01 de junho, de 2025 | 07:00

Desaforos para desaforados

Marli Gonçalves *

Fui educada, muito bem-educada pelos meus pais, sempre respeitados, mas que desde menina também me orientaram a jamais levar desaforos para casa. Assim de alguma forma venho me defendendo ao longo da vida. Valeu, Marina Silva!

Ver uma mirrada Marina Silva largar a suavidade de lado e rugir contra aqueles senadores de meia tigela esta semana me deu orgulho de ver ali uma mulher de raça. Mas ao mesmo tempo aquele debate, aquela situação toda, vê-la sozinha numa situação inadmissível que a puseram me calou mais fundo do que imaginava pensando que já estaria com casca criada depois de tanto tempo acompanhando a política. Só percebi isso na manhã seguinte ao acordar com uma dor de cabeça injustificável, e a visão daqueles acontecimentos martelando, martelando.

O que foi aquilo? O que está acontecendo e até quando vamos aturar esses trogloditas se criando, crescendo para cima das mulheres e, nesse caso, também da destruição do meio ambiente ao bel prazer deles e de seus projetos aprovados na calada da noite, à luz do abajur do pardieiro montado nesta legislatura vergonhosa? Aliás, a bem da verdade, mais uma, de uma sequência de décadas, com a eleição de alguns seres do pior de cada região do país. Saímos há pouco de um desastre que ainda nos custa ter de ouvir por muito tempo com a familícia e seus agregados. Mas não tivemos nem tempo de nos alegrar porque os vermes ainda se multiplicam por ali, e mais, integram o cada vez mais masculino e inoperante governo atual, cuspindo seus ranços e ideias atrasadas como se tudo fosse muito legal – mantêm a todos como reféns em acordos.

Ah, e os “puros”? A lembrança da visão daquela mesma mesa onde Marina era atacada por aqueles desaforados, de um tal Jaques Wagner, petista raiz metido a sabe tudo, calado, e depois ainda com coragem de dizer que tudo foi “no calor do debate” demonstra mais uma vez o problema insolúvel e machista da esquerda nacional, e nem me venham negar. Basta ver o vídeo e a cara de nuvem deste senhor na ocasião. Foi preciso que, da plateia, a senadora Eliziane Gama, do PSD, gritasse contra o absurdo. Assim, acordou um outro petista, o senador Rogério Carvalho, que só aí levantou a voz e defendeu a Ministra. Tudo bem que sei que são bem poucas as mulheres com poder ali no Congresso, mas onde elas estavam para ter de ser de um homem essa voz?

Mais um aliás: que reação mais esdrúxula de Lula e sua turma! O medo de perder o poder está mesmo paralisando o Poder, no momento bastante confuso com escândalos de letrinhas e impostos fantasiados de solução.
“O que está acontecendo e até quando vamos aturar esses trogloditas se criando, crescendo para cima das mulheres”


O fato é que essa ocorrência é exemplo e estímulo ao horror que as mulheres vivem no país, com o absurdo aumento da violência e feminicídios que todos os dias nos atingem. Um mata e joga o corpo da mulher no rio, como lixo. Outros invadem seus locais e as esfaqueiam diante de todos. Outros fazem com que simplesmente sumam do mundo. Outros as perseguem passando por cima de medidas protetivas de araque. Outros ameaçam, desrespeitam, agridem, uma ministra de Estado diante de um país inteiro e se comprazem com isso com suas caras cínicas. Nem quero falar o nome de todos os pulhas desse espetáculo lamentável no Senado. Mas não dá para deixar de citar o “presidente” da mesa, o bolsonarista Marcos Rogério, que ousou silenciar o microfone onde Marina tentava se defender, como se poderoso fosse para mandá-la “se por em seu lugar”.

Fez muito bem a ministra em deixar essa sessão de horrores. Saiu, e saiu muito maior do que quando entrou. Para finalizar, nada melhor do que repetir a frase do editorial do Estadão: “Quem precisa se colocar “em seu lugar” é o Senado, que nasceu para ser a Casa da estabilidade na República e que hoje corre o risco de se transformar em valhacouto de arruaceiros”.

Completo: valhacouto de desaforados, ignorantes, atrevidos, imbecis, insolentes, vendidos, golpistas, falsos, feios, vergonhosos, descarados. Merecem desaforos. Muitos; você aí deve ter sugestão de mais algum para essa lista.

* Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano - Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon). Vive em São Paulo. [email protected] / [email protected]

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Comentários

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Tião Aranha

01 de junho, 2025 | 11:31

“Bom texto. Vivemos numa sociedade estritamente machista. O resumo do que de viu é que infelizmente a ministra Marina se encontra sozinha no governo. Nada mais que isso. Rs.”

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