Expo Usipa 2024 02 - 728x90

16 de abril, de 2024 | 12:00

Azar de cumbuca...

Nena de Castro *


Zé Izaltino era um caboco arretado. Morando numa pequena vila do interior, vivia sua vida sem grandes novidades. Vivia com a mulher e dois filhos num pedaço de terra da fazenda do pai, Zeferino. Tinha nove irmãos, todos casados com exceção do caçula Nicolau. Zé era descendente de galegos, tinha pele clara, olhos “gateados” e cabelo liso. Desde a infância, desenvolvera duas características: falava pouco e era teimoso como uma mula. Não adiantava o pai dar conselhos, castigar, bater, Zé só fazia o que queria. E não gostava de bater boca, baixava os olhos, cerrava os maxilares, fingia ouvir as perorações do pai sobre o plantio do café e o cuidado com algumas vacas que possuíam. Saía dali e fazia o que queria, e pronto.

Por fim deixaram-no em paz, que fizesse o que achasse melhor! Na igreja, quando ia, ficava no último lugar perto da porta, e saía rapidamente ao final, para evitar as tagarelices, quase arrastando a esposa que queria cumprimentar as comadres. Zé Izaltino só tinha uma paixão na vida: admirava certo político mineiro que tinha sido governador e agora era presidente e postulava fazer o país crescer 50 anos em cinco. Ouvia as notícias no rádio à pilha e era fã da “Voz do Brasil”, um noticioso feito pelo governo que era um porre de chatice. Mas a seu modo, ele vibrava com as notícias, vez que ficava sabendo os feitos de seu ídolo. Bom, um dia uma notícia se espalhou na vilazinha como uma faísca de raio na palha seca: o presidente ia visitar uma cidade chamada Mantena e não se sabe por que, a pequena localidade tinha sido incluída no roteiro.

Zé Izaltino quase não acreditou na sua sorte: ia poder ver de perto o seu ídolo. Quem sabe, até poderiam trocar um aperto de mão, eita que a vida era boa. Mandou que a mulher lavasse e passasse o terno do casamento, tinha que estar nos trinques. Bem que a calça estava um pouco apertada na cintura, mas ele daria um jeito usando cinto e deixando o botão de cima desabotoado. Afinal, chegou o dia. A mulher e os filhos já estavam na vila, na casa dos sogros. Zé Altino tomou banho na bacia, vestiu o terno, ignorou a cintura apertada, montou no cavalo e saiu, peito arfante de emoção. Deu-se conta, porém que havia se esquecido de tomar o café com broa e queijo. O estômago roncou. E agora? Nisso, ao virar a curva da estrada, avistou um pé de mamão carregadinho. E havia um maduro. Só que o pé era bem alto. Não querendo parar para arranjar uma vara e derrubar o mamão, Zé resolveu guiou o cavalo pra debaixo do mamoeiro e ficou de pé na sela. Com muito esforço, alcançou o belo fruto com as pontas dos dedos e pensou: tá no papo. Ao tocar no mamão, esse se soltou e caiu na cabeça do cavalo, que se assustou e empinou.

O cavaleiro levou um tombo, cara no chão. Ficou todo relepado e espandogado, quebrou dois dentes da frente e teve o cotovelo direito trincado. Bem, desnecessário se faz dizer que não viu o presidente. E só lhe restou enquanto se recuperava ouvir no rádio Juca Chaves cantando “Presidente Bossa Nova” feita em honra de JK. Azar danado, mas fazer o quê? E nada mais digo a não ser que esse povo devia parar de guerrear, senão acabam tocando fogo no mundo! ARA!

* Escritora e encantadora de histórias

Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
Encontrou um erro, ou quer sugerir uma notícia? Fale com o editor: [email protected]

Comentários

Aviso - Os comentários não representam a opinião do Portal Diário do Aço e são de responsabilidade de seus autores. Não serão aprovados comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes. O Diário do Aço modera todas as mensagens e resguarda o direito de reprovar textos ofensivos que não respeitem os critérios estabelecidos.

Envie seu Comentário