13 de março, de 2025 | 07:00

Presunção de culpa em cirurgias plásticas: uma nova perspectiva jurídica proposta pelo STJ

Natália Soriani*

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu, recentemente, uma decisão de grande impacto que redefine substancialmente o entendimento jurídico acerca da responsabilidade médica em cirurgias plásticas puramente estéticas. A decisão estabelece a presunção de culpa do cirurgião plástico quando o resultado de uma cirurgia não for considerado harmonioso, mesmo que o profissional tenha seguido rigorosamente todos os protocolos e utilizado as melhores técnicas disponíveis.

Esta jurisprudência contrasta com a interpretação tradicional do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), que defendem uma avaliação de responsabilidade baseada na execução correta das técnicas e dos métodos disponíveis, caracterizando a obrigação do médico como uma "obrigação de meio".

Tradicionalmente, a responsabilidade dos médicos, na maioria dos casos, é entendida como uma obrigação de meio, o que significa que o profissional tem o dever de empregar os melhores meios disponíveis para alcançar um resultado, sem, contudo, garantir um resultado específico. Isso implica que o médico deve seguir os protocolos estabelecidos, utilizar as técnicas adequadas e agir com diligência e perícia. No entanto, o novo entendimento do STJ aplica uma lógica diferente às cirurgias plásticas estéticas, categorizando-as como obrigações de resultado. Isso significa que, caso o resultado não atenda às expectativas estéticas do paciente ou ao senso comum de harmonia estética, o cirurgião pode ser responsabilizado judicialmente, mesmo que não tenha havido negligência, imprudência ou imperícia em sua atuação.

Por exemplo, em um caso de rinoplastia, onde o paciente alega que o formato do nariz após a cirurgia não está em harmonia com o restante do rosto, a presunção de culpa recairia sobre o cirurgião, mesmo que este possa demonstrar que seguiu todos os procedimentos técnicos corretos e que não houve complicações durante a cirurgia.

A decisão do STJ provoca um debate acalorado no cenário médico e jurídico, gerando preocupações e questionamentos sobre seus efeitos práticos. É preciso observar que este novo entendimento pode causar uma insegurança jurídica aos cirurgiões plásticos, uma vez que os submete a uma responsabilidade objetiva, independentemente de sua atuação técnica. Tal regime jurídico poderia levar a um aumento nos custos dos seguros de responsabilidade civil para esses profissionais e potencialmente desestimular a prática da cirurgia estética, especialmente para procedimentos mais complexos ou em pacientes com expectativas irrealistas.
“A decisão abre um precedente para que outros casos similares sejam julgados com base nessa presunção de culpa”


A decisão abre um precedente para que outros casos similares sejam julgados com base nessa presunção de culpa, o que poderia reconfigurar significativamente a prática da cirurgia plástica no Brasil. Existe a preocupação de que o judiciário interfira cada vez mais em decisões técnicas médicas, desconsiderando a expertise dos profissionais de saúde. Isso poderia levar a uma judicialização excessiva da medicina, com um aumento no número de processos contra médicos e um impacto negativo na qualidade dos serviços prestados.

A decisão do STJ sobre a presunção de culpa em cirurgias plásticas estéticas traz à tona questões fundamentais sobre a responsabilidade médica, a expectativa dos pacientes e o papel do judiciário. É necessário um diálogo aberto entre os setores jurídico e médico para estabelecer critérios justos e equilibrados que protejam os direitos dos pacientes sem onerar excessivamente os profissionais da saúde. Continuará a ser um tema de debate e provavelmente de ajustes à medida que mais casos forem sendo julgados sob esta nova premissa legal.

A decisão, embora alinhada a uma percepção crescente de defesa do consumidor-paciente, levanta sérias questões sobre a aplicabilidade e razoabilidade de se exigir resultados estéticos específicos, frente à complexidade e variabilidade inerentes aos procedimentos cirúrgicos.

É imperativo que o debate sobre a responsabilidade médica em cirurgias plásticas estéticas considere a importância da autonomia do paciente, do consentimento informado e da justa compensação por danos comprovados, sem, contudo, comprometer a prática médica responsável e a inovação na área.

* Advogada especialista em Direito Médico e de Saúde, sócia do escritório Natália Soriani Advocacia

Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
Encontrou um erro, ou quer sugerir uma notícia? Fale com o editor: [email protected]

Comentários

Aviso - Os comentários não representam a opinião do Portal Diário do Aço e são de responsabilidade de seus autores. Não serão aprovados comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes. O Diário do Aço modera todas as mensagens e resguarda o direito de reprovar textos ofensivos que não respeitem os critérios estabelecidos.

Envie seu Comentário