23 de agosto, de 2023 | 13:00

Opinião: Os deserdados da Terra

Antônio Nahas Jr.

Há alguns dias, ao seguir pela avenida Maanaim, em direção ao Centro de Ipatinga, vi duas pessoas banhando-se no ribeirão Ipatinga. Pensei então: "Puxa vida! Ribeirão de águas limpas permite isso! Que maravilha de cidade...". Chegando mais perto, olhando mais atentamente, notei que elas não estavam propriamente banhando-se, mas tomando banho. Isso mesmo: moradores em situação de rua, sem ter onde ficar, abrigados precariamente nos gramados próximos às margens, despossuídos de tudo, utilizando o ribeirão para sua higiene corporal.

Essa cena urbana se repete não só em Ipatinga, mas em todas as cidades brasileiras. Em Belo Horizonte, o que se observa nas ruas centrais, sobretudo naquelas próximas à rodoviária, é espantoso: tendas precárias; cobertores e colchões nas calçadas; fogões improvisados; roupas penduradas e o forte odor de urina ajudando a compor o cenário. E, claro, a presença dos fiéis vira-latas, sempre atentos, alegres companheiros dos seus donos.

Esses sinais claros de desigualdade e exclusão social não podem passar despercebidos. Sabemos muito bem os efeitos colaterais do desenvolvimento econômico pela sociedade afora, ainda mais nesse momento em que a tecnologia transforma todo o setor produtivo e de serviços da economia, forçando a modificação das relações de trabalho; criando um mar de pequenas empresas de prestadores de serviços; tornando obsoletos setores inteiros da economia. Como já afirmou Noah Harari, o celebrado autor do livro “Sapiens”, criamos uma sociedade que pode prescindir do ser humano.

Este quadro fica ainda mais cruel quando vemos que o capitalismo das grandes corporações tecnológicas - as chamadas Big Techs - tende a concentrar ainda mais a renda em nível mundial.

A responsabilidade para enfrentar realidade tão agressiva não pode ser apenas do Estado. A economia política tradicional propunha uma velha e estreita visão do capitalismo, onde a empresa contribuiria para a sociedade ao dar lucro, gerando renda, empregos, salários, consumo, investimentos e impostos. Tocar a empresa como sempre seria um benefício social suficiente. Os aspectos ambientais e sociais ficariam fora do horizonte empresarial. Como diria Milton Friedman, o único propósito empresarial seria o lucro, e nada mais. A solução de problemas sociais seria entregue a governos e a ONGs. As externalidades geradas pela atividade econômica, entre as quais destaca-se o passivo ambiental, eram vistas como o "custo do progresso"; um mal necessário a ser sanado pelo Estado.

“Esses sinais claros de desigualdade e exclusão social não podem passar despercebidos”


Esta visão foi sendo gradualmente modificada, e hoje a agenda ESG - Governança Ambiental, Social e Corporativa – alterou-se completamente. Nesse método de trabalho, as empresas compartilham com a sociedade a responsabilidade pela defesa do ambiente e pelo desenvolvimento socioeconômico.

A Agenda ESG procura integrar os principais personagens do mundo socioeconômico num processo integrado para gerar o desenvolvimento da sociedade e o aumento da riqueza social.

Segundo os principais economistas que a analisam, sua aplicação aumenta o valor gerado pela atividade econômica, pois eleva a produtividade geral dos fatores de produção. E, além disso, compartilha de forma transparente o valor gerado, fazendo com que a atividade econômica semeie benefícios pela sua cadeia de valor e por toda a sociedade.

Felizmente, na nossa região, como a Usiminas e a antiga Acesita tiveram apoio estatal na sua concepção, foram realizados grandes investimentos para viabilizar a atividade siderúrgica, pois seus idealizadores estavam cientes das necessidades sociais que viabilizam a atividade econômica.

Hoje, essa agenda evoluiu para o chamado capitalismo de stakeholders (partes interessadas), onde todos os atores – fornecedores, colaboradores, poder público, lideranças locais, mercado comprador – são levados em conta. E esta prática também é lucrativa: abre mercados, reduz custos, melhora o conceito da atividade empresarial e atrai financiamentos a juros mais baratos e investidores interessados em práticas empresariais inovadoras.

Parafraseando um grande amigo: entre ganhar dinheiro e salvar o Planeta, prefiro os dois....

* Economista, especializado em gestão financeira. Fundador, Presidente e diretor de Sustentabilidade da NMC integrativa.

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