16 de setembro, de 2023 | 12:00

Opinião: Diário do Aço 45 anos

Marcia Lage *

Quando meu pai saiu de Itabira para tentar vida nova em Coronel Fabriciano, a primeira coisa que ele fez foi assinar o Diário do Aço. Eu acabara de me formar em jornalismo e gostava de ler o jornal no balcão do bar que ele tinha, na rua Icaraí, 22.

Os jornais eram a mão que nos guiava pelas cidades, pelo Estado, pelo país, pelo mundo. Havia as editorias locais, que davam notícias de obras públicas, serviços, demandas, denúncias. Os cadernos de cultura, que anunciavam o calendário de eventos da cidade, divulgava obras de escritores, músicos, artistas da terra em geral. Havia o caderno de política, com coberturas locais, estaduais e federais de interesse da população. E notícias do mundo que, de alguma forma, nos afetaria.


“A Internet ainda não é um bem gratuito e universal
e já domina todos os setores da vida humana,
provocando mudanças de comportamento de
resultados ainda imprevisíveis”


Nos cursos de Comunicação Social, uma disciplina intitulada Jornalismo Comparado ensinava que quanto mais perto do leitor estiver a notícia, mais interesse ela desperta. O Diário do Aço nos apresentava o Vale do Aço, sua gente, seus representantes nas Câmaras Municipais, na Assembleia Legislativa, no Congresso. Foi assim que minha família tomou pé da região, fixou-se e prosperou, na medida do possível.

O jornal cumpria seu papel e ainda cumpre, na sua teimosia pela versão impressa e no vanguardismo da versão online. Essa veio como o carro na frente dos bois. A Internet ainda não é um bem gratuito e universal e já domina todos os setores da vida humana, provocando mudanças de comportamento de resultados ainda imprevisíveis.

As notícias do mundo chegam primeiro aos leitores, criando um alheamento do que ocorre na comunidade. Sempre que vou a Coronel Fabriciano fico curiosa sobre obras em andamento, se o cinema ainda está de pé e qual filme está em cartaz. Se há algum evento cultural em Ipatinga ou Timóteo. Se o trem está funcionando ou não. Se o comércio vai abrir nos feriados. Tenho que pesquisar em vários sites e nem sempre obtenho a informação.

No tempo do Jornal impresso a gente sabia disso tudo ao mesmo tempo em que tomava uma cerveja, um café na padaria. O jornal servia a muitos ao mesmo tempo, havia debates, acréscimos de informações, a notícia local pertinho dos cidadãos.

A versão online do jornal cumpre também este papel, mas não aglutina, não fomenta debates, não serve depois para limpar os vidros, forrar os tapetes dos carros, pegar as fezes dos pets na rua, embrulhar o peixe na feira, as mudas de couves trocadas entre vizinhos.

Quando escrevi meu primeiro artigo para o Diário do Aço, o editor Alex informou que ele seria publicado na versão impressa. Num domingo. Planejei comprar o jornal, sentar numa padaria e lê-lo prazerosamente, como nos bons tempos do bar do meu pai. Depois, deixá-lo em cima do balcão, para que outros o lessem, sendo útil até a completa decomposição.

“O jornal cumpria seu papel e ainda cumpre,
na sua teimosia pela versão impressa e no
vanguardismo da versão online”


Não encontrei bancas de jornais abertas nem cafeterias que expusessem o jornal para que todos o lessem na calma de um café da manhã. Só na segunda feira é que comprei um exemplar e pude mostrar meu artigo a familiares e amigos e guardar comigo a versão impressa.

Não tenho resposta para a grave crise que a Internet provocou na leitura, na escrita, nas comunicações e no jornalismo. A verdade é que as empresas brasileiras foram subjugadas mais rapidamente que as estrangeiras, respondendo com demissões em massa, redução de conteúdo e simplificação da notícia.

O Diário do Aço, a exemplo dos jornais europeus que não se entregaram, continua resistindo. São 45 anos de existência aproximando o cidadão de suas cidades.

Que resista por mais 45 anos, promovendo mudanças necessárias no conteúdo, distribuição e tiragem, trazendo para o povo a realidade do seu entorno, importante para a construção da cidadania, do pensamento crítico e da indispensável sensação de pertencimento.

* Jornalista e escritora. Publica crônicas semanais no site 50emais e em sua página no Facebook: Marcia.Lage1

Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
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Comentários

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Tião Aranha

16 de setembro, 2023 | 20:17

“Bom texto, com princípio, meio e fim. Naquele tempo jornalista era autêntico formador de opinião. Com o advento da internet, hoje não é mais. Deu vez aos imbecis, sim, mas facilitou o processo da comunicação em massa. Tudo que se ganha em quantidade - perde em qualidade. As obras literárias ficaram de lado. A Cultura perdeu em substância, em conteúdo. Se já era ruim, ficou pior. Se bem que papel aceita tudo. Risos.”

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