20 de março, de 2020 | 15:30

Governança é fundamental em tempos de coronavírus

Thomas Lanz *

Ainda está na lembrança de muitos empresários e executivos, as tantas crises que o país atravessou há algumas décadas em um cenário de constante inflação elevada. Enfrentamos diversos planos e medidas governamentais que, em geral, pegavam todos de surpresa. Os ex-ministros Delfim Netto, Bresser Pereira e Mário Henrique Simonsen, na tentativa de debelar a espiral inflacionária, propuseram e implantaram seus planos de ajuste. Os presidentes Sarney e Collor também e, finalmente, o plano Real, pilotado por Fernando Henrique Cardoso, possibilitou colocar a economia brasileira numa rota de maior estabilidade. Naqueles tempos, empresários e executivos começavam seu dia de trabalho sem saber o que esperar. 

A instabilidade e incerteza faziam parte do mundo dos negócios. Muitos ganhavam mais com a inflação do que com o resultado operacional de seus negócios. Como uma corrente sem fio, as medidas tomadas pelos executivos na eclosão das crises se espalhavam rapidamente pelo mercado e eram adotadas. Após alguns dias, tudo se acomodava de uma ou outra forma, e a vida continuava.

Até o fim do século passado, a governança ainda estava engatinhando no país. Empresas de pequeno a médio porte e, principalmente, as empresas familiares, não tinham conselhos formados, enquanto as grandes empresas de capital aberto já tinham Conselhos de Administração. Corria à língua solta que os conselheiros iam às reuniões só para buscar o “jeton”. 

De lá para cá, a governança amadureceu e progrediu. A cada dia, mais e mais empresas de todos os portes e categorias vêm introduzindo as boas práticas de governança, tendo os conselhos como pivô central. Até pouco tempo atrás, os conselhos se reuniam para discutir e deliberar sobre todo tipo de assunto. As pautas iam do acompanhamento do desempenho das empresas, discussões sobre estratégias empresariais, questões de gestão, câmbio, auditoria, compliance e, eventualmente, dificuldades pontuais ou potenciais ameaças. A gestão de riscos, com raras exceções, não fazia da pauta das reuniões de conselho.

Esta é, talvez, a primeira vez que os conselhos são chamados a discutir os rumos de suas empresas em face de uma crise inusitada e de proporções nunca antes vivenciada no Brasil. Variáveis da saúde pública, suprimentos, paralisação dos mercados e produção, queda das bolsas de valores, mobilidade urbana, transporte e outros irão interferir simultaneamente no andamento dos negócios. No atual cenário não se sabe para onde os ventos irão soprar e que tempestades poderão ainda assolar os mercados. 

Àqueles que ainda não têm conselhos deveriam formar comitês de crise, convidando pessoas de sua confiança para ajudar  na discussão e tomada de decisões frente à crise que começa a abalar os mercados e que certamente se agravará nas próximas semanas.

Para empresas que já tem os seus conselhos constituídos, estes deveriam ser transformados em conselhos de crise, ou comitês de crise. Certamente alguns membros destes  conselhos tiveram experiência em épocas passadas sobre gestão de crises. Parte dos atuais gestores só ouviu falar das crises anteriores. O conselho deverá acompanhar muito de perto as medidas operacionais que suas empresas estão tomando, seja em relação à redução de custos, administração do caixa, corte ou postergação de investimentos. E deverá saber dosar quanto frear e quanto acelerar e a partir de quando. 

Além da responsabilidade em relação à sobrevivência econômica financeira dos negócios, os conselhos e seus conselheiros precisarão estar atentos aos aspectos sociais. O capital humano que tanto contribui para o desenvolvimento dos negócios deverá ser preservado ao máximo. A comunicação com os diversos ‘stakeholders’ deverá ser feita com o máximo cuidado e civilidade. Será necessário aos  conselhos pensar e fazer pesar a responsabilidade social das suas organizações. Os pilares da boa governança corporativa, ou seja, a prestação de contas, transparência, equidade e responsabilidade social deverão guiar e sustentar mais do que nunca as decisões e orientações dos conselhos em tempos de coronavírus. 
 
* Formado pela PUC-SP e Mestre em Administração de Empresas, presidiu a Carbex Indústrias Reunidas e a Giroflex, trabalhou na Mangels Industrial e Lafer Indústria e Comércio.
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