30 de novembro, de 2021 | 14:24

Era uma vez...

Nena de Castro *

Se tem uma coisa prazerosa, que encanta esta escriba, é contar histórias. É uma magia que se compartilha, é uma deliciosa forma de ensinar a pensar, de divertir e encantar. E a narração oral tem uma força, uma luz que atravessa tempos e fronteiras.

Segundo o ator, escritor e contador emérito de Histórias, professor Celso Sisto, contar histórias é um meio de comunicação ancestral e nos remete a Platão, que na sua “República” já se referia à importância de contar contos – primeiro os contos, depois a ginástica – para a educação ética das crianças gregas, sem contudo negar a função de entretenimento que esses mesmos contos podiam proporcionar. E segundo Aristóteles, ouvir uma boa história é também experimentar a catarse. E aí saltam nas lembranças os aedos, bardos, rapsodos, jograis, trovadores, saltimbancos, menestréis e bufões, que contavam histórias e levavam diversão e cultura ao povo em sua época. Na verdade, euzinha e muita gente mais, herdamos as histórias e causos contados por nossos avós, pais, tios, amigos e vai morrer com a boca cheia de formiga quem negar que já molhou as calças com medo de assombrações, saci e mula sem cabeça...Rs.

É um trem meio doido imaginar nesse mundo loucão, cercados e escravizados pela tecnologia, a audácia de convidar algumas pessoas para ouvir Histórias! Sim, ainda há pessoas que podem ouvir mais que suas próprias vozes e que são capazes de acolher palavras, no silêncio preenchido por uma pausa, um gesto, um olhar. Junte-as num semicírculo e fique bem perto - a distância necessária para que cada uma sinta-se única sem prescindir do grupo – e então, deixar o olhar fitar o avesso e ir se derramando, palavra por palavra, no córrego da emoção. E aí , contar de reis e rainhas, príncipes e princesas, gnomos e duendes, meninos e meninas, animais falantes e coisas do outro mundo, ou desse mundo mesmo, contadas com emoção renovada a cada vez. As crianças se encantam com o possível e o impossível. E os adultos se encantam em vislumbrar um caminho que lhes devolva o sonho.

Evidente é que o bom contador de histórias tem que ter paixão pela palavra pronunciada e contar a história pelo prazer de dizer. No entanto ele/ela deve também ter paixão imensa pelo silêncio, pois quando o silêncio interior se torna insuportável é que o contador está pronto para contar uma história. Toda preparação de História produz um rumor silencioso que vai se amplificando, até explodir em palavras.

Critério indispensável para escolher uma história é o que leva em conta a qualidade literária do texto e aí o contador abre espaço para o lúdico, para o humor, sem deixar de observar a força e coerência dos personagens, atentar para a magia e fantasia e o real entremeando os diálogos fluidos e ricos.

Quem conta tem que estar disposto a criar uma cumplicidade entre história e ouvinte, oferecendo espaços para quem ouve se envolver e recriar. Esses espaços de locomoção do ouvinte dentro de uma história podem ser construídos pelas pausas, silêncios, ações, gestos e expressões de forma harmônica. Deve-se oferecer originalidade, surpresa, conflitos instigantes, questionamentos nas entrelinhas, agilidade da contação e expressividade, evitando o didatismo, a lição de moral palavras e gestos estereotipados, maniqueísmo e preconceito.

Bem, nessa semana dei uma lida nas Fábulas Italianas de Italo Calvino e me deliciei com as histórias, imaginando como será conta-las para divertir meu público. Aí, achei a saga de uma princesa, na verdade a caçula de sete irmãs cujo pai perdera uma guerra, o reino e estava preso.

A mãe e as filhas passavam privações e um dia, uma velha que pedia esmolas explicou à rainha que a caçula era desventuradésima e que devia expulsá-la de casa para o azar ir embora. Ao ouvir isso, a própria princesa se foi, ela não queria que a “mala suerte” permanecesse com a família. E por onde passou, tudo dava errado. Ela fugia espavorida, até que achou uma lavadeira no reino vizinho e foi morar com ela. Ajudava a lavar a roupa do rei e o fazia tão bem, que o pagamento aumentou e aconteceram coisas maravilhosas, ela aprendeu a expulsar a bruxa da má sorte e a trazer para perto de si, a sorte das pessoas felizardas. Então o rei a pediu em casamento; alguns parentes vieram com uma forte Armada e derrubaram os inimigos do rei seu pai, que voltou ao trono. E tudo acabou bem só que, a bruxa desventura veio dar com os costados no Brasil, trazendo ignorância, ivermectina e afins e como só usa sua vassoura, rogou praga no preço dos combustíveis! Tá osso aguentar tanta urucubaca que só vai acabar se aprendermos a votar! E nada mais digo, exceto que as dicas sobre Encantamento de Histórias vieram do livro “A Arte de Contar Histórias”, do professor Celso SIsto, publicado pela editora Aletria. 3ª edição, 2015. Tenham todos um bom dia. Au revoir.

* Advogada, escritora e Encantadora de Histórias

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Comentários

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Tião Aranha

30 de novembro, 2021 | 17:35

“Geralmente todo grande escritor é um excelente contador de histórias. Contar história faz esquecer os maus hábitos dos políticos, que nunca são esquecidos com nova reeleição. Deve ser por isso que temos os maus governadores. Esse povo não lê nada. Risos.”

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