26 de maio, de 2022 | 16:12

Por uma teoria crítica da arte ipatinguense

Vinícius Siman *

Há já mais de cinquenta anos temos em Ipatinga uma efervescência no movimento artístico e cultural com suas ramificações na literatura, no teatro, na dança e nas artes plásticas, entretanto nunca houve nenhum esforço da nossa classe em pensar sua arte. Toda a nossa cultura é um grande meio de produção à moda metalúrgica, com patrocínios da Usiminas a peças de teatro, eventos literários e afins. A primeira característica de uma arte ipatinguense é, sem dúvida, a produção corrida, em grande escala e popular. É impossível pensar em arte ipatinguense sem pensar em um forte apelo populista, porém não necessariamente de maneira pejorativa.

Digo popular (e populista) de modo avesso a uma visão frankfurtiana, essa acessibilidade ao público corrente — raramente com objetivo libertador — pinta nosso movimento com peças de teatro cômicas e desinteressadas pra desestressar o trabalhador, academias de balé pras filhas da classe média, artes plásticas voltadas a monumentos pouco belos, mas enaltecedores do nosso aço e literatura infantil por vezes rica, mas outras nem tanto. O poeta ipatinguense, por exemplo, faz livros de bolso, pequenos e rápidos, geralmente falando de amor ou desenhando rabiscos odiosos sobre a sua cidade que são lidos nos assentos dos ônibus.

Nena de Castro e Goretti de Freitas foram as primeiras a fazer literatura em Ipatinga. Rubem Leite foi o primeiro a fazer literatura ipatinguense. Na dança, o Hibridus trouxe novidades internacionais pra cá enquanto a Flux estabeleceu uma dança mais regionalista. Tomie Ohtaki e Vilma Noël esculpiram a forma como a Usiminas vê Ipatinga, já Camila Oliveira, Gunther Estebanez e Rosane Dias criaram as nossas artes plásticas. Darci di Mônaco fundou a paixão ipatinguense pelo teatro, que perdurou no resistente Grupo Farroupilha e alastra-se pelos glamurosos saguões dos teatros Centro Cultural Usiminas e Zélia Olguin. Em fotografia, os mestres são Nilmar Lage, Eduardo Galetto, a técnica, porém não menos artística, Elvira Nascimento e os novos e experientes Dani Dornelas e Lucas Carreiro, prodigiosos. Cinema, sempre Sávio Tarso. A música ipatinguense é feita pelo baianíssimo ipatinguense Gustavo Maia, pelo timoteense Pablo Cardoso (também ídolo do teatro, como Làmppi) e a genuinamente ipatinguense Liz Eulália. Obviamente há muitos outros talentos na cidade que eu infelizmente não conheço, não considero talentos ou simplesmente não quis citar, mas, estejam certos, Ipatinga está muito bem representada.

“Aqui sempre se produziu arte, mas ninguém
nunca ousou pensar a arte que aqui se produz
a não ser Rubem Leite, o Balzac ipatinguense”


Reverenciada por Augusto Boal, que é lido em incontáveis universidades nacionais e internacionais, nossa cidade sempre teve uma forte e significativa produção artística, porém nenhuma produção intelectual. Sem sequer um polo de universidade federal mesmo tendo um dos maiores IDH’s de Minas Gerais, a cidade fica à mercê do autodesconhecimento ou de análises estrangeiras. Aqui sempre se produziu arte, mas ninguém nunca ousou pensar a arte que aqui se produz a não ser Rubem Leite, o Balzac ipatinguense, que na sua Comédia Humana (o blogue aRTISTA aRTEIRO), observou nossa cultura, nossas origens, nossa dialética e filosofia, nossa produção artística, nosso povo. Rubem é, indubitavelmente, o primeiro intelectual ipatinguense, o primeiro a pensar a arte de Ipatinga. Depois dele viemos Flávia Frazão e eu, que em inúmeras oportunidades debatemos publicamente a importância de se criar uma identidade da particular arte ipatinguense, tanto como uma teoria crítica de sua existência.

Uma de nossas maiores falhas é sempre ter tido um grande movimento artístico, porém nenhuma teoria ou estilo definido que o sustente. Na busca do progresso e expansão do nosso modo exclusivo de fazer arte (sem querer soar regionalista demais), nos deparamos com a força do capital e seu poder de apagamento da história, com os egos de alguns artistas que reinam absolutos, no topo, sem ninguém que os analise sem parecer fofoca de bairro e a população que engole a verborrágica e panfletária arte fácil e industrial.

* Bacharelando em filosofia, escritor e crítico literário ipatinguense nascido em 1999. Tem 11 livros publicados. Troféu Arco-Íris dos Direitos Humanos (2018). Contato: [email protected]

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Comentários

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Glaussim

27 de maio, 2022 | 12:32

“Existem muitos outros artistas, grafiteiros, artesãos e cantores. Nomear favoritos é capricho da subjetividade do autor da matéria... Se não agir conforme a "tribo", viverá na marginalidade artística e a vida passa sem ser notado aqui. Percebo que a forma ainda é ser aceito pelo "clube" de amigos favoritos das artes no Vale do Aço. O resto que encontre alguma sorte! A selva do mundo é assim bem parecida com o que ocorre entre empresas...”

Tião Aranha

27 de maio, 2022 | 08:33

“Falou tudo da arte fácil e industrial. Inclusive, citando o nome dum artista de Timóteo que vi crescer. Tá ruim mas tá bom. A esquerda voltando ao poder deve acender uma luz de esperança na Cultura deste país. Falta nós escritores escrever e acompanhar projetos culturais pros municípios. É muita confusão! Risos.”

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