01 de maio, de 2025 | 11:12

TRT-MG reconhece auto de infração que identificou 30 trabalhadores baianos em situação análoga à escravidão

TRT-MG/Divulgação
Segundo o julgador, mesmo que fosse questionável se há ou não degradação nos alojamentos, não há dúvida de que não havia o mínimo de dignidade dos empregados no local de trabalhoSegundo o julgador, mesmo que fosse questionável se há ou não degradação nos alojamentos, não há dúvida de que não havia o mínimo de dignidade dos empregados no local de trabalho

A Justiça do Trabalho reconheceu o auto de infração lavrado por auditores-fiscais do trabalho em uma fazenda de café localizada na cidade de Boa Esperança, na Região Sul de Minas Gerais, em razão de condições caracterizadas como análogas à escravidão. A decisão é dos julgadores da Sétima Turma do TRT-MG, que modificaram a sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara do Trabalho de Varginha.

Dados do processo apontaram que, na colheita de café de 2021, vários trabalhadores deslocaram-se do estado da Bahia para prestar serviço no Sul de Minas, em fazendas como a da cidade de Boa Esperança.

Após a denúncia, fiscais inspecionaram o local de colheita e os alojamentos, onde ficavam os 30 trabalhadores vindos de Barra e São Gabriel da Bahia. Do total de 35 empregados vinculados ao empregador, 28 estavam trabalhando na completa informalidade contratual.

O auto de infração apontou a existência de riscos físicos (exposição à radiação solar), químicos (exposição a óleos, graxas e combustíveis, além de agrotóxicos), e ergonômicos (sem respeito ao limite de peso estabelecido nas normas regulamentadoras - NRs pertinentes e na própria CLT). Foram constatados riscos de acidentes, constando que os equipamentos de proteção individual (EPIs) utilizados pelos trabalhadores, embora insuficientes, eram adquiridos pelos próprios empregados mediante desconto no salário.

Segundo os auditores-fiscais, não havia sanitários, nem o fornecimento de água potável nas frentes de trabalho. Faltavam também abrigos para a proteção contra mau tempo ou clima ruim no momento das refeições. Quanto aos alojamentos, consta que não foram fornecidas roupas de cama, e que os travesseiros eram improvisados com roupas ou outros pertences.

Após inspeção, análise documental, entrevista com os trabalhadores e com os representantes do empregador, a auditoria fiscal concluiu que os 30 trabalhadores da Bahia estavam submetidos a condições análogas às de escravidão, nos termos do artigo 149 do Código Penal e Instrução Normativa 139/2018.

Defesa
Na defesa, o empregador alegou que não submeteu os trabalhadores a condições degradantes. Sustentou que o auditor-fiscal lavrou indevidamente o auto de infração, por suposta sujeição de trabalhadores à condição análoga à de escravo.

Ao decidir o caso, o juízo da 2ª Vara do Trabalho de Varginha julgou procedente o pedido de nulidade do auto de infração impugnado. Na sentença, o juízo reconheceu que nenhuma das práticas denunciadas foi evidenciada.

Mas a União Federal recorreu da decisão e, no entendimento dos julgadores da Sétima Turma do TRT-MG, o empregador cometeu ilegalidade contra os ex-empregados.

Decisão
Para o desembargador relator Antônio Carlos Rodrigues Filho, os autos de infração, que contam com o amparo de uma gama de entrevistas com os trabalhadores, na frente de trabalho, estão muito mais próximos da realidade.

Segundo o julgador, mesmo que fosse questionável se há ou não degradação nos alojamentos, não há dúvida de que não havia o mínimo de dignidade dos empregados no local de trabalho. O desembargador enfatizou que a principal testemunha da defesa sequer conhecia a frente de trabalho. Por isso, ao discordar da sentença do juiz, o relator concluiu que o depoimento dessa testemunha não poderia servir de base para a anulação do auto de infração.

O magistrado ressaltou que a prova produzida é no sentido de que os trabalhadores eram aliciados na Bahia, com promessas de condições de trabalho que não se mostravam reais quando chegavam à fazenda. Para o julgador, a submissão dos empregados ao estado de indignidade revela muito mais um verdadeiro estado de necessidade do que contentamento com o serviço.

“Embora não se discorde no sentido de que há que se ter bastante prudência no enquadramento dessa conduta ilícita, parece acertado dizer que minimizar a prática desse ilícito, afastando a caracterização mesmo com vasta gama de depoimentos e com firme e detalhado auto de infração, estimula sobremaneira a continuação e o efeito virótico, espalhando-se para outras relações de trabalho”, ponderou o magistrado.

No voto condutor, o relator teceu considerações sobre a inclusão do empregador na “lista suja” do governo federal, com os nomes daqueles que submeteram trabalhadores a condições análogas à escravidão. Ele alertou que tratar esse tipo de situação com leveza só favorece que ela continue acontecendo. Por isso, considerou justa a inclusão do empregador na chamada “lista suja” do governo federal.

“A listagem tem caráter temporário, sendo o empregador removido após dois anos, se verificado que não há reincidência. Trata-se, portanto, de ferramenta fundamental para estimular o fim do trabalho em condições análogas à de escravo no Brasil, indo ao encontro de todos os já citados compromissos internacionais realizados frente a todo o mundo, e que não podem ser simplesmente ignorados por este Poder Judiciário”, ressaltou.

O julgador concluiu a decisão, entendendo caracterizada a conduta prevista no artigo 149 do Código Penal, sobretudo pelas condições degradantes a que foram submetidos os trabalhadores. “Como consequência, dou provimento para reformar a sentença, declarando válidos os autos de infração impugnados para todos os fins”, finalizou. A dívida trabalhista foi quitada e o processo já foi arquivado definitivamente.

1º de Maio – Dia do Trabalhador - Uma data para lembrar que dignidade também se constrói com trabalho justo
O 1º de Maio é mais do que uma data no calendário. É um momento para lembrar que o trabalho é parte essencial da vida humana — não só porque garante o sustento, mas porque é, também, uma forma de construir dignidade, pertencimento e esperança.

É por meio do trabalho que muitas pessoas colocam comida na mesa, educam os filhos, sonham com um futuro melhor. Mas nem sempre o trabalho vem acompanhado de respeito, proteção ou reconhecimento. Há ainda muitos lugares onde trabalhar é sinônimo de medo, cansaço extremo, desvalorização e injustiça.

Por isso, o Dia do Trabalhador também é um convite à reflexão. Serve para perguntar: como andam os direitos de quem trabalha? O ambiente é seguro? O salário é justo? Há oportunidade de crescimento? Responder a essas perguntas com responsabilidade é papel de todos — da sociedade, das empresas, do Estado e de cada cidadão.

O Direito do Trabalho nasceu exatamente para enfrentar as desigualdades que marcam as relações entre patrões e empregados. Ele não é só um conjunto de leis: é um instrumento de justiça social. Ele existe para proteger os mais vulneráveis, garantir condições dignas e reafirmar que nenhum lucro vale mais do que a vida e a saúde de um trabalhador.

Hoje, quando falamos em futuro do trabalho, tecnologia e inovação, não podemos esquecer o essencial: o trabalho precisa continuar sendo humano. Porque dignidade, segurança e respeito não são privilégios — são direitos.

Neste 1º de Maio, celebremos quem trabalha, quem luta por seus direitos e quem acredita que é possível construir um mundo melhor por meio do trabalho. Um mundo em que trabalhar seja, sempre, um caminho de liberdade — nunca de exploração.

Processo:
PJe: 0011288-93.2022.5.03.0153 (Com informações do TRT-MG)
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