28 de março, de 2019 | 21:30
Oligarquia na Câmara
Vinícius Siman*
"Que nossa Câmara seja um espaço de cidadania e representatividade, não um projeto de poder hereditário"Como informado neste Diário, na última segunda-feira (25), a Câmara de Vereadores de Ipatinga aprovou em primeiro turno, com unanimidade, o Projeto de Emenda que reduz o número de vereadores de 19 para 15. Isso causou uma extrema satisfação na sociedade, porém, como há muito já me é atribuído o dom da constante inconveniência, lamento informar que isso não é nenhuma boa ação de nossos nobres vereadores, conhecidos por sua preocupação em cortar gastos. Não. Essa Emenda não passa de um lenitivo para o povo enfurecido com sua Casa Legislativa e de um golpe baixo (planejando as eleições de 2021).
A primeira intenção é baixar a poeira e acalmar os ânimos da população ensandecida, tentar retomar a credibilidade da Casa depois da Operação Dolos. Claro, todos pensam que se gasta muito com nossos Poderes, mas poucos sabem que a prefeitura deverá continuar repassando 4,5% dos tributos arrecadados para a Câmara. O mesmo valor injetado, seja com 15 ou 21 vereadores.
O presidente Jadson Heleno afirmou que a diminuição dos cargos representaria uma economia de R$ 2 milhões por ano aos cofres públicos. Mesmo se representasse, de fato, 2 milhões, para uma cidade com o PIB de R$ 8,5 bilhões, não provoca nem cócegas na receita. A melhor forma, pois, de cortar gastos, e também a mais moral, é diminuir os salários dos legisladores, não as cabeças. É bom lembrar que o orçamento anual da Câmara de Ipatinga é de R$ 29.845.000,00 (previsão do repasse em 2019) e que esse valor é maior do que o orçamento da maioria dos municípios no Colar Metropolitano do Vale do Aço.
A outra intenção de nossos nobilíssimos vereadores pode ser, e de fato é, um projeto de poder para 2021. Com menos cadeiras, a disputa será entre os gigantes, os populistas, os que movem as massas com a força do dinheiro. Se já é difícil a renovação na Câmara com 19 vagas, imagine quão seleto grupo conseguirá galgar o cargo. Para além de um projeto de poder isso é um projeto de oligarquia.
Os vereadores que lá estão temem a insatisfação provocada pelos escândalos recentes. Temem sair das cadeiras a que já se afeiçoaram e habituaram. Não temem o que vem, em si, porém que o que venha tire-os do lugar que acham que os pertence. Há medo. E sempre o medo é uma isca suculenta para a tirania. Não é bom para a saúde da nossa democracia municipal, não é bom para o Legislativo com que todo cidadão sonha, não é bom para ninguém, a não ser para os oligarcas, que querem a retenção do poder para continuarem defendendo seus tão íntimos interesses.
Portanto, como toda medida populista, essa Emenda aprovada em primeiro turno visa distrair a população a curto prazo e, a longo prazo, trazer benefícios aos interessados. É de pequenos gestos, de pequenas interferências supostamente bem-intencionadas, que vai se moldando uma oligarquia. É da oligarquia que a tirania encontra pernas para caminhar a passos velozes. A História nos mostra bem os caminhos que não devemos percorrer jamais. Que nossa Câmara seja um espaço de cidadania e representatividade, não um projeto de poder hereditário.
* Escritor e crítico literário ipatinguense. Tem dez livros publicados. E-mail: [email protected]
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Fátima Batista
30 de março, 2019 | 18:35Parabéns pela brilhante análise Exatamente o que pensei quando vi o populista projeto sendo votado e aceito por todas e todos vereadores. Ninguém fez um simples questionamento se essa medida extrema não seria uma afronta a nossa combalida Democracia.Todos agiram como vacas de presépio balançando a cabeça e dizendo sim senhor.E outra coisa que me incomoda é um poder, Legislativo, ser subjugado por outro, MP( instituição do Estado) e obedecer prontamente como se esse fosse um simples departamento daquele.”
Daniel Cristiano Souza
29 de março, 2019 | 13:04Concordo com sua analise... A atual câmara municipal de Ipatinga pretende "diminuir para AUMENTAR"!!!”
Gildázio Garcia Vitor
29 de março, 2019 | 09:13Excelentes análise e argumentação. Tinha até pensado na hipótese da redução de cadeiras como medida populista, mas a sua ideia é muito mais abrangente, pois leva em consideração as futuras eleições e as dificuldades para conquistar os eleitores. Meus sinceros parabéns e muito obrigado por esta nova lição.”