14 de maio, de 2024 | 12:00

Elucubrações sobre guerras e mulheres...

Nena de Castro *


Ganhadora do Nobel de Literatura em 2015, a russa Svetlana Aleksiévitch em seu livro “A Guerra Não Tem Rosto de Mulher” nos oferece uma visão única do esforço das mulheres lutando contra os alemães durante a II Grande Guerra. A história do horrível conflito sempre foi contada a partir da visão masculina, destacando os homens, embora nem sempre as mulheres ficassem na retaguarda. Sim, pilotaram tanques, aviões, foram franco-atiradoras, enfermeiras de campanha, trabalharam em hospitais... Não foi fácil para algumas se alistarem. Mentiam sobre a idade fingindo ser mais velhas, alistavam-se corajosamente, passavam por um treinamento rápido e iam para o front.

Aprenderam a atirar, marchavam horas nos deslocamentos, tiravam os feridos após combates, tratavam-nos como podiam... Nadiédja Vassílievna aos 19 anos, recebeu a Medalha por Bravura, como conta: “uma noite, uma companhia inteira de alemães veio fazer reconhecimento de combate na área em que estávamos. Houve tiros. Eles se retiraram de madrugada e começamos a ouvir gemidos vindo da faixa neutra. Havia ali um russo ferido. Ignorando meus companheiros, rastejei até ele, amarrei-o com um cinto e o puxei por cerca de oito horas, até chegar onde estava meu regimento. Salvei sua vida”. E os depoimentos se sucedem, com cenas comoventes de mulheres que marcharam para o front em condições dificílimas, com uniformes rasgados, carregando pesados armamentos, sem qualquer tipo de conforto, sem as coisas mínimas das quais uma mulher necessita, ajudando os companheiros, fazendo curativos, atirando, lutando naquelas batalhas cruentas onde o ser humano trucida outros numa carnificina desenfreada. Lutaram na horrenda batalha de Leningrado. Entraram na Alemanha destruída, voltaram para ajudara pátria a se reerguer...
“Há pouco celebramos o Dia das Mães. E mães, mesmo sendo paupérrimas, marias-sem-valia, lutam como titãs para dar de comer e criar seus filhos”


Houve um episódio entre tantos, que me deixou de coração sangrando: um grupo de partisans (resistentes que participavam de guerrilhas contra os alemães) foi cercado na floresta. Esconderam-se em um lodaçal, água até o pescoço, ficaram assim por dias. Mas uma operadora de rádio tivera há pouco uma criança, que chorava de fome. Os alemães tinham cachorros, e havia o perigo de todos serem descobertos pelo choro da criança. Todas as 30 pessoas morreriam. O comandante tomou a decisão. Ninguém falou com a mãe, mas ela entendeu: ”Foi baixando a criança enroladinha para a água e segurou ali por um longo tempo... A criança não gritou mais. E nós não conseguíamos levantar os olhos.” (AFEEEEE!)

Valorosas mulheres. Por que falo nelas, hoje? Porque há pouco celebramos o Dia das Mães. E mães, mesmo sendo paupérrimas, marias-sem-valia, lutam como titãs para dar de comer e criar seus filhos. Conheço tantas... E também porque em nossos dias, as mulheres combatem na Ucrânia, em Israel, na Faixa de Gaza, lutam contra a fome na África e em toda parte, lutam no Rio Grande do Sul contra a terrível enchente que arranca casas e vidas, numa coragem infinita.

Pois é, como sou grata à autora que foi atrás das mulheres que lutaram para colher seus depoimentos, sua visão sobre tanto sofrimento e heroísmo, vez que sempre se contou a guerra pela ótica masculina. E torcer para que essa sua frase seja verdade: “o ser humano é maior que a guerra.” (No meu entender, as mulheres são!) Assim seja, apesar de... E nada mais ouso dizer, pois “não me chamo Raimundo” e não mando nesse insano mundo e odeio rimas sobre estupidez! Au Revoir

* Escritora e encantadora de histórias

Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço


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