28 de junho, de 2022 | 14:00

Tudo tem seu dia...

Nena de Castro *


Conheceram-se num bar, num sábado qualquer. Quer dizer, ele a viu pela primeira vez. As mesas ao ar livre fervilhavam com frequentadores que buscavam aliviar o calor no chope gelado. Os risos e conversas em alta voz atravessavam a noite. “Nossa linda juventude”, pensou e sorriu para si mesmo, ao lembrar que já completara 33 anos. Tinha um trabalho bem remunerado numa corretora de valores, um apartamento razoavelmente bem localizado, fizera muitas viagens pelo exterior, mas no fundo d’alma, sabia que queria mais. Tivera um namoro longo com Elvira, todos pensavam que se casariam, mas tudo acabou quando ela perdeu a paciência e decidiu partir pra outra, ou melhor, pra outro.

Acostumado a conquistas fáceis, sexo casual, bem lá no fundo queria mais, algo mais profundo que lhe virasse a cabeça, algo que doesse, aquela loucura de amor que alguns experimentavam. Nem sabia direito o que era, só sabia que poderia identificar quando acontecesse.

Então, ele a viu numa mesa, com duas amigas. Era morena clara, cabelos cacheados, rosto pequeno e olhos faiscantes. Mas o que lhe chamou a atenção foi a risada que soou como um tilintar de cristal, como um voo de garça, como uma claridade em manhã nublada. As outras moças também sorriram e o papo continuou animado.

Nisso, seu amigo Tom chegou com a bebida que fora buscar, já que o lugar cheio tornava o serviço mais lento. O amigo sorveu a bebida e voltou a falar dos investimentos, vez que ambos trabalhavam na mesma firma. Ele respondeu, sem deixar de observar a moça que continuava a conversar com as amigas, sem perceber seu olhar.

Depois de certo tempo, o amigo notou seu olhar, riu e comentou que estava entendendo sua distração. Nisso, a moça e suas acompanhantes se levantaram para sair do local.

- Estão indo embora, disse Tom.
- Vamos lá, convidá-las para assentar conosco, tomar mais um drinque.
- Quem sabe? – piscou malicioso.

Ele, no entanto, não se moveu apenas ficou olhando a moça saindo, cumprimentando algumas pessoas...

- O que houve?, perguntou o amigo
- Ficou tímido agora? E riu.

Ele deu um sorriso e continuou acompanhando com o olhar o trio que se afastava. Então chegaram amigas que se assentaram com eles, um grupo próximo trouxe um violão e as músicas, cantadas por todos, animavam mais ainda a noite.

No domingo, foi para a casa dos pais, veio o almoço e muita diversão com a zoada dos sobrinhos e a discussão dos cunhados, cada qual afirmando que seu time era o melhor.

Então, na terça-feira, numa avenida movimentada, ele a viu num relance, entrando em uma loja de flores. O tráfico intenso impediu que parasse e também não queria aparecer assim de repente, parecendo um conquistador barato à cata da presa. Seguiu para o trabalho e mergulhou nos números e índices, compra e venda, atendimento aos investidores...

E assim a semana passou e a academia e o tênis noturno tomaram seu tempo. Ao voltar para casa, certa noite, avistou a jovem com um grupo de moçoilas saindo de um prédio. Percebeu que era uma academia de dança, pela postura das meninas e pelos volteios que algumas faziam, girando no ar com perícia, cantarolando uma música. Ficou observando enquanto se despediam, e o “até amanhã, professora”, dito com respeito e alegria, mostrou-lhe o que a moça fazia.

Pensou então que era hora de dar uma mãozinha pro destino, comprou algumas flores e, na outra noite, esperou que as alunas se afastassem e deu um jeito de esbarrar na moça que ia em busca de seu carro. Pediu desculpas, pegou o buquê que deixara cair e seguiu seu caminho.

Bem, repetiu a manobra por três vezes, flores e bombons, caíam no chão e ele os recolhia, dizendo que eram para a mãe, a tia e a madrinha que aniversariavam. E aí passaram a se cumprimentar, seu nome era Milene, encontraram-se em um café e ela falou de sua profissão, acreditava que a dança mudava a vida das meninas e explicou que seu projeto atendia a adolescentes em situação de risco, seus olhos brilhavam e sua fala contagiava sem contar o riso de cristal.

E o candidato a solteirão impenitente se sentiu preso em uma teia cálida de emoções e sentimentos e resolveu entrar de cabeça naquela relação. Parecia que as linhas do destino tinham se cruzado, que a lua jogara seu charme na vida dele, e que daí pra frente, haveria sempre um brilho extra em sua existência...

* Escritora e encantadora de histórias

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Comentários

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Tião Aranha

28 de junho, 2022 | 22:52

“Bom texto. É só colocar nas mãos de Deus que ele escolhe.”

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