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10 de abril, de 2020 | 11:55

COLAPSO DA RAZÃO

Marli Gonçalves

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Marli GonçalvesMarli Gonçalves
Derrocada, desmoronamento, ruína, os melhores sentidos de colapso, a palavra que era ameaça, mas já chegou, se instalou e precisamos nos livrar dela. Assistimos à derrocada, desmoronamento, à verdadeira ruína da inteligência, do bom senso, da ética, em uma parte da população brasileira que apela para a ignorância por falta de argumentos, consciência, informações ou mesmo por má-fé, eis o colapso da razão.

Escrevo sob forte impacto e tristeza, de quem acabou de saber que perdeu um amigo, um grande jornalista, que foi sempre um exemplo de cidadão: Randáu Marques. Morreu do coração, o coração que em seu corpo só emitiu amor e carinho com seus colegas. Randáu, além de ter sido uma pessoa simplesmente maravilhosa, do bem, foi o precursor da luta pelo meio ambiente, um dos primeiros que nos informaram e fizeram entender a ecologia e sua intima ligação com a raça humana e sua sobrevivência.

Sabe Cubatão, que já foi o endereço da morte, com seus bebês nascendo sem cérebro? Sabe a Mata Atlântica? Muito antes de Partido Verde! Sabe tudo isso que ainda estamos ouvindo hoje da menina Greta? Pois é, Randáu nos alertava em pleno anos 1980 sobre o que poderia vir, o que viria, o que veio. Falava sobre a natureza como ninguém. Tive a honra de trabalhar com ele no Jornal da Tarde.

Escrevo também sob forte impacto dos números que todos os dias atravessam o limite da vida, dos mortos por um vírus muito real, visível, devastador, mas que ainda tem quem não acredite nele, não leve a sério a única forma - difícil, sim, mas única - que temos de desacelerar seu caminho de destruição e morte, o isolamento social, a quarentena.

E eu não quero ver, nem saber de mais pessoas tão importantes nesse mundo sendo levados por ele na sua barca maldita, que agora tem navegado lotada, e em todo o mundo. São perdas, todas, inestimáveis, e com elas, principalmente os idosos, se enterra conhecimento, vivência, lutas vencidas, histórias que mal tivemos tempo de honrar, em todos os campos do conhecimento.

Escrevo me sentindo muito revoltada e perplexa com o governante que mais uma vez começou e terminou a semana nos ameaçando com suas grotescas palavras, atos, declarações e chamadas incessantes da população para a fila da morte, lá onde não há um metro de distância uns dos outros nas covas que se abrem continuamente, guardando os corpos de pessoas de todas as classes sociais, e que não pararão de chegar nelas se não houver um basta enquanto for tempo.

Ao ver o número de pessoas em São Paulo, o epicentro nacional, saltitantes pelas ruas, lotando-as coladinhos uns aos outros, respirando, espirrando, tossindo, cuspindo; abrindo clandestinamente seus comércios, largando os cuidados básicos para evitar a disseminação descontrolada do vírus, e sem precisão, sem serem obrigadas já que não trabalham em serviços essenciais, tristeza e medo se misturam. Estarão eles se achando deuses, eleitos como imortais, fortes e viris, ignorando o perigo e seguindo o irresponsável Messias e seus asseclas? Acreditam que assim a economia – como se vidas pudessem ser descartadas - não será afetada?

Acreditarão eles que o remédio propagandeado sabe-se lá por qual interesse, dia e noite por um ignorante, um mau militar, mau líder, péssimo político, funcione mesmo? E que gotas dele pingarão do céu sobre suas cabeças coroadas isentando-os de serem infectados e que, se o forem, bastarão pílulas mágicas?

No mundo, inclusive em lugares desenvolvidos, mais de um milhão de infectados, a morte de muitos milhares diariamente já não teria sido evitada se o remédio fosse tão mágico? Médicos e cientistas perdem o tempo precioso que poderiam estar dedicando às suas pesquisas para vir a público desmentir essa eficácia, alertar para os grandes riscos colaterais que produz.

Estarão todos surdos? Serão incapazes de ver a progressão aqui em nosso solo? Acham talvez que os hospitais de campanha improvisados que estão sendo construídos a toque de caixa são para enfeitar as cidades?

Os especialistas temem o colapso do Sistema de Saúde, e que virá, caso um grande número de pessoas sejam infectadas ao mesmo tempo e necessitem de internação, respiradores, atenção médica, isso além de tudo aquilo que diariamente leva pessoas aos hospitais, já tão deficitários muito antes disso tudo.

Outro grupo que busca se contrapor teme o colapso da Dona Economia, como se essa antes já não estivesse tão cambaleante e sem ações e respostas positivas, e que agora querem usar para justificar um governo até aqui de fracassos, escândalos, gafes, com poucos ministros bons entre um grupo que parece ter se evadido da escola ainda no jardim de infância. Irresponsáveis, serão julgados pela História.

Pois nós, eu e uma grande parcela da população, temos uma informação: já há um grande colapso: o da razão. E todos nós seremos vítimas disso, de uma forma ou outra, hoje ou no amanhã que há de chegar, mesmo que com seus passos duros, caminhando e aprofundando ainda mais as disparidades sociais desse país.

* Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano - Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto, à venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon. [email protected] / [email protected].
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Comentários

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Tião Aranha

10 de abril, 2020 | 14:09

“Parabéns pela homenagem ao Randáu-, o conheci pelos seus belos textos publicados na imprensa nacional. Mas a poluição aqui do ar do Vale do Aço é a mesma de Cubatão de tempos atrás. Está cada vez mais difícil aqui respirar, sem nos afastarmos dos problemas da saúde originados da poluição ambiental. (No geral, o nó da questão está na aplicação das leis). Dependemos das grandes empresas pra sobrevivermos. Antigamente nesses solos plantavam-se feijão, mandioca, arroz, banana e a vida era bem melhor. Hoje só se fala do calangovírus e os problemas continuam. Parece que o que está faltando mesmo é a vontade política; isto é, maior responsabilidade com a coisa pública daqueles que detêm o poder administrativo. Pois se existisse um parlamento livre, a vida do cidadão teria realmente menos percalços. Sem omissão, a missão do Parlamento deveria ser só fiscalizar - para que não houvesse tanta zombaria com a vontade popular. (Indiferente de ser um capitão ou qualquer outro cidadão que estivesse ocupando o Poder). Basta só analisar recentes atritos com a China, de fala de pessoas diretamente ligadas á pessoa do presidente da República. Realmente, pior do que atitudes de iniquidades é a zombaria, transbordada pela usurpação do poder em detrimento dos menos favorecidos . É importante que todos saiam vivos. Isolamento total ou parcial. Não sei. Os trabalhadores geram a riqueza da nação, mas dependem diretamente de políticos e empresários para a geração de empregos precisando trabalhar. No caos, o Estado precisa abrir mão e entrar com as suas reservas cambiais realizada ao longo do tempo para evitar acúmulo de cadáveres. Infelizmente, infringem leis para presidir as mais nobres casas do povo; mas o momento é de União. É preciso fiscalizar mais. Todos juntos: povo e autoridades. Não fique remoendo as coisas do passado. Ficar preso ao passado não dá futuro.”

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