21 de julho, de 2018 | 11:40

Caminhando e cantando... VAMOS FAZER 50 ANOS...

Nivaldo Resende *

“A música, tanto quanto o amor, era a mola mestra que nos movia”

Fim dos anos 60, início dos anos 70 do século passado...Parece tão distante, não é mesmo? Mas para nós, integrantes do Grupo Jamar, parece que foi ainda ontem quando nos reuníamos para filosofar sobre a vida e aquilo que dela esperávamos. Eram momentos difíceis, em plena ditadura militar, numa cidade tradicional e histórica que sediava um Batalhão do Exército onde havia uma companhia especializada no combate à guerrilha.

Mas como sempre aconteceu em toda a sua história, São João Del Rei fervilhava. Jovens, tínhamos as mesmas preocupações sociais, cultivávamos os mesmos ideais de liberdade, queríamos ver uma sociedade mais justa e igualitária. E além das sessões de cineclube, após as quais discutíamos longamente obras primas como 2001, Uma Odisseia no Espaço, líamos revistas como Seleções do Reader’s Digest e Nosso Tempo, e os livros de Kant, Kafka, Herbert Marcuse, Jorge Amado, João Cabral de Melo Neto, Carlos Drummond, Ferreira Gullar e Thiago de Melo, entre outros.

E ouvíamos música, mas muita música. Beatles, Rolling Stones, Herman’s Hermit’s e Bee Gees integravam o cardápio, mas era mesmo nas letras e músicas panfletárias de Chico Buarque de Holanda e Geraldo Vandré, Caetano Veloso e Gilberto Gil, Violeta Parra e Mercedes Soza, Milton Nascimento e todos do Clube da Esquina, que buscávamos inspiração para tentar vencer as angústias típicas de todos os jovens.

Uma das mais fantásticas características do Jamar era exatamente o fato de que a maioria de nós não apenas adorávamos música, mas também fazíamos música. Apenas para citar os que eu me lembro: João e Cézar Campos, Tarcísio Camelo, Danilo, Olavo e Toninho, Chico Pires, Vaninho, os irmãos Sena, Suzana e Cristina Assis, Bosco Facion e Bosco Bedeschi, Aírton, Mirinha e Murilo, os irmãos Zanoni, Kléber...

Nenhum de nós se considerava um virtuose no violão, mas não tínhamos pejo algum em mostrar nossos pendores musicais, aprendíamos uns com os outros, compúnhamos músicas com diferentes parceiros. Dessa troca resultaram espetáculos no teatro do Colégio São João, como o Sambarque, Sambataí e um maravilhoso festival de música que foi fechado pelo Grupo Raízes, de Montes Claros, do qual saiu o músico, ator e humorista Tino Gomes.

Nossas serenatas eram famosas na cidade inteira. Nossas reuniões de todos os sábados eram memoráveis. Promovíamos missas e círculos de oração, fazíamos quermesses na praça da Igreja Dom Bosco e do Albergue, dávamos aulas de alfabetização e catequese, fazíamos retiros espirituais e divertidíssimos passeios às Águas Santas, Colônia do Marçal, a Tiradentes ou ao Areal.

A música, tanto quanto o amor, era a mola mestra que nos movia. As paixões se sucediam, mas não havia desrespeito ou permissividade. O nosso conceito de Flower Power e amor livre da geração beatnik era muito responsável, e o que cada um de nós acabou se tornando na vida provou isto.

Provavelmente, para as nossas famílias e a maioria da tradicional família mineira típica de São João Del Rei, nós éramos todos uns jovens amalucados e irresponsáveis. Mas cada um de nós sabia muito bem o que estava fazendo, e porque estava fazendo. Sabíamos, e com certeza ainda sabemos, o que era e é importante na vida.

Eu não falo em nome de todos, ainda que ache que pudesse fazê-lo. Mas se sou o homem de bem, o cidadão consciente e responsável que me considero, eu o devo a este tempo de maravilhosa convivência com cada um dos jovens amigos, amados e amadas do Grupo Jamar, cujo nome é sintomático: Juventude Para Amar. Nossas angústias e discussões, nossos encontros e festinhas à americana também construíram o arcabouço do que somos.

No meu caso em particular, a música continua presente, todos os dias, todas as horas, em todos os momentos. E juro a vocês do fundo de coração: a cada música que ouço, eu me lembro de cada um de vocês. Nós que amávamos os Beatles e o Rolling Stones, amávamos também os Mutantes e Nara Leão. E assim aprendemos a nos amar uns aos outros.

A vida, o tempo, a distância e a necessidade de sobrevivência afastou muitos de nós geograficamente, mas nas almas e nos corações, assim como nos ideais, sonhos e aspirações, nós continuamos caminhando e cantando juntos, um reforçando a história do outro. E isso, de uma forma ou de outra, ainda dá sentido à nossa vida.

Preparamos os nossos corações pras coisas que iriam nos contar, vimos que tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu, muitas vezes pedimos ao Pai que afastasse de nós o cálice da maldade e da vaidade.

Mas quem me dera agora eu tivesse a viola pra tocar uma moda de um cego infeliz... Ou pudesse volver a los 17... Passar um Domingo no Parque... Ainda caminho sem lenço e sem documento, vendo a procissão de gente comum se arrastando que nem cobra pelo chão.

Mas todos nós podemos nos orgulhar: somos vencedores!!! Viva o nosso encontro dos 50 Anos...

* Jornalista e Escritor, integrante do Grupo Jamar, Presidente da Academia de Letras de Ipatinga, Vice-Presidente do Clube dos Escritores de Ipatinga, Membro da Academia de Letras do Brasil de Mariana, Editor de Cultura e de Cadernos Especiais do jornal Diário do Aço Residente em Ipatinga – Minas Gerais
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