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15 de janeiro, de 2021 | 14:11

Limites à liberdade de expressão representam

Rodrigo Dias Martins *

'Elevar ao patamar de absoluto o direito à liberdade de expressão, ao contrário do que dizem, não fortalece a democracia, a bem da verdade, tem se demonstrado prejudicial''Elevar ao patamar de absoluto o direito à liberdade de expressão, ao contrário do que dizem, não fortalece a democracia, a bem da verdade, tem se demonstrado prejudicial'

Curiosos casos sobre a proteção constitucional da liberdade de expressão nos Estados democráticos têm ascendido no Ocidente, novamente. O mais recente caso foi a publicação do presidente Donald Trump em sua conta na rede social Twitter. O site decidiu, por bem, banir a conta do Republicano, considerando o histórico de violações do Presidente aos termos de uso e sua última postagem, que teria incitado atos antidemocráticos no Congresso Americano.

Por outro lado, a pandemia da covid-19, tem evidenciado o negacionismo, que consiste na negação de algo que a própria ciência já atestou como fato. A exemplo, grupos anti-vacinas que utilizam de fundamentos folclóricos para negar a necessidade da imunização, questionar sua eficácia ou até mesmo sugerir efeitos colaterais de níveis draconianos.

Curioso que a vertente social que faz alarde sobre as punições do uso/abuso da liberdade de expressão, reclama de amparo do Estado para tal garantia ao passo que prefere a não intervenção estatal em matérias que não são convenientes.

As mídias sociais tomaram dimensões de informação imediata, sobre o cotidiano político e econômico de todo o mundo, é verdade, todavia, não se pode negar que, em suma, a relação entre o usuário e a rede é de um pacto estritamente privado.

A retórica é nefasta. Ora o usuário afirma que a rede social deve lhe proporcionar o espaço de fala (qualquer que seja o discurso) reclamando ao Estado, ora diz que o Estado não pode interferir na sua relação privada.

Como bom mineiro, aprendi no berço que “meu direito acaba onde começa o do outro”. É assim que, de certa maneira, ainda que estreita, a limitação da liberdade de expressão, no contexto social presente, representa verdadeiro marco civilizatório.

Imaginemos, pois, a total ausência de limites na liberdade de expressão. Não haveria, por exemplo, classificação etária na programação televisiva, podendo resultar em crianças com acesso à pornografia às 8h da manhã, ao arrepio daqueles que defendem ser absoluto o direito constitucional em voga.

Outra limitação é a forma de veiculação de propagandas comerciais de tabaco, bebidas alcóolicas, agrotóxicos e medicamentos, que devem sempre advertir o consumidor sobre os danos à saúde (lembremos que outrora a indústria do tabaco convenceu parcela da sociedade que fumar tabaco não causava câncer no pulmão).

O que muitos não percebem é que a liberdade de expressão e suas limitações abrangem questões além do “dizer o que penso”. Fato é que o exercício abusivo de determinadas liberdades não se coaduna com o Estado democrático.

É bem verdade que a democracia guarda estreita relação com a liberdade de expressão, mas também o faz com o direito à vida privada, com a dignidade, a integridade física e a vida.

Elevar ao patamar de absoluto o direito à liberdade de expressão, ao contrário do que dizem, não fortalece a democracia, a bem da verdade, tem se demonstrado prejudicial.

Os movimentos negacionistas, por exemplo, ao recusarem reconhecer como fato a ciência ou determinado momento histórico, afastam de seus entusiastas a própria realidade. Insurgem à civilidade.

No momento que o cidadão questiona a forma geométrica da Terra, inicia-se um processo anárquico, desordenado, que pode até ganhar uma roupagem filosófica, mas resulta na degradação da psiquê. Devemos, então, ter sabedoria para determinar o espaço de “nossas verdades”.

Podemos dizer que nossa cabeça dói, que o calor do Vale do Aço é menos suportável do que o de Guarapari, ou até que por questões biológicas enxergamos as cores de maneira diferente. Mas não cabe, no atual estágio da evolução humana, dizer que a Terra é plana, que a vacina fará surgir escamas em sua pele, ou que o vírus da covid-19 foi inventado pelos chineses como forma de dominação da raça humana, ou que tudo isso é invenção do comunismo (outra “ameaça” fantasma).

Não é porque acreditamos em determinada coisa que ela se torna real. Crer que podemos voar, não revoga a lei da gravidade. Negar que o cigarro causa câncer de pulmão, não lhe assegura saúde fumando cotidianamente. Dizer que o coronavírus é apenas uma gripe, não te torna suficientemente forte ao ponto de não precisar de um respirador ao contrair a doença, aliás, nas últimas semanas alguns negacionistas do vírus (ou de sua letalidade) vieram à óbito,
Stanley Gusman (apresentador do SBT), por exemplo.

Por outro lado, não é razoável que o Estado impossibilite o cidadão de manifestar sobre qualquer tema onde quer que ele tenha acesso, sob pena de censura. O termo “censura” diversas vezes é utilizado de maneira equivocada, como se qualquer forma de limitar o alcance de determinada fala/manifestação representasse censura.

A censura, a exemplo do que ocorreu no regime ditatorial no Brasil (outro fato histórico negado por alguns), consiste na ação estatal de caráter prévio e vinculante sobre o conteúdo de determinada mensagem, o que é vedado. A ninguém cabe decidir o que o interlocutor irá dizer sobre aquilo que pensa.

Todavia, como já dito, na medida em que a manifestação atentar contra outros direitos individuais de igual proteção constitucional, deve, o Estado, reprimir da maneira adequada, ou até mesmo a rede social, com quem temos vínculo privado, pode limitar nosso acesso, por violação aos termos de uso. É ensinar, de certa maneira, que aquilo que se está dizendo, é errado. É educar, como exige a vida em sociedade, o indivíduo à vida comum. É civiliza-lo.

* Advogado especialista em Direito Tributário, Sócio do Escritório Costa & Martins Advogados
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Comentários

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Bruna Costa

30 de janeiro, 2021 | 21:03

“Excelente explanação!”

Layla

15 de janeiro, 2021 | 14:57

“Perfeito!”

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