
21 de dezembro, de 2022 | 14:00
Telessaúde: a um passo da aprovação
Sandra Franco *
Mais um passo foi dado rumo à aprovação do texto da lei que autoriza a prática da Telessaúde em todo o território nacional. Vale, porém, dizer que essa metodologia já está presente no setor, sendo praticada por vários profissionais da saúde: nutricionistas, farmacêuticos, psicológicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, todos devidamente autorizados pelos seus próprios Conselhos, assim como também ocorre com os médicos, por meio da Telemedicina. No último dia 13 de dezembro, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou o PL 1998/2020, rejeitando, porém, o substitutivo do Senado. O texto final aguarda a sanção presidencial.Afinal, por que a lei se faz tão importante se a prática está normatizada pelos Conselhos, inclusive sendo amplamente aceita pela sociedade? A lei possibilitará a criação de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento da Telessaúde, destinando-se mais recursos para a implementação da infraestrutura necessária e a capacitação da equipe assistencial. O atendimento pela via de tecnologia de áudio e vídeo não é mera transposição do real para o virtual, essencial que os profissionais tenham desenvolvidas habilidades para a teleanamnese, para a telepropedêutica, para um teleatendimento, enfim. Imperativo construir, de forma objetiva, protocolos com linhas de cuidado ao paciente, em todas as áreas e especialidades.
Quando o texto passou pela apreciação do Senado, ganhou emendas que o tornaram mais restritivo quanto à indicação de drogarias e farmácias pelas plataformas de prescrição eletrônica. A referida restrição foi sabiamente rejeitada pelo Congresso: evidente que não se pode tirar do consumidor o direito de escolher onde desejar comprar seus medicamentos, mas oferecer-lhe opções próximas à sua residência ou mesmo possibilitar descontos é favorável a ele e ao ecossistema de saúde.
O fundamental e imperativo legal reside, todavia, no consentimento do paciente quanto ao compartilhamento de dados com esses estabelecimentos, caso haja.
A lei possibilitará a criação de políticas
públicas voltadas para o desenvolvimento da Telessaúde”
Uma Emenda do Senado que foi mantida pela Câmara estabelece que compete ao Sistema Único de Saúde desenvolver ações de aprimoramento do atendimento neonatal, com a oferta de ações e serviços de prevenção de danos cerebrais e sequelas neurológicas em recém-nascidos, inclusive por Telessaúde.
A Telemedicina e a Telessaúde foram aceleradas por conta da pandemia da covid-19. A tecnologia no atendimento do setor de saúde foi permitida em caráter emergencial durante a pandemia pela Lei 13.989, de 2020, mas ainda precisa de uma regulamentação permanente.
Temos iniciativas no governo com programas como o PROADI-SUS e a Rede RUTE (Rede Universitária de Telemedicina), que se provaram eficientes, em especial, quanto à teleconsultoria. Hospitais de referência no país, com a utilização de financiamentos oferecidos pelo PROADI (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde, provaram como é possível ampliar o acesso à saúde, diminuir as filas de espera por especialistas e utilizar recursos públicos de forma eficiente com a e-health.
Cabe ressaltar que a Telessaúde seguirá os princípios de autonomia do profissional, consentimento do paciente (incluindo direito de recusa à modalidade e garantia do atendimento presencial), confidencialidade dos dados, responsabilidade digital e promoção da universalização do acesso aos serviços de saúde. A prática ficará sujeita ao Marco Civil da Internet (Lei 12.965, de 2014, à Lei do Ato Médico (Lei 12.842, de 2013), à Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709, de 2018), ao Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 1990), e à Lei do Prontuário Eletrônico (Lei 13.787, de 2018).
A Telessaúde seguirá os princípios de autonomia
do profissional e consentimento do paciente”
Para o exercício da Telemedicina, pelo projeto aprovado, será necessária a inscrição do profissional no Conselho Regional de Medicina (CRM) de origem, mas não será necessária inscrição no CRM do estado em que o paciente for atendido. O texto também prevê que é obrigatório o registro das empresas intermediadoras dos serviços virtuais, bem como o registro de um diretor técnico médico dessas empresas no CRM dos estados em que estão sediadas. Essas exigências já estão previstas na Resolução CFM 2134/22, vigente na atualidade.
Além disso, os convênios médicos também poderão oferecer atendimento via Telessaúde. E terão que seguir os mesmos padrões do atendimento presencial em relação à contraprestação financeira. O plano de saúde fica proibido de impedir ou dificultar o acesso ao atendimento presencial, caso este seja a opção do profissional de saúde ou do paciente.
É preciso democratizar o acesso aos serviços de saúde online, seguindo exemplos no mundo de países pobres e de outros desenvolvidos que têm a Telemedicina como integrante de seus sistemas de saúde há décadas. Apenas para ilustrar três grandes sistemas: Índia, Estados Unidos, Reino Unido (no sistema de saúde britânico, aliás, a primeira consulta deve ser virtual).
A Telessaúde e a Telemedicina foram importantes na pandemia e poderão ser ainda mais relevantes para serem atingidas as metas de melhoria do atendimento à população e de eficiência na utilização de recursos do sistema. E, com a aprovação, reafirma-se a segurança jurídica necessária para que os serviços de saúde sejam prestados com excelência por meios tecnológicos, garantindo o direito do paciente à saúde e à vida digna.
* Consultora jurídica especializada em Direito Médico e da Saúde, doutoranda em Saúde Pública, MBA-FGV em Gestão de Serviços em Saúde, diretora jurídica da Abcis, consultora jurídica da ABORLCCF, especialista em Telemedicina e Proteção de Dados, fundadora e ex-presidente da Comissão de Direito Médico e da Saúde da OAB de São José dos Campos (SP) entre 2013 e 2018
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