25 de junho, de 2019 | 08:01

Depoimentos divergem sobre detonação no Córrego do Feijão

Testemunhas ouvidas discordam sobre horário e distância de explosão em mina onde ocorreu rompimento de barragem

Depoimentos desta segunda trataram de explosões ocorridas em áreas próximas à barragem rompida - Foto: Daniel ProtznerDepoimentos desta segunda trataram de explosões ocorridas em áreas próximas à barragem rompida - Foto: Daniel Protzner

Duas testemunhas ouvidas nesta segunda-feira (24) pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho relataram horários divergentes para uma detonação que ocorreu na Mina Córrego do Feijão, no mesmo dia do rompimento da barragem B1, que resultou na morte de mais de 240 pessoas, no município de Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte).

Criada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para investigar as responsabilidades sobre a tragédia, a CPI ouviu, nesta segunda, duas testemunhas: o mecânico de mineração da empresa Sotreq, Eiichi Pampulini Osawa, e o “blaster” (aplicador de explosivos) da Vale, Edmar de Rezende.

Um terceiro convocado para depoimento nesta segunda era Denis Valentim, funcionário da empresa Tüv Süd, contratada pela Vale para avaliar e atestar a estabilidade de barragens. Valentim seria ouvido pela CPI como investigado, mas não compareceu com base em uma decisão liminar do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que lhe concedeu um habeas corpus.

Os outros dois depoimentos discorreram sobre as detonações que vinham acontecendo com frequência na Mina Córrego do Feijão e na Mina de Jangada, no mesmo complexo minerário. A principal polêmica foi com relação ao horário de uma explosão provocada no dia 25 de janeiro de 2019, próximo ao horário do rompimento da barragem, que ocorreu às 12h28.

Segundo Eiichi Osawa, a detonação teria ocorrido aproximadamente a um quilômetro da barragem B1, no horário entre 12h20 e 12h40. Ele não soube precisar se a explosão ocorreu antes, simultaneamente ou depois do rompimento, mas disse que estava de frente para o local da detonação e a viu pessoalmente.
O mecânico de mineração Eiichi Osawa relatou que seu cunhado continua desaparecido O mecânico de mineração Eiichi Osawa relatou que seu cunhado continua desaparecido - Foto: Daniel ProtznerO mecânico de mineração Eiichi Osawa relatou que seu cunhado continua desaparecido O mecânico de mineração Eiichi Osawa relatou que seu cunhado continua desaparecido - Foto: Daniel Protzner

Já de acordo com Edmar de Rezende, a detonação só ocorreu exatamente às 13h33, uma hora após o rompimento. Como funcionário responsável pela aplicação dos explosivos, Rezende disse ter ele próprio decidido executar a detonação, uma vez que não era mais viável retirar os explosivos instalados e seria perigoso deixá-los lá. Além disso, seu chefe imediato havia morrido durante o rompimento da barragem.

Edmar de Rezende afirmou ainda que o horário da detonação está registrado em um vídeo de seu celular (que foi exibido durante a reunião) e também em um relatório de campo que ele produziu no mesmo dia. O depoente também disse estimar em quatro quilômetros a distância entre o local da explosão e a barragem B1, que se rompeu. Verificação feita posteriormente pela assessoria da CPI indicou uma distância de 1,4 quilômetro, em linha reta.

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Trabalhadores não foram informados sobre recomendação contra detonações

Apesar das divergências em seus depoimentos, as duas testemunhas concordaram em um ponto: nenhum deles soube de qualquer recomendação ou advertência de relatório da empresa Tüv Süd de que não deveria ocorrer detonação ou movimentação de máquinas pesadas na área próxima à barragem B1, que se rompeu. “Só ouvi isso depois, no jornal”, afirmou Eiichi Osawa. Ambos também relataram que as detonações na Mina de Jangada eram "quase diárias", enquanto que em Córrego do Feijão ocorriam uma vez por semana, aproximadamente.

Outro ponto em comum entre as testemunhas ouvidas nesta segunda é que ambos sofreram perdas de pessoas próximas, que faleceram na tragédia. Eiichi Osawa afirmou que seu cunhado, um funcionário da Vale, continua desaparecido. “Estou sob tratamento psicológico e psiquiátrico no SUS de Brumadinho”, afirmou. Já Edmar de Rezende disse ter perdido três primos no rompimento da barragem, sem falar em muitos amigos. “Eu mesmo poderia estar no restaurante (que foi destruído pela onda de rejeitos), por poucos minutos”, relatou.

Após os depoimentos, os integrantes da CPI elaboraram requerimento para que seja enviado ofício à Vale solicitando a lista de detonações realizadas nas Minas Córrego do Feijão e Jangada, nos meses de dezembro de 2018 e janeiro de 2019, com o registro das cargas explosivas utilizadas. Outro requerimento é relativo ao fornecimento de vídeos de detonações ocorridas em 25 de janeiro.

Sofrimento – Ao final da reunião, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) leu trechos de notificação extrajudicial encaminhada à Vale pelo Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Extração de Ferro e Metais Básicos de Brumadinho e Região (Metabase). No documento, o sindicato protesta contra determinação da empresa, datada de 13 de junho, de que seus funcionários atuem em apoio à busca de corpos na área inundada pela lama de rejeitos.

Para a deputada, essa determinação da Vale incorre em desvio de funções e agrava o sofrimento psíquico dos trabalhadores da empresa, que podem participar do resgate de partes dos corpos de seus colegas falecidos. Já o deputado Sargento Rodrigues (PTB) afirmou que a Vale, com essa decisão, pode estar usurpando função pública, algo que deve ser verificado.
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