22 de abril, de 2018 | 08:58

Sem consenso, Câmara discute reforma do Código de Processo Penal

Pela proposta, o tempo máximo de prisão preventiva passará para três anos e meio

Divulgação / Senado
Proposta é mais rigorosa na punição de crimes contra a vida, aumentando a permanência de condenados no regime fechadoProposta é mais rigorosa na punição de crimes contra a vida, aumentando a permanência de condenados no regime fechado


Aprovada no Senado em 2010, a reforma do Código de Processo Penal voltou à discussão na Câmara dos Deputados e pode ser votada na comissão especial ainda este semestre. Nesta semana, o relator-geral do texto, deputado João Campos (PRB-GO), apresentou o que considera ser a primeira versão do seu relatório para balizar o debate.

Pela proposta, o tempo máximo de prisão preventiva passará para três anos e meio, atualmente é indeterminado. Também estabelece prazo para a realização de interceptações telefônicas - de 60 dias prorrogáveis para até 360. Outra mudança estabelece que os embargos de declaração, recurso que pede esclarecimentos sobre uma decisão judicial, poderão ser apresentados apenas uma vez.

João Campos propõe também que a execução da pena só poderá começar após decisões colegiadas de tribunais de Justiça, deixando claro que não seria necessário esperar até o último recurso em tribunais superiores. Este trecho é interpretado, por seus defensores, como um reforço ao entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) para a prisão após condenação em segunda instância.

A próxima reunião da comissão especial está prevista para o dia 24. O relator deve ler o texto definitivo para que o parecer seja divulgado no fim deste mês. Em seguida, será colocado em discussão e votação. No entanto, a votação em plenário só deve ocorrer no segundo semestre.

Investigações

Em meio a polêmicas, na parte sobre as atribuições do processo de investigação criminal, o texto do deputado estabelece que a investigação deve ser conduzida por delegados das polícias Civil ou Federal e que o Ministério Público entraria no processo apenas “subsidiariamente”, nos casos em que a polícia não for eficaz, em razão do abuso de poder econômico ou político.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho Cavalcanti, criticou os textos preliminares do código. "Existem problemas e avanços no novo código. Nesta parte de investigação criminal, ele piora a situação do que está hoje, pois mantém estrutura atrasada de um inquérito burocrático e lento", disse.

Para Robalinho, o relator deveria ir por outro caminho. "O relator em vez de tornar o inquérito mais enxuto, menos formalista, ele optou por não só manter, mas centralizar a investigação no delegado. O que isso significa? Um inquérito mais lento e burocrático. Isso não é assim em nenhum lugar do mundo”, analisou o procurador, que pretende encaminhar sugestões.

Diálogo

O relator João Campos disse que está aberto ao diálogo e justifica que o entendimento de seu parecer seguiu o resultado do julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal, em 2015, quando a Corte tratou dos requisitos para atuação do Ministério Público em investigações penais.

“Procuro fazer em relação a isso é traduzir o voto de sete ministros do Supremo Tribunal Federal. Não estou fazendo nada de iniciativa própria. Sete ministros votaram numa direção em relação a capacidade investigatória criminal do Ministério Público. Se eu não consegui traduzir isso adequadamente, estou pronto para ouvir as sugestões do MP, posso ir lá no Supremo conversar com o relator da matéria, ministro Gilmar Mendes, para que a gente tenha um texto que exprima a vontade ou voto dessa maioria do Supremo Tribunal Federal, não há nenhuma dificuldade em relação a isso”, afirmou o relato.

Segundo Robalinho, a interpretação do deputado sobre o resultado do Supremo está equivocada e pode prejudicar o avanço da Lava Jato, que funciona por meio de uma força-tarefa entre a Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério Público. O procurador lembrou ainda que essa matéria também já foi vencida no plenário da Câmara, na ocasião da apreciação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, em 2013. A proposta que garantia às polícias Civil e Federal exclusividade do poder de investigação criminal foi rejeitada por 430 votos a nove, no contexto dos protestos de julho de 2013.

Insistência

Apesar da derrota, os parlamentares insistem em propostas que limitem os poderes do Ministério Público. Atualmente, tramita no Senado a PEC 102/11 que também prevê que só a polícia poderá fazer investigações criminais e o seu controle externo não seria mais exercido pelas promotorias e procuradorias, mas pelo Conselho Nacional de Polícia, ainda a ser criado. A proposta aguarda análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desde setembro do ano passado.

Para a Associação Nacional de Delegados da Polícia Federal, o projeto de reforma do CPP tem avanços e alguns pontos que precisam ser ajustados. Segundo o presidente da entidade, delegado Edvandir Paiva, o novo código deve estabelecer a cooperação na investigação e delimitar as competências de cada órgão para que não haja invasão de atribuições.

“Não é boa essa disputa corporativista para o processo criminal. O novo Código de Processo Penal tem que definir quem faz o que e com que limite”, disse o delegado.

Segundo o policial, a finalidade do inquérito não deve ser somente levantar provas para que o Ministério Público apresente denúncia. “Qual a finalidade da investigação criminal? A busca da verdade. O Ministério Público não pode atravessar a investigação, comandando a investigação”, questionou Paiva. (Débora Brito e Karine Melo - Repórteres da Agência Brasil)

Homicídios

A proposta que tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para reforma do Código Penal (PLS 236/2014) é mais rigorosa na punição de crimes contra a vida, aumentando a permanência de condenados no regime fechado.

A pena mínima para crime de homicídio simples deverá ser aumentada dos atuais 6 anos para 8 anos de prisão. Com isso, o condenado deverá começar a cumprir a pena obrigatoriamente em regime fechado. O tempo máximo de prisão continua sendo de 30 anos, mas a condenação, quando há agravantes, pode chegar a 40 anos, tempo que será usado para cálculo da progressão de pena.

O texto também é mais rigoroso com os prazos para a progressão de pena, situação em que o condenado pode pleitear mudança para um regime de reclusão menos severo, por exemplo, do regime fechado para o semiaberto. Hoje, é exigido de condenados o cumprimento de ao menos um sexto da pena para pleitear o benefício, mas o novo Código Penal pode estabelecer um mínimo de um quarto da pena.

Celular

Para aumentar o controle dentro das cadeias, o texto estabelece que o detento que portar celular, rádio ou similar clandestinamente no presídio responderá por prática de crime. Até então considerada falta disciplinar, no novo código a conduta poderá resultar em pena adicional de um a três anos de prisão.

A medida visa coibir o uso de celulares por detentos, prática que tem permitido a comunicação com comparsas do lado de fora da cadeia e também a simulação de sequestros.

Penas alternativas

Por outro lado, o projeto amplia as possibilidades de aplicação de penas alternativas, ou restritivas de direitos, quando se tratar de crime de menor potencial ofensivo. São exemplos desse tipo de pena a prestação de serviço à comunidade e a participação em cursos e palestras em instituições credenciadas junto às varas de execução penal.

O juiz poderá optar pela adoção desse tipo de pena em substituição a pena de prisão de até quatro anos, se o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa e se o réu não for reincidente em crime doloso.

Segurança pública

No substitutivo, Vital incluiu título específico, com quatro capítulos e 19 artigos, para tratar dos crimes contra o estado democrático de direito, uma vez que o projeto revoga a Lei de Segurança Nacional.

Estão previstos nesse título os crimes contra o funcionamento das instituições públicas e dos serviços essenciais. Esse é o caso da destruição de meios de transporte, como o incêndio a ônibus nas manifestações, por exemplo. Está prevista para esse tipo de crime pena de prisão de dois a oito anos, que poderá ser ampliada para oito a doze anos se a ação resultar em morte.

As penas previstas serão aumentadas até a metade se os crimes forem praticados durante grandes eventos esportivos, culturais, educacionais, religiosos, de lazer ou políticos. O capítulo inclui ainda punições para crimes de espionagem, golpe de estado, insurreição, conspiração e ação de grupo armado, entre outros.

Crimes contra a humanidade

O novo código poderá ter um capítulo específico para crimes contra os direitos humanos, que são aqueles praticados pelo estado ou por uma organização contra a população civil ou um grupo de pessoas.

Fazem parte desse grupo os crimes de extermínio (sujeitar um grupo de pessoas à privação dos meios para sua sobrevivência, causando-lhes a morte); escravidão (exercer sobre alguém poder inerente ao direito de propriedade); e perseguição (limitar o exercício de direitos fundamentais de um grupo de pessoas identificado por características políticas, raciais, nacionais, étnicas, culturais, religiosas ou outra análoga).

Também são crimes contra a humanidade a gravidez forçada (forçar a gravidez, mediante ameaça, com o fim de modificar a unidade étnica de um grupo); privação de liberdade em violação de direito fundamental (manter alguém preso em violação das normas fundamentais de direito internacional); transferência forçada de população (expulsão de um grupo por motivos de raça, etnia, cor, religião ou preferência política).
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