27 de agosto, de 2020 | 14:45

Por que o Auxílio Emergencial não diminuiu a desigualdade?

William Passos *

“A diminuição da desigualdade mostrada pelos números não é a dos pobres em relação aos ricos, mas a dos pobres em relação à classe média”

Criado, no mês de março, por iniciativa do Congresso Nacional, por meio da Lei de nº 13.982/2020, o Auxílio Emergencial constitui uma política de transferência direta de renda em caráter de urgência para atenuar os efeitos da pandemia do novo coronavírus sobre a vida dos trabalhadores. Desenhado, inicialmente, para garantir o pagamento de três parcelas de R$ 600 para trabalhadores informais e desempregados, com o benefício chegando a R$ 1.200 para mães solteiras, o programa será estendido até o fim do ano como uma política de transição para a substituição do Bolsa Família pelo Renda Brasil. Quando concluir o pagamento da quinta parcela, em novembro, o Auxílio Emergencial terá injetado R$ 254,2 bilhões na economia brasileira.

Um importante estudo, bastante repercutido pela imprensa, que utilizou dados do Ministério da Economia e do Ipea e que foi assinado pelos pesquisadores Rogério Jerônimo Barbosa, da USP, e Ian Prates, do Cebrap, apontou que tanto a renda domiciliar per capita (renda total dividida pelo número de pessoas da família) quanto a desigualdade da renda no Brasil diminuíram com o pagamento do benefício. Enquanto em 2019 a renda domiciliar per capita foi de R$ 1.441, em 2020, com o Auxílio Emergencial, o rendimento das famílias chegou a R$ 1.191. Sem o benefício, segundo os pesquisadores, as famílias teriam uma renda média mensal de R$ 1.081.

Já o coeficiente de Gini, indicador que mede a desigualdade de renda (quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade), registrou 0,543 em 2019. Este ano, com o auxílio, baixou para 0,492. Se o Auxílio Emergencial não existisse, estaria em 0,569, de acordo com os pesquisadores.

É importante destacar que o Auxílio Emergencial também contemplou os beneficiários do Bolsa Família, promovendo uma elevação bastante significativa da renda daquelas pessoas. De acordo com a Secretaria Especial do Desenvolvimento Social do Ministério da Cidadania, o valor médio do Bolsa Família, por inscrito, é de R$ 180 (o valor de cada benefício é de R$ 41 e cada família pode acumular até 5 benefícios por mês, totalizando R$ 205).

Entretanto, apesar dos números, o Auxílio Emergencial, na verdade, não diminuiu a desigualdade. A melhoria da renda dos mais pobres, ao contrário do que os resultados fazem parecer, não se deu a partir da diminuição dos rendimentos dos mais ricos, mas do achatamento salarial dos trabalhadores com carteira assinada e dos servidores públicos. Na prática, a diminuição da desigualdade mostrada pelos números não é a dos pobres em relação aos ricos, mas a dos pobres em relação à classe média: ao mesmo tempo que a renda dos mais pobres subiu, a classe média empobreceu e ambos se aproximaram.

Neste movimento, de transferência de renda do meio da sociedade para baixo, ou da parte de baixo da sociedade para quem está mais abaixo ainda, o governo Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes tiveram papel fundamental: tanto o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm), que garantiu a redução salarial ou a suspensão do pagamento dos trabalhadores que formalizaram acordo com os seus patrões, durante o pior momento da pandemia, quanto a Lei Complementar nº 173/2020, que proibiu o reajuste salarial dos servidores públicos até o fim de 2021, retiraram direitos constitucionais que significaram piora do nível de vida das famílias num momento extremamente delicado. No ano que vem, a Carteira Verde e Amarela e a Reforma Tributária, se aprovadas, darão continuidade ao período de perda do valor dos salários e da necessidade de esticar o dinheiro até o fim do mês. Mas isso é assunto para a próxima coluna.

* Geógrafo, doutorando pelo IPPUR/UFRJ e colaborador do Jornal Diário do Aço. Email: [email protected]
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Winston Churchill

27 de agosto, 2020 | 19:29

“"A desvantagem do capitalismo é a desigual distribuição das riquezas; a vantagem do socialismo é a igual distribuição das misérias." Desigualdade social faz parte de qualquer sociedade. A única igualdade que há é a miséria.”

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