30 de novembro, de 2017 | 17:10

É PRECISO MUDAR, MAS A FORMA PODE SER MELHOR

Ronaldo Soares *

Quando estive no poder público me vi em questões que, a priori, passam despercebidas ou, por muitas vezes, não analisadas. Por exemplo, os moradores de uma área invadida reivindicar obras de saneamento básico e infraestrutura de vias e ser atendidos pela prefeitura. A pergunta é: a área sem regularização existe? Não existindo, como o poder público pode levar serviços públicos para lá? Vamos um pouco mais adiante. Partindo do pressuposto que o município é um grande condomínio formado por pessoas físicas e jurídicas que, com seus impostos, esperam que os gestores públicos os revertam em serviços e obras, como não contribuindo posso cobrar?

É uma discussão que, com argumentos pra lá e argumentos pra cá, poderá esclarecer os direitos e deveres de cada um. Mas, independentemente disso, discuti-los já é um avanço.

A partir dessa reflexão, na semana passada a mídia regional jogava luz sobre a notificação expedida pela Prefeitura de Ipatinga aos barraqueiros do Parque Ipanema alegando que Ministério Público, legislação e código de posturas levavam a administração municipal a conceder o prazo máximo, até 30 de novembro, para que todos os comerciantes informais (das barracas) ao longo da avenida Burle Marx/Parque Ipanema se retirassem por espontânea vontade.

Conversando com representantes da Associação Comercial e Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) ouvi testemunhos da grande dificuldade da concorrência desigual que os comerciantes informais gozam, em detrimento dos formais, pagadores de impostos e outras despesas fixas e conclui que, com a crise, o status, a pujança, as condições financeiras de ambos se igualam e não se pode definir, com certeza, que a condição econômica de um é superior a do outro. As aparências enganam e muitos “camelôs” ou “barraqueiros” podem não fazer parte do lado frágil da questão.
No entanto, vejo com reservas o trâmite da resolução do problema que, diga-se de passagem, criado pela omissão das gestões anteriores, uma vez que permitiram a ocupação irregular do Parque Ipanema fazendo, literalmente, “cara de paisagem” para a situação que, na medida em que o tempo passou, consolidou-se como um “direito” no conceito de quem, irregularmente, ali ocupava. Isso porque, vivíamos, por outro lado, a pujança econômica no contexto local com a Usiminas e setor de serviços jogando na economia recursos que alcançavam, de forma satisfatória, o comerciante formal e o informal. No contexto nacional, a “Era Lula” contribuía por uma atmosfera positiva da economia como um todo. Para quê mexer em uma situação difícil, já que todos estavam satisfeitos?

No entanto, as vacas magras chegaram a seu tempo e, agora, o inadiável se torna imprescindível, seja por força de lei, seja por necessidade de sobrevivência. Mas, propor a retirada dos comerciantes (barraqueiros) sem que se apresente à sociedade e, sobretudo, aos próprios interessados, condições para que possam sair da informalidade e se apresentar como um contribuinte, não me parece a mais adequada. Famílias sobreviveram por anos e podem se tornar um novo problema social para a própria prefeitura resolver. Acredito que seria necessário um período de transição em que pudessem, apoiados pela área de Desenvolvimento Econômico, Sebrae e as próprias entidades representativas do comércio, credenciarem-se para obtenção do microcrédito, capacitação empreendedora, suporte de gestão e tornaria, assim, o processo menos traumático possível. Não discordo da decisão da prefeitura, a forma com a qual está sendo implementada é que pode ser aperfeiçoada e, com isso, ser exemplar em todos os aspectos (humanitários, econômicos e social).

Na notificação enviada aos comerciantes, é possível perceber que a objetividade deixa pontos a serem esclarecidos. Por meio de nota oficial, a assessoria de Comunicação da PMI informou que “a ideia do governo é uniformizar os quiosques, assim como elevar o padrão dos serviços prestados pelos barraqueiros, inclusive capacitando-os quanto a cuidados de higiene e manipulação de alimentos, para oferecer um atendimento de melhor qualidade aos usuários do parque”.

A questão é se isto não poderia (pode) ser feito concomitantemente? Primeiramente, capacite-os, apresente a proposta de padronização (estética dos estabelecimentos comerciais), custos de adequação, linhas de financiamento para que possam alcançar, interpretação do edital e das exigências legais (seja pelo código de posturas ou vigilância sanitária) e, a partir daí, a concorrência fique aberta. Da forma como se propõe, eles já estão excluídos desse novo patamar que a prefeitura propõe.

A nota conclui que “Além destas questões, também tem sido apresentada aos vendedores uma proposta para fechamento da avenida Roberto Burle Marx aos sábados e domingos, não só para favorecer a utilização do espaço para atividades de entretenimento, esporte e lazer, mas também como opção para que os proprietários de barracas tenham melhor aproveitamento em suas atividades comerciais”.

O prefeito Sebastião Quintão é uma pessoa sensível à causa dos menos assistidos. Acredito que ele e sua equipe irão procurar a melhor solução que atenda o desejo da maioria, princípio fundamental da democracia e que, mesmo que desagrade à parcela menor da sociedade, garanta a igualdade dos cidadãos. Há grandes homens públicos em nosso país e Ipatinga os tem.

*Consultor
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