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10 de fevereiro, de 2021 | 12:00

Beijinho, beijinho...

João Paulo Xavier *


“Beija eu! Beija eu! Beija eu, me beija... Deixa o que seja ser...” Composta por Arnaldo Antunes em parceria com Marisa Monte, cuja voz eternizou a poesia da letra dessa canção. “Eu vos declaro casados...”, diz a tradição dos casamentos, que sugere, em seguida, que os noivos se beijem. A palavra “beijo” vem do latim basium e representa o toque dos lábios em outra pessoa ou objeto. Beijos podem ser de todos os tipos: roubados, apaixonados, de despedida, respeitosos, selinhos ou seladores de união, como disse acima.

Você se lembra quando-com quem-onde você deu/recebeu o seu primeiro beijo? Eu me lembro, eu tinha, talvez, cinco anos, e minha amiga, que se chamava Juliene, me deu um beijo. Naquele dia, fui informado que, então, passava a ser o namorado dela. Perguntei minha mãe o que era namorado e lhe falei o que tinha acontecido. Ela riu e disse que eu não poderia namorar porque eu ainda não tinha decorado o alfabeto e, por isso, não sabia ler ou escrever o meu nome. Só podiam namorar pessoas que já soubessem ler, escrever e que não fizessem xixi na cama, sentenciou.

Lembro disso perfeitamente, mas a explicação, verdadeira para a minha pergunta eu não recebi, continuei sem saber o que era namorado. Aos beijos na bochecha, estava acostumado, pois sempre recebi e dei em minhas tias. Uma delas, Tia Teca, ainda na primeira infância, sempre me agarrava para me encher de beijos e mordidas na bochecha. A marquinha da Xuxa sempre me fazia colocar a bochecha na tv, quando criança. Com minha bisavó, Dindinha, sempre tive que, ao me aproximar, beijar a sua mão e pedir uma benção: “Benção, Dindinha.” Ao que ouviria em resposta: “Deus te abençoe e te dê boa sorte, meu filho.” Dindinha faleceu aos 109 anos.

No dia do velório, todos os clãs Xavier (filhos de Dindinha) estavam presentes com seus rebentos. Dez clãs no total, sendo o da minha avó o menor deles – composto por seis filhos, ou seja, meus tios, que estavam acompanhados de seus próprios filhos, isto é, eu e meus primos, que estávamos acompanhados por nossos próprios filhos, a maioria crianças e pré-adolescentes. Havia por volta de duzentas pessoas. Todos beijaram ali, as mãos de Dindinha pela última vez e deram adeus.

Acerca dos beijos roubados, eu não tenho muita experiência, apenas uma. A pessoa que me roubou um beijo está casada comigo há quatro anos. Há outros tipos de beijos; no Rio de Janeiro, por exemplo, as pessoas tendem a trocar três beijinhos que encostam bochecha com bochecha quando são apresentadas a alguém. Em São Paulo, esse hábito envolve apenas dois beijinhos. Em Belo Horizonte, pelo menos nos círculos que eu frequentava, damos um beijo e um abraço; pessoalmente, acho bem mais prático.

Há também beijos com nomes de nacionalidades. Conheço dois, muito bem, e vou citar um deles, o francês. Aqui no Brasil, nós chamamos de beijo de língua, French Kiss, em inglês, inclusive há um filme com este nome. Morei dois anos na Inglaterra e lá esse afeto não é demonstrado em público. Casais tendem a não se beijar, como fazemos aqui no Brasil. Então, não se admire se for dar um beijo no estilo carioca, paulista ou mineiro, por exemplo, ao ser apresentado a alguém, e essa pessoa se afastar de você. É normal, para a maioria dos britânicos, um aperto de mão, um acenar com a cabeça ou apenas um “How are you?”.

Aproveito para deixar uma dica, você não precisa responder à essa pergunta porque ela é meramente retórica. Há pessoas que consideram as lambidas de seus cachorrinhos, beijos.

Outros interpretam dessa mesma forma as mordiscadas dos gatos. Não há nada de errado nisso. Se o beijo pode indicar desde uma sinalização de afeição romântica ou atração sexual ao símbolo de respeito ou reverência por uma pessoa, penso que podemos vê-lo por vários ângulos. Alguns profissionais da saúde, pediatras, psicólogos e psicanalistas, por exemplo, advertem para que os pais não beijem seus filhos na boca porque, segundo eles, isso pode afetar o comportamento das crianças que começam a ter consciência de sua sexualidade entre 4 e 6 anos de idade e, portanto, seria aconselhável evitar gerar laços emocionais confusos. Nessa perspectiva, algumas outras formas de demonstrar carinho pelos filhos e filhas incluem: abraçá-los, dizer que os ama, escrever cartas e recadinhos carinhosos para eles, beijá-los na bochecha e na testa, brincar com eles, ler para eles e apoiá-los em suas dificuldades e decisões.

Particularmente, acho essas manifestações de carinho muito positivas e penso que podem construir a autoestima das crianças. Um beijo pode representar tudo isso ou pode ser também apenas um beijo. Um estudo feito pela Universidade de Amsterdam, na Holanda, diz que durante um beijo de dez segundos pode haver uma troca de até 80 milhões de bactérias que podem ajudar a melhorar o sistema imunológico; isso seria possível porque o organismo se arma para combater os seres "estranhos”, ficando mais forte.

No mesmo estudo, aprendemos que um beijo intenso demanda cerca de 12 calorias, mas que não é suficiente para reverter as consequências de uma vida sedentária, ou seja, você que é beijoqueiro/beijoqueira não cancele a matrícula na academia. Essa pesquisa é realmente interessante e vale a pena ser lida.

Não existe beijo gay ou beijo hétero. Beijo é beijo e só possui o valor que atribuímos a ele ou os significados que construímos para ele ou a partir dele. Assim, pode significar qualquer coisa, inclusive nada. Envie este artigo para um amigo ou uma amiga e mande um beijo para ele ou para ela.

*Doutor em Estudos Linguísticos – Pesquisador e Professor efetivo do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG) instagram: @nazareorientadora

Referências:
Shaping the oral microbiota through intimate kissing
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