam as pessoas para se encontrarem. Em cada evento, nós homenageamos um pioneiro.

DA - Que dia vai ser? Que horas? A orquestra de viola vai vir?
JA - Vai ser no dia 22 de junho, aqui mesmo, na sede do Museu Vivo. Vai começar às 8 horas da manha. Faremos uma oração, vamos recepcionar os convidados e cantar o Hino de Ipatinga. Na sequência, haverá a homenagem ao Maestro José Mariano e depois vamos tomar o café com rapadura. Você está convidado!
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