14 de fevereiro, de 2025 | 08:00
Justiça autoriza produtos com nomes comerciais em farmácias de manipulação
Claudia de Lucca Mano *
Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) reconheceu, pela primeira vez, que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não pode proibir produtos manipulados com nomes comerciais. A decisão da 9ª Câmara de Direito Público determinou que as autoridades sanitárias se abstenham de "aplicar qualquer espécie de sanção por comercializar produtos manipulados com atribuição do objetivo terapêutico e de nome das fórmulas em seu rótulo. Inexistência de previsão legal específica que proíba a prática".É bastante comum as farmácias de manipulação desenvolverem formulações com finalidades específicas, por exemplo, "composto vitamínico para menopausa", "fórmula para emagrecer" ou "sérum anti-idade". A prática aparece com frequência em sites e redes sociais, especialmente daquelas farmácias que conseguiram na Justiça o direito de realizar estoque mínimo e exposição de produtos magistrais com objetivo de propaganda, conhecida como liminar para e-commerce magistral.
Na Justiça, já havia decisões favoráveis anteriores em Minas Gerais, onde o TJ-MG concedeu esse direito para ao menos nove farmácias.
Importante ressaltar que o uso de nome comercial para fórmulas manipuladas não implica aumento de risco dos medicamentos, cosméticos ou suplementos manipulados. Pelo contrário, favorece o paciente, que tem condições de comparar e diferenciar produtos por finalidade, qualidade e laboratório de produção.
No entanto, a Anvisa e os órgãos sanitários entendem que qualquer exposição ao público de produtos magistrais contendo nome comercial fere a RDC 67 - Boas Práticas de Farmácias de Manipulação. Essa norma restringe a exposição de produtos manipulados para fins publicitários, mas não proíbe a atribuição de nomes distintivos às fórmulas.
Vale frisar que produtos manipulados não precisam de registro sanitário na Anvisa, pois são personalizados e geralmente seguem prescrição de profissionais de saúde habilitados. Há, no entanto, produtos como cosméticos, alguns suplementos e determinados medicamentos fitoterápicos que podem ser indicados por farmacêuticos sem necessidade de prescrição, conforme autoriza a RDC 67, item 5.10.2, e permitido por resolução do Conselho Federal de Farmácia (CFF) desde 2007.
Nesse contexto, ao longo de décadas, a fiscalização vem autuando farmácias quando se depara com tais nomenclaturas, interpretando erroneamente que se trata de um produto industrializado sem registro
Recentemente, com a RDC 768/22, ao revisar as normas de rotulagem para medicamentos industrializados, a Agência introduziu uma nova proibição para o setor industrial: o veto ao uso de marcas próprias em medicamentos.
Esse conceito refere-se ao uso de nomes, marcas, logomarcas e identidades visuais por estabelecimentos que comercializam ou dispensam medicamentos diretamente ao consumidor, como farmácias e drogarias. A medida gerou grande debate no setor farmacêutico. Os opositores argumentam que a proibição prejudica a livre concorrência e impacta tanto fabricantes quanto consumidores.
Importante ressaltar que essa regra se aplica apenas a medicamentos, não abrangendo outras categorias, como suplementos. A determinação atinge o setor farmacêutico em um ponto nevrálgico, afetando distribuidoras, drogarias e farmácias que realizam manipulação.
Quando uma farmácia magistral tem autorização judicial para o e-commerce, está liberada para ofertar seus produtos diretamente ao consumidor. Por não haver proibição clara nos regulamentos da Anvisa sobre o uso de nomes comerciais em fórmulas manipuladas, a tendência é que estas possam ofertar seus produtos utilizando nomes distintivos, marcas registradas no INPI, além dos requisitos obrigatórios para rotulagem de quaisquer produtos que afetam a saúde, como composição, finalidade, dosagem, modo de uso, advertências e restrições.
A decisão recente da Justiça paulista impõe limites às restrições excessivas que impactam o setor de farmácias de manipulação no Brasil, o que motiva que empresas recorram ao Judiciário para evitar sanções indevidas. Esse julgamento também reforça que a Anvisa não pode impor restrições além do previsto nas leis federais, além de respeitar princípios constitucionais como igualdade, livre concorrência, razoabilidade, proporcionalidade e legalidade na administração pública.
* Advogada e consultora empresarial atuando desde 1999 na área de vigilância sanitária e assuntos regulatórios, especialista em regulação de farmácias e cannabis, fundadora da banca DLM e responsável pelo jurídico da associação Farmacann
Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
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