10 de junho, de 2019 | 08:33

Vazamento de mensagens mostra conversa de Moro e Dallagnol

A atuação coordenada entre juiz e procurador por fora das audiências fere o princípio de imparcialidade da Constituição e o Código de Ética da Magistratura

Divulgação
O promotor do MPF,  Deltan Dallagnol, e o atual Ministro da Justiça, Sergio MoroO promotor do MPF, Deltan Dallagnol, e o atual Ministro da Justiça, Sergio Moro

A força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal do Paraná (MPF-PR) afirmou neste domingo que "seus membros foram vítimas de ação criminosa de um hacker que praticou os mais graves ataques à atividade do Ministério Público, à vida privada e à segurança de seus integrantes".

Os procuradores reagem às reportagens do site The Intercept, que revelou mensagens de texto de membros da Lava Jato, entre eles o atual Ministro da Justiça Sergio Moro e Deltan Dallagnol. As reportagens mostram que o coordenador da força-tarefa da Lava Jato tinha dúvidas pessoais quanto ao conteúdo da denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso tríplex. Também acusam uma suposta atuação irregular entre Moro e Deltan.

Para criminalistas que avaliaram as mensagens, "Moro sugeriu trocar a ordem de fases da Lava Jato, cobrou novas operações, deu conselhos e pistas e antecipou ao menos uma decisão, conforme mostram conversas privadas ao longo de dois anos".

A explicação dos especialistas é que a Constituição brasileira estabeleceu o sistema acusatório no processo penal, no qual as figuras do acusador e do julgador não podem se misturar. Nesse modelo, cabe ao juiz analisar de maneira imparcial as alegações de acusação e defesa, sem interesse em qual será o resultado do processo. Mas as conversas entre Moro e Dallagnol demonstram que o atual ministro se intrometeu no trabalho do Ministério Público – o que é proibido – e foi bem recebido, atuando informalmente como um auxiliar da acusação.

Os integrantes do MPF reagem: "A ação vil do hacker invadiu telefones e aplicativos de procuradores da Lava Jato usados para comunicação privada e no interesse do trabalho, tendo havido ainda a subtração de identidade de alguns de seus integrantes. Não se sabe exatamente ainda a extensão da invasão, mas se sabe que foram obtidas cópias de mensagens e arquivos trocados em relações privadas e de trabalho", dizem os procuradores.

"Dentre as informações ilegalmente copiadas, possivelmente estão documentos e dados sobre estratégias e investigações em andamento e sobre rotinas pessoais e de segurança dos integrantes da força-tarefa e de suas famílias. Há a tranquilidade de que os dados eventualmente obtidos refletem uma atividade desenvolvida com pleno respeito à legalidade e de forma técnica e imparcial, em mais de cinco anos de Operação", afirmam.

Os procuradores afirmam ter "três preocupações": "Primeiro, os avanços contra a corrupção promovidos pela Lava Jato foram seguidos, em diversas oportunidades, por fortes reações de pessoas que defendiam os interesses de corruptos, não raro de modo oculto e dissimulado".

"A violação criminosa das comunicações de autoridades constituídas é uma grave e ilícita afronta ao Estado e se coaduna com o objetivo de obstar a continuidade da Operação, expondo a vida dos seus membros e famílias a riscos pessoais. Ninguém deve ter sua intimidade – seja física, seja moral – devassada ou divulgada contra a sua vontade. Além disso, na medida em que expõe rotinas e detalhes da vida pessoal, a ação ilegal cria enormes riscos à intimidade e à segurança dos integrantes da força-tarefa, de seus familiares e amigos", afirmam.

Os procuradores afirmam que "é importante dar continuidade ao trabalho". "Apenas neste ano, dezenas de pessoas foram acusadas por corrupção e mais de 750 milhões de reais foram recuperados para os cofres públicos. Apenas dois dos acordos em negociação poderão resultar para a sociedade brasileira na recuperação de mais de R$ 1 bilhão em meados deste ano. No total, em Curitiba, mais de 400 pessoas já foram acusadas e 13 bilhões de reais vêm sendo recuperados, representando um avanço contra a criminalidade sem precedentes. Além disso, a força-tarefa garantiu que ficassem no Brasil cerca de 2,5 bilhões de reais que seriam destinados aos Estados Unidos."

"Em face da agressão cibernética, foram adotadas medidas para aprimorar a segurança das comunicações dos integrantes do Ministério Público Federal, assim como para responsabilizar os envolvidos no ataque hacker, que não se confunde com a atuação da imprensa. Desde o primeiro momento em que percebidas as tentativas de ataques, a força-tarefa comunicou a Procuradoria-Geral da República para que medidas de segurança pudessem ser adotadas em relação a todos os membros do MPF. Na mesma direção, um grupo de trabalho envolvendo diversos procuradores da República foi constituído para, em auxílio à Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação da PGR, aprofundar as investigações e buscar as melhores medidas de prevenção a novas investidas criminosas", dizem.

"Em conclusão, os membros do Ministério Público Federal que integram a força-tarefa da operação Lava Jato renovam publicamente o compromisso de avançar o trabalho técnico, imparcial e apartidário e informam que estão sendo adotadas medidas para esclarecer a sociedade sobre eventuais dúvidas sobre as mensagens trocadas, para a apuração rigorosa dos crimes sob o necessário sigilo e para minorar os riscos à segurança dos procuradores atacados e de suas famílias", concluem.

Diretor do The Intercept Brasil diz que divulgação de conversas de Moro está apenas no começo

O diretor do site The Intercept afirmou em entrevista à Rede Itatiaia de Rádio que que a divulgação de mensagens privadas de grupos da força tarefa da Lava Jato no aplicativo Telegram está apenas no começo. Nos diálogos, o então juiz federal e atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, orienta o procurador do Ministério Público Federal (MPF), Deltan Dallagnol, como prosseguir com a investigações da Lava Jato, criticando e sugerindo recursos do MPF. Moro negou em diversas oportunidades que trabalhava em parceria com o MPF. A relação do magistrado responsável pelo processo, com os investigadores, coloca em julgamento a legalidade dos atos e lança dúvidas acerca da isenção do magistrado ao julgar os processos.

“O arquivo é absolutamente gigantesco, de proporções que a gente ainda está tentando calcular, mas a gente sabe que tem muita coisa por vir. Muita coisa de interesse público. Então, nossa primeira preocupação é separar o que é de interesse público do que é, obviamente, da vida privada das pessoas envolvidas, porque isso, sem dúvida, o Intercept não vai divulgar”, disse Leandro Demori, diretor-executivo do site.

Conforme a reportagem publicada nesse domingo (9), a atuação coordenada entre juiz e procurador por fora das audiências fere o princípio de imparcialidade da Constituição e o Código de Ética da Magistratura. “Se depois de ler essa reportagem ele (Moro) não ver anormalidade eu realmente me preocupo com a visão de justiça que o ministro da Justiça tem”, disse Leandro.

Em nota, o ministro Sérgio Moro disse não ver qualquer anormalidade ou direcionamento da atuação enquanto juiz e lamentou que a reportagem não indicasse a fonte das informações e o fato de não ter sido ouvido.

Já a força tarefa da Lava Jato declarou que os integrantes foram vítimas de ação criminosa de um hacker e se colocou à disposição para prestar esclarecimentos sobre os fatos.
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