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18 de março, de 2025 | 07:00

Vingança...

Nena de Castro *

Levantou-se vagarosamente, vislumbrando o dia que tentava substituir a noite a qual parecia não ter pressa para se recolher. Sim, o sol ainda dormia e não brilhava no céu, como acreditava quando era criança. Por um instante viu-se ainda menino, na cozinha da fazenda, brincando com sua “boiada” formada por maxixes e sabugos de milho. A mãe adiantava o almoço ajudada por Donana, a velha empregada cujos fios prateados indicavam o passar dos anos de muito trabalho... O pai dava ordens no curral onde o leite era tirado. As vacas mugiam e galinhas cocoricavam pelo quintal, importunadas às vezes pelos cães da família. O irmão tinha ido para a escola e ele esperava por sua volta, ansioso pelas brincadeiras. O irmão... Sacudiu a cabeça, e as imagens sumiram.

Voltando ao presente foi ao banheiro, vestiu-se, pegou um par de roupas e pôs na capanga, junto com a munição para seu revólver. Café coado, o cheiro se espalhou por toda a velha casa e vagarosamente, sorveu o líquido na caneca que a mãe lhe dera.

A mãe...podia ainda avistá-la alegre, cantando modinhas enquanto cuidava de seus afazeres, plantando a horta, cuidando das folhagens e roseiras, costurando... Ela e o pai eram felizes, ambos diziam que tinham tudo o que queriam, ou seja, um tinha o outro para tornar a vida amena... Então o irmão desaparecera na volta da escola.

Desespero total, buscas na vila, na mata, no rio. O pai deixou de lado os cuidados da fazenda e dedicou-se a buscar o filho. Encontrou-o morto dentro de uma loca de pedra, amarrado, encostado num tronco caído.

A dor levou o pai a um ataque cardíaco, enquanto velava o filho. E fora, ali, ao lado dos esquifes, aos 10 anos, abraçado pela mãe, que jurou vingança. Enquanto a mãe soluçava, dizendo que agora eram só os dois, entendeu que devia esperar. Não ia abandoná-la. E marcou uma data, depois que a mãe partisse para a eternidade. Tornou-se rapaz, trabalhando ao lado da mãe. Estudou até o Ensino Médio, pois não queria sair do lado da genitora. Embora tivesse uns flertes e namoricos, nunca quis nada sério: ia sair para uma empreitada de morte e não pretendia deixar uma família destroçada. Hoje completara exatos 30 dias do enterro da mulher que lhe dera a vida.

E como tinha jurado, partiu. Não lhe interessavam as terras, o casarão, o pouco gado que tinham. Queria ver o homem que tudo causara, morto. Durante aqueles anos, tinha investigado os rumores que indicavam o dono da fazenda Cabocla, como o autor do crime. Era despeito contra seu pai que se casara com sua mãe, que o assassino amava. O tal, depois dos acontecimentos, mudara-se para um local bem longe. Problema não, ele tinha um bom cavalo, estava acostumado às viagens pelos ermos, acampava em qualquer lugar, levava sua matula e sabia pescar e caçar se necessário. Iria até o fim em sua missão. Então, antes do dia amanhecer, um cavaleiro partiu, a trote, levando o revólver e a Winchester que possuía, além do punhal preso na bota. No coração, o ódio guardado durante anos! A hora da vingança chegara!

* Escritora e contadora de histórias

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