01 de abril, de 2023 | 16:00

Grupo regional debate o cinema afro-brasileiro

Coletivo Negrume realiza produção audiovisual “racializada”

Fotos: Divulgação
Novo projeto traz exibições de filmes e debates sobre a produção audiovisual racializadaNovo projeto traz exibições de filmes e debates sobre a produção audiovisual racializada
Em 2020, o país adentrou em uma atmosfera de caos generalizado e incertezas em decorrência da covid-19. Os veículos de comunicação informavam uma crescente no número de óbitos, um governo marcado pelo desmonte de políticas públicas voltadas para produções culturais e artísticas, ataques e censuras direcionadas aos artistas e aos trabalhadores da arte, que viram suas atividades interrompidas por tempo indeterminado. Foi neste contexto que Gustavo Nascimento, artista que cresceu pelas ruas do Caladinho de Cima, na periferia de Coronel Fabriciano, retornou ao Vale do Aço, devido às aulas suspensas no curso de Atuação, em São Paulo.

“Um corpo que precisou se ausentar do seu território para estudar teatro, e acabou encontrando, também no audiovisual, um lugar de fala e experiência, rompendo caixas que são condicionadas dentro dos processos formativos e compreendendo seu corpo, enquanto pessoa preta e periférica, capaz de estar em todas as áreas do fazer artístico”, descreve o texto de divulgação do artista. “A pandemia serviu para escancarar ainda mais as desigualdades, o que impactou profundamente a produção cultural de pessoas negras. Nesse pós-pandemia, o nosso movimento vem no sentido de fortalecimento” reflete Dani, uma das críticas convidadas para o debate após as exibições dos filmes.

Para os artistas, “as leis emergenciais de fomento à cultura foram de extrema importância para artistas independentes, atuando não só como fonte de renda em um momento de calamidade pública, mas, também, como possibilidade de continuar construindo artisticamente e lançando gestos na realidade de um contexto asfixiante”.

Aline Oliveira, atriz paulista, que também compôs o grupo de críticos nos debates após exibição, foi contemplada em São Paulo como uma das 150 criadoras de audiovisual a produzir um curta que refletisse o momento pandêmico. “Foi uma experiência linda! Importante e significativo fazer um filme com minha família. Eu não entendia muito bem como fazer cinema e, pela primeira vez, apesar de tudo que estava acontecendo no mundo, pude fazer meu primeiro filme ocupando o lugar de roteirista e diretora… E isso tudo com as pessoas que eu mais amo no mundo!”, comentou.

Artistas partem de experiências individuais para explorar o universoArtistas partem de experiências individuais para explorar o universo
No fim de semana de 17 a 19 de março, foi transmitido pelo canal do YouTube do Coletivo de Pesquisas em Teatralidades Negras Negrume os filmes “Etiquetas”, “Isto não é um Juliet”, “Deixe Deus com Seu Mundo”, produzido por Gustavo Nascimento, de 24 anos, e “Dengo”, também produzido por Gustavo e Elison Silva, de 26 anos. Os criadores partem de suas experiências pessoais, “enquanto pessoas racializadas e homoafetivas, para explorarem seus universos enquanto homens que amam outros homens, convidando o espectador a servir um espaço à mesa para refletir acerca do eu-racializado, processos de negação, culpa, vergonha, autoaceitação, espiritualidade, afetos afirmativos e a evolução da representação das negritudes na arte brasileira”.

“É inegável que há algo de muito positivo na construção do arquétipo negro ao decorrer dos anos, sobretudo porque hoje temos uma arma poderosíssima em mãos: a câmera. Passamos do lugar de objeto para o de sujeito. Roteirizando e enquadrando as nossas histórias da forma que queremos contar. Pense comigo… Podemos citar os elementos de romantização da pobreza em Órfeu Negro, passando pela contribuição imensa de Grande Otelo nas produções da Atlântida e do Cinema Novo até chegar em cineastas como Sabrina Fidalgo, Lázaro Ramos, Glenda Nicácio, Jeferson De, Renata Martins e tantos outros que vêm desenhando narrativas das dores históricas, de maneira não-convencionais, muito sofisticadas e complexas, como somos”, argumentou Gustavo Nascimento.

Com o objetivo de retomar o resultado do que foi elaborado durante esses tempos, o Coletivo de Pesquisas em Teatralidades Negras Negrume tornou público a sua nova ação: a série “Conversas Escurecidas sobre o Audiovisual”, dando ênfase aos criadores negros e com produções realizadas durante o isolamento social. A iniciativa vai ser desenvolvida ao longo deste ano, em celebração aos dois anos de existência do Coletivo. As lives e debates já estão disponíveis no perfil do Instagram do Coletivo (@NEGRUMETEATRO), assim como os filmes que se encontram na plataforma do Youtube (youtube.com/@negrumeteatro).

“O projeto vai ao encontro da importância de dialogarmos entre nós, pessoas pretas, a partir dos nossos atravessamentos e vivências, rompendo lugares de validação em relação a arte europeia. Construímos, dessa forma, um espaço de compartilhamento, onde a afetação, a sensibilidade emergem de forma autodeterminante porque nosso ponto de partida é a autorreferência.” conclui Matí Lima, presente todos os dias nos debates após as transmissões.
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