20 de setembro, de 2022 | 15:00

De gregos, troianos e bugrices...

Nena de Castro *

Eu ia distraída, dando uma voltinha aqui pelo Imbaúbas mesmo, então subi pra perto da caixa d’agua e fiquei ali, espiando o verde, quando vi um sujeito que se aproximava. Ele era alto, estava usando uma túnica esfarrapada sobre uma saia. A túnica lhe caía pelos ombros. Usava umas sandálias de couro que lhe subiam perna acima e andava cambaleando. Já preparada pra correr, peguei uma pedra e pensei: mesmo não sendo Davi, posso causar algum mal ao sujeito com uma pedrada bem dada. Ocorre que o gajo se sentou e segurou a cabeça entre as mãos, murmurando: Por Zeus, onde estou? E essa luz extasiante que me deixa cego? E ali está uma humana do cabelo esquisito, com roupa esquisita, e eu não tomei nenhuma birita! O sangue ferveu, o cara estava implicando com meu cabelo? Ia tomar pedrada na orelha e não demorava!

- Acá, ô estrupício, num mexe com meu louro, não, ara! Marmota! -Ocê com essa roupica rasgada e suja, tem a audácia de falar de mim? Quem é você afinal? De onde veio?

- Ah, eu fugi da caverna onde estava acorrentado com outros, lá é escuro e a gente só via sombras dos passantes. Lá tem mais gente.

-Uai, aqui no Brasil tiraram as correntes desde a princesa Isabel! Na verdade, deixaram o povo escravizado com uma mão na frente e outra atrás, sem casa, sem comida, sem direitos... E um tal de Rui Barbosa mandou queimar toda a papelada referente ao tráfico temendo indenizações...

- Não sei do que fala, eu sou grego e estava acorrentado na caverna de Platão.

-Grego? Platão? Caramba, moço, o senhor está longe de casa! O único grego que eu aprecio é o Brad Pitt interpretando Ulisses, lutando na guerra de Troia com aquelas pernocas lindas que apareciam por debaixo do saiote, segurando aquela espada enormeee, um must. E ele é americano, melhor deixar pra lá, senão fica mais confuso ainda...

-Sim, não entendo o que fala, só sei que estávamos acorrentados numa caverna, como falei e pensávamos que tudo era escuro ou só sombras e no entanto, olhe para essa beleza, essa claridade que me permite ver tudo. -Vou voltar pra libertar meus companheiros e trazê-los para a luz do conhecimento.

- Acá, moço, tô assuntando aqui, se eu fosse ocê num voltava não. Eles não vão acreditar, vão duvidar, podem até te agredir...

-Não, eu tenho a força da verdade do meu lado, eu tenho que trazê-los para essa liberdade, claridade, felicidade...

-Sua ideia é boa - falei – você é generoso, mas tem gente que chafurda na lama e não quer sair dela, não quer enxergar. Conheço um tantão de gente assim. Não vai, não, moço, vai dar zebra, vai dar bode, vai ser pior que briga em estádio de futebol. Fica aqui!

O grego, contudo, não quis me ouvir e tomou o caminho de volta pra caverna. Coitado, vai levar porrada até morrer, pois existem cegos que preferem viver na escuridão a caminhar para a luz do entendimento.

Pois é, meus cinco queridos leitores: falando em mitos gregos, sinto-me tal qual o titã PROMETEU, que cedeu o fogo aos homens e, como castigo, foi condenado por Zeus a ficar acorrentado no topo do monte Cáucaso onde diariamente uma águia lhe devorava o fígado; também me devoram o coração todos os dias, com a insanidade, as injustiças e as manobras dos que creem que trevas são melhores que a luz! (E nada mais digo)

* Escritora e encantadora de histórias

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Comentários

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Tião Aranha

20 de setembro, 2022 | 16:21

“Ultimamente estou sempre aqui a procura do residual: liberdade, democracia, verdade, mentira, maldade versus bondade. Ninguém quer ser testemunha de nada. Todo mundo quer ser amigo do rei. O mal do século. Risos.”

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