23 de março, de 2019 | 10:30

Alzheimer: conflitos na família e no direito

Jorge Ferreira S. Filho *


Nos idos de 1995, Eric Kandel, ganhador do prêmio Nobel de Medicina no ano 2000, ficara entusiasmado com os resultados de uma pesquisa empreendida com ratos em laboratório. Experimentos com essas cobaias sugeriram a possibilidade de reversão da perda da memória verificada em ratos velhos. Surgia uma esperança para os humanos, eis que, segundo o pesquisador, com o avançar da idade, uma branda perda da memória, também denominada benigna amnésia (benign senescent forgetfullness), é observada em quase 60% da população humana.
Kandel dedicou sua vida à pesquisa do funcionamento da memória e, particularmente, acalentava a esperança de que suas descobertas científicas lançassem também uma luz sobre a doença de ALZHEIMER, cujo devastador efeito é a severa perda da memória.

O cientista explicou que essa enfermidade provoca uma progressiva degeneração do cérebro. Tal consequência tem relação com o acúmulo anormal, no espaço entre os neurônios, do material denominado Beta-amyloid, matando tecidos nervosos e devastando as conexões sinápticas.

Para Kandel, o ser humano é o que é porque ele tem o conhecimento e a memória. Conceitos, valores e crenças do ser humano têm moradia na memória. Perdendo-se a memória, perder-se-ia o “Eu”. Defendia ainda que os problemas com a integridade da memória contribuíam para a desordem psiquiátrica, assim como a esquizofrenia, a depressão e a ansiedade.

Para os familiares da pessoa com Alzheimer, o quadro é também difícil; na verdade um drama em desenvolvimento. No plano jurídico, uma decisão tormentosa; uma luta interior. Interditar ou não interditar a pessoa com Alzheimer. O debate sobre essas questões levantadas reacendeu-se a partir de 2016. Isso foi provocado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência que, em harmonia com as proposições do Pacto de New York, criou o Instituto da Tomada de Decisão Apoiada (TDA).

Pela nova via legal acima, uma pessoa com dificuldade, cognitiva ou motora, para expressar a sua vontade, escolhe, pelo menos, duas outras para apoiá-la em decisões da vida civil. A TDA tem a aptidão de resguardar aspectos da dignidade da pessoa humana. Os apoiadores são pessoas que gozam da confiança da pessoa que necessita de suporte, orientação, apoio material e psicológico para os atos da vida. Não traz a pecha da violência da interdição.
Estudiosos do tema, como Nelson Rosenvald, defendem que “pessoas que padecem de doenças crônicas degenerativas, tais como: Alzheimer; Parkison; esclerose múltipla; arteriosclerose” podem se valer da TDA.
A revista do IBDFAM divulgou um caso em que os pais de uma pessoa, que apresentara os primeiros sintomas de esquizofrenia aos 11 anos, decidiram não a interditar quando ela atingiu a maioridade. Eles rejeitaram a curatela e “optaram” pela TDA. Cabe aqui uma correção, pois, pela lei, quem faz a opção pela T.D.A. não são os pais, mas quem precisa do apoio.

Retornando ao ALZHEIMER, penso que, nos primeiros sinais da doença, deve-se avaliar a instituição da TDA, porque este instituto assegura a dignidade da pessoa doente e, no plano clínico, a interação com os apoiadores gera um ambiente sinérgico, talvez retardador da degeneração cognitiva em curso.

* Articulista. Advogado. Membro da diretoria do Instituto dos Advogados de Minas Gerais – IAMG. E-mail [email protected]

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