11 de janeiro, de 2024 | 12:00

Opinião: Arrumando as gavetas

Ana Rosa Vidigal *

Início de ano, ressignificação de propósitos. A parte mais interessante de iniciar um ciclo é o que podemos fazer para ressignificar o que já foi. Foi, mas que permanece; não somos formados apenas de sonhos, somos também nossas histórias, e nossa trajetória. Somos as dores e os amores que fazem parte das nossas experiências e que permitem esse desabrochar [épanouissement, como dizem os franceses], do que somos hoje.

Ressignificar o que passou é fazer uma releitura do que vai continuar caminhando conosco: nossas memórias e o que nos impulsiona a seguir adiante; as conquistas e o que deixamos passar, o que ficou perdido no percurso percorrido; aquilo de que abrimos mão porque realmente precisava ser deixado para trás para seguirmos em frente.

No íntimo, sabemos tudo o que precisamos fazer para ‘reelaborar a rota’, tornar mais leve o que carregamos conosco nesta bagagem, recolhida no caminho, aqui e ali, e as lembranças que ficam materializadas em volumes, formas e cores daquilo que nos habita e nos constitui como seres únicos que somos.

Usando a intuição, a introspecção e a motivação para o ‘novo’, atitudes típicas desses momentos de re-começos, sabemos também muito bem o que podemos escolher levar adiante, ao cumprir a nossa trajetória de vida. Eis o cenário propício para ‘arrumar as gavetas’. E os ‘antigos’ nos ensinam com ternura o poder dessa ocasião: aproveitar o recomeço, a pausa necessária de ressignificação, para arrumar nossas gavetas (externas e internas), a nós mesmos, por que não?

“Ressignificar o que passou é fazer uma
releitura do que vai continuar caminhando conosco”


A gente sabe, gaveta é um lugar para muitos guardados. Eu, por exemplo, tenho duas gavetinhas em um móvel de cabeceira e nunca vi sair tanta coisa lá de dentro. Tirei tudo, limpei as gavetas literalmente, passei pano, lustra-móveis, deixei tomar ar. Ao guardar objetos novamente, arrumando minhas gavetas, optei por abrir mão de alguns deles, e escolher o que ia ficar.

Nem tudo pode ficar; escolhas são essenciais porque dizem respeito ao fortalecimento dos propósitos. Então, arrumar gavetas faz parte da trajetória e é crucial para a ocasião de iniciar novos ciclos, e para deixar espaço livre para o que vem por aí.

Quer um conselho a esse respeito?

Guarde sim, mas o que condiz, o que verdadeiramente permite sua essência ser plena. Guarde boas lembranças, guarde palavras de incentivo, guarde momentos de paz e bem-aventurança, guarde legado em suas gavetas. São parte de si e de seu percurso. Concomitantemente, reveja o que havia sido guardado até então e perceba se, em suas gavetas, ainda há lugar para aquilo.

Arrume, mesmo, profundamente, as suas gavetas; lustre-as, tire a poeira e ofereça você mesmo um lugar para novas coisas em suas gavetas.

Não deixe que elas sigam repletas neste reinício de vida: garanta espaço para novas memórias, para novas oportunidades, para novas vivências.

Deixe espaços vazios em suas gavetas, lugares vagos, e tenha certeza que vai preenchê-los nesta nova fase do caminho. Neste novo ciclo, acredite em novos capítulos de sua história, novos souvenirs. Um dia, eles também serão razão de escolhas; suas escolhas. Mas, por ora, o que realmente importa é arrumar gavetas. E deixar o ar entrar. Meu abraço e até a próxima quinta-feira.

* Professora, psicopedagoga e jornalista. Doutora em Língua Portuguesa pela PUC Minas e Université Grenoble III, França. Atua na formação de professores da Educação Básica, gestores, líderes e equipes, em diferentes organizações, ministrando palestras e cursos nos domínios da Educação e da Comunicação, e suas interfaces nas relações humanas. [email protected]

Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
Encontrou um erro, ou quer sugerir uma notícia? Fale com o editor: [email protected]

Comentários

Aviso - Os comentários não representam a opinião do Portal Diário do Aço e são de responsabilidade de seus autores. Não serão aprovados comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes. O Diário do Aço modera todas as mensagens e resguarda o direito de reprovar textos ofensivos que não respeitem os critérios estabelecidos.

Erica Oliveira

13 de janeiro, 2024 | 16:53

“Que belíssima reflexão, Ana!!
Muito obrigada por compartilhar ???”

Ezequias Pinheiro

11 de janeiro, 2024 | 22:31

“Sobre o guardar legado, isso me incomoda todos os dias , acordo, durmo, me alimento, trabalho, (estudo rsrsrs , Prof. Ana Rosa).....

Pensando e acho que estou agindo para tal !!!

As vezes o percurso muda um pouco , o que dói muito, mas creio , vou deixar um legado.”

Conceição Evangelista

11 de janeiro, 2024 | 22:26

“Amei o texto, parabéns,”

Ana Paula da Cruz Silva

11 de janeiro, 2024 | 20:46

“Deixar espaços vazios para preenchê-los nesta nova fase da vida. Temos muitos capítulos para escrever em nossa bela história.
Texto espetacular e que nos traz profunda reflexão.”

Mariana Rioga

11 de janeiro, 2024 | 20:16

“Amei o texto! Perdi a minha mãe em setembro de 2023 e, desde então, ressignificar e "limpar a gaveta" tem sido o que mais tenho feito.”

Sueli Resende

11 de janeiro, 2024 | 19:56

“Excelente reflexão. Parabéns.”

Maycon Veloso

11 de janeiro, 2024 | 14:32

“Achei o texto terapêutico. Realmente precisamos sempre organizar nossas gavetas para deixar conosco somente aquilo que reflete nossa essência.”

Envie seu Comentário