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04 de março, de 2020 | 14:30

Na educação brasileira, avaliar é preciso, lamentar não

Jeanfrank Sartori *

Em dezembro último, assistimos ao ritual previsível e triste que ocorre a cada três anos: a divulgação dos resultados do Brasil no exame do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Programme for International Student Assessment - PISA). Promovido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Pisa avalia o aprendizado dos jovens dos países participantes, nas áreas de leitura, matemática e ciências.

Conforme amplamente divulgado, nosso desempenho mais uma vez foi pífio e aquém não apenas das nações ricas, mas também de inúmeros países em desenvolvimento, como o nosso. E deste modo tem sido desde a primeira edição, em 2000, quando o então presidente da República não poderia ter feito pergunta mais pertinente ao Ministro da Educação, quando este propôs a participação do Brasil: “E se ficarmos em último?” Afinal, foi o que de fato, mais tarde, aconteceu.

E tão previsível quanto o nosso mau-desempenho a cada aplicação da avaliação é a enxurrada de lamentos, de críticas e soluções propostas, que se apresentam nos dias que sucedem à divulgação dos resultados. Mas independentemente das opiniões, dos governos e dos contextos econômicos, muito provavelmente nada será muito diferente na prova a ser aplicada já em 2021, cujo resultado estará disponível em 2022.

Nesse recorrente dilúvio pré-agendado, um tema costuma receber pouca atenção, não condizente com sua importância e potencial de contribuição para o aprimoramento da formação de nossas crianças e jovens: os processos nacionais de avaliação da educação básica. É de suma importância termos indicadores sistematizados, contínuos, abrangentes, comparáveis e multifacetados, que nos permitam adequadamente identificar os resultados positivos, cujas boas práticas que os produziram devem ser, sempre que possível, estudadas, compartilhadas e generalizadas. E também detectar o mau desempenho, cujas causas sejam identificadas e sanadas, bem como as lições aprendidas e divulgadas.

Só de posse de dados completos e fidedignos, as necessárias decisões podem ser tomadas e as soluções realistas, factíveis e duradouras implementadas, e não aventuras, imediatismos ou receitas sabidamente fadadas ao fracasso. Cabe aqui o patriótico dever de, indiferentemente de convicções, partidos e aspirações, somarem-se os esforços municipais, estaduais, federais e privados, pelo bem de todos.

Já temos boas iniciativas nesse sentido, como a Prova Brasil, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e, de certo modo, o próprio Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), porém, um problema sempre esteve presente: a grande variação entre os conteúdos ministrados nas milhares de instituições de ensino desta nação de dimensões continentais.

Uma boa notícia é que finalmente estamos vivenciando a implementação da Base Nacional Curricular Comum (BNCC), que, apesar de não ser imune a críticas, veio trazer uma expressiva melhoria justamente na padronização nacional dos currículos escolares. Abre-se, assim, a oportunidade de tornarmos as avaliações mais completas, abrangentes e comparáveis, também incorporando integralmente a rede privada de ensino – muitas vezes deixada em segundo plano – e permitindo discriminar ainda mais os efeitos de diversos fatores envolvidos, desde o governante ao professor em sala de aula, passando pela gestão escolar, a infraestrutura e o próprio aluno.

Mais recentemente, o Governo Federal tem estudado alterações no Saeb, que passaria a incluir mais séries e áreas do conhecimento, bem como criar a Avaliação Nacional de Fluência (nome ainda provisório) para mensurar o nível de leitura no 2º ano do ensino fundamental. Apesar de merecerem debates e aprimoramentos, são mudanças que propõem avanços importantes que podem efetivamente contribuir para a qualidade e a riqueza dos dados disponíveis para a administração das políticas educacionais brasileiras.

Ainda mais benéfico e desejável é que os resultados dessas avaliações sejam atrelados, de forma justa, razoável e adequada, à remuneração de gestores e à carreira docente nas redes públicas, bem como aos processos regulatórios na rede privada. Afinal, de nada adianta a informação se ela não se traduzir em efeitos concretos.

Assim, parafraseando o general romano Pompeu, em expressão eternizada pelo escritor português Fernando Pessoa, avaliar é preciso, lamentar não é preciso. Se naquele tempo navegar significou salvar a população de Roma da fome, aprimorar a avaliação da educação básica no contexto brasileiro é um primeiro e importante passo para saciarmos nossa carência por ensino de qualidade, desenvolvimento nacional e justiça social.
 
* Mestre em Gestão da Informação e especialista em Inteligência de Negócios. É pesquisador nas áreas de avaliação educacional e gestão do conhecimento, atuando na avaliação institucional do Grupo Positivo em Curitiba.
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Comentários

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Tião Aranha

06 de março, 2020 | 19:24

“Qualquer mudança na Educação tem que passar primeiro pela valorização do professor. Parece que o gargalo maior está mesmo é na padronização nacional dos currículos escolares; isto é, o aluno só deve aprender aquilo que ele precisa aprender. Então existe duas escolas. A que prepara o aluno pro ensino acadêmico (pro vestibular) e a outra que prepara o aluno para a vida. O certo seria se a sociedade escolhesse o tipo de Educação que quer. O ministro citado é professor, mas tb é economista. Sem querer comparar, mas, enquanto na Coreia do Sul, 89% dos estudantes universitários optam em ser professores, aqui, nem chega aos 0,5%. Em matéria de qualidade educacional, perdemos pra vários países do continente africano. Deixo a seguinte pergunta no ar, pra quem quiser,e que tiver a competência pra responder: - qual é a diferença que existe da escola pública brasileira de 50 anos atrás com a de hoje, isto é, houve alguma mudança ou continua a mesma?”

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