30 de junho, de 2024 | 10:00
A guerra civil que assola o Brasil
Ailton Cirilo *
Produzido anualmente pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Atlas da Violência é uma importante referência para entender e enfrentar os desafios relacionados à segurança e à criminalidade no país. Na edição de 2024, a publicação é um convite assustador para uma analogia à guerra civil brasileira.
Assim como uma guerra civil se caracteriza por conflitos prolongados e internos entre diferentes grupos dentro de um país, a violência urbana e o crime organizado no Brasil representam uma crise persistente que afeta milhões de cidadãos. Dados do Ipea apontam que 46.409 pessoas foram assassinadas no país, em 2022, deste total, 76,5% eram pretas e pardas.
Em Minas Gerais, um exemplo preocupante de subnotificação foi identificado: enquanto oficialmente foram registrados 41.740 homicídios entre 2012 e 2022, estimativas sugerem que o número real chega a 46.186, um aumento de 10%. A subnotificação revela falhas sistêmicas nos registros e investigações, obscurecendo a verdadeira extensão do problema. A disparidade entre números oficiais e estimados no estado destaca uma lacuna crítica na administração da justiça e na segurança pública.
A violência urbana e o crime organizado no Brasil representam uma crise persistente que afeta milhões de cidadãos”
A predominância de jovens como vítimas de homicídios, com mais de 321 mil registros entre 2012 e 2022, é um trágico reflexo das perdas observadas em conflitos armados. Em guerras civis como a da Colômbia, onde a violência afetou desproporcionalmente os jovens, a comparação entre os dados ressalta a urgência de medidas preventivas específicas e políticas públicas direcionadas para áreas periféricas.
Investimentos significativos em educação são essenciais para oferecer oportunidades de estudo e desenvolvimento aos jovens, reduzindo as desigualdades que perpetuam a marginalização e a vulnerabilidade. Além disso, programas de emprego e inclusão social são fundamentais para fornecer alternativas ao recrutamento por grupos criminosos e para fortalecer os laços comunitários, construindo um ambiente mais resiliente contra a violência.
Já a violência sexual é outra faceta devastadora dessa crise, especialmente contra meninas e jovens mulheres. Em 2022, ocorreu um estupro a cada 46 minutos no Brasil, refletindo a vulnerabilidade das vítimas e a inadequação das políticas de proteção e prevenção. Em situações de guerra civil, o estupro frequentemente é utilizado como arma de guerra para intimidar e controlar os civis, exacerbando ainda mais o sofrimento humano.
Em nosso contexto, é crucial e urgente a adoção de medidas para fortalecer as políticas de proteção às vítimas, garantindo o acesso à justiça e promovendo uma cultura de respeito aos direitos civis das mulheres, jovens e crianças. Os programas educacionais e de conscientização também são fundamentais para mudar atitudes sociais e prevenir a violência sexual desde cedo, construindo uma sociedade mais justa e segura.
Para além de estatísticas, os números são vidas perdidas, famílias destroçadas e comunidades vivendo sob constante medo”
Para além de estatísticas, os números são vidas perdidas, famílias destroçadas e comunidades vivendo sob constante medo. A inércia diante desses problemas perpetua o sofrimento e a injustiça. É imperativo que o Brasil adote uma ação decisiva, liderada por um compromisso coletivo de todas as esferas da sociedade para verdadeiramente combater essa crise complexa.
É preciso investir em uma abordagem integrada que não apenas fortaleça as políticas de segurança pública, mas também promova o desenvolvimento social e econômico. Investimentos em educação de qualidade, programas de emprego e inclusão social são fundamentais para desmantelar os incentivos à criminalidade e promover uma cultura de paz. Precisamos aspirar a um futuro onde todos os brasileiros possam viver com segurança e dignidade.
(*) Coronel PM, especialista em segurança pública.
Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
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