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29 de agosto, de 2020 | 09:00

O Caso Marielle E posição da Google

Jorge Ferreira S. Filho *

“Se a informação é poder na mão do Google também é na do Ministério Público”

Tal foi a semana. Os jornalistas provocando Bolsonaro para dizer sobre os depósitos feitos na conta da primeira dama. O povão interessado apenas em saber se a ajuda de R$600 continuará ou não. A Google brigando na Justiça contra a Polícia Civil e o Ministério Público, para não entregar informações sobre os usuários que fizeram consultas relacionadas com a vereadora Marielle Francisco, assassinada em março de 2018.

Dois suspeitos da execução do crime estão presos, mas não se identificou o mandante. Para complementar a investigação, o Ministério Público entende que é dever da Google fornecer a relação dos IPs e Device IDs de usuários que pesquisaram a respeito da vereadora e dos locais próximos à cena do crime, entre os dias 7 de 14 de março de 2018.

Os responsáveis pela investigação querem que a Google lhes diga quem buscou informações sobre a localização da vereadora nos dias próximos à data de seu assassinato.

No outro lado da queda de braço, aparentemente, estaria somente a Google, mas indubitavelmente há outras pessoas cujos interesses e direitos estão em oposição ao pretendido pelo Ministério Público. Se os dados forem liberados, provavelmente muitas tietes e muitos eleitores seguidores da então vereadora serão arrolados na investigação.

Antes de prosseguir, caro leitor, convém dizer um pouco sobre a Google. Sua sede, no Vale do Silício, considerada, na primeira década do Século XXI, como a “catedral da internet” é o lugar de uma convivência quase religiosa. Das palavras de seus executivos, dentre os quais Eric Schimidt, ex-CEO da Alphabet, holding controladora do Google, pode-se extrair que a empresa tem uma crença com forte tonalidade messiânica: Tornar-se o buscador com a perfeição de Deus. A empresa não esconde seus projetos, tais como o de digitalizar 100% dos livros impressos no mundo. O sonho é coletar tudo sobre todas as coisas e pessoas.

A técnica desenvolvida pela Google caracteriza-se por oferecer formas simplificadas para garimpar superficialmente informações relacionadas com alguém ou algo. A Google almeja o seu “clique”; nisso está o seu interesse econômico.

A resposta à pesquisa é rápida e a informação obtida é superficial. O conteúdo, intencionalmente pobre, provoca o desejo de mais um “clique”. Isso, porém, gera um contraponto: a atenção de quem pesquisa é desviada e nesse momento de descuido, aspectos da privacidade ou da intimidade do usuário estarão armazenadas. Vale lembrar que os pesquisadores da Google, Anne Aula e Kerry Rodden disseram em 2009 que a melhor forma de ler a mente do usuário é pelo estudo de “seus movimentos oculares”.

Sob meu ponto de vista, andou bem o ministro Sebastião Reis, único a votar a favor do Google. Ele assim ponderou: “Se a informação é poder na mão do Google também é na do Ministério Público”.

Os demais ministros parecem que justificam a decisão contra a Google, pela via do seguinte raciocínio: se as empresas utilizam dos dados coletados pela Google para chegar a um potencial cliente, o Ministério Público também tem este direito, mas para fins investigativos.

Se mantida a decisão do STJ, o usuário da Google correrá o risco de ver sua intimidade e privacidade serem acessadas pelo Ministério Público ou pela Polícia, jogando-a no meio de uma investigação policial, como suspeito.

Se alguém é fã de uma cantora, pesquisando todo dia a agenda da artista (onde esteve, onde está, aonde irá), e essa for vítima de um crime, tal admirador “estará lascado”. Se a pesquisa disser respeito a fertilizantes, o usuário poderá ser investigado como terrorista. Um “clique” sobre o nitrato de amônio e serás preventivamente preso. Data vênia, não posso concordar com o Ministério Público.

* Advogado - Articulista. Professor da Fadipa; E-mail [email protected]
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