23 de agosto, de 2017 | 08:42

Reforma Política

Sérgio Orlando Pires de Carvalho

Divulgação
Uma reforma política para o Brasil passa por algo que se perdeu faz tempo, o resgate da dimensão pública da atividade política. A chamada reforma que irá a votação em dois turnos, na Câmara dos Deputados e também no Senado, infelizmente, está longe disso.

Na realidade, não será uma reforma concreta. Será, apenas, um pequeno ajuste para retirar o grosso do caos do atual sistema, que ao longo do tempo cravou-se no particularismo político de candidatos e partidos, assim como do estado como um todo, onde se perdeu, completamente, a dimensão do que seja a figura do homem público.
Assim, temos uma reforma política em curso no Brasil com distorções e confusões, com a possibilidade de termos o voto distrital misto em 2022, o que será uma evolução.

Para avançarmos será preciso que a sociedade brasileira entenda o conceito de voto distrital, o que é fundamental para alterar a lógica do atual sistema e, posteriormente, a implantação do parlamentarismo, algo que o Brasil irá precisar para deslanchar como nação. Não temos alternativa!

Voltemos ao voto distrital. O voto distrital é fundamental para aproximar o eleitor de seu representante. Mas, como isso funciona? Pensemos no estado de Minas Gerais. Aqui nós temos 53 deputados federais que nos representam na Câmara dos Deputados em Brasília.

Caso fosse implantado o voto distrital, o Estado de Minas Gerais seria dividido em 53 distritos eleitorais, num dos quais onde o deputado iria disputar a sua eleição, ou seja, em um único distrito.

Isso faz com que o eleitor saiba, exatamente, quem é o deputado do seu distrito, ou seja, de onde o eleitor mora e vota. Desse modo, o eleitor poderá fiscalizar o representante eleito e cobrar dele por suas ações, e saber o que ele está fazendo ou se comportando nas votações em Brasília.

Pesquisas mostram que 70% dos eleitores não se lembram em quem votou na última eleição, o que reflete a desconexão do deputado com o seu eleitor, com a sua base.

O voto distrital vai trazer essa aproximação. Isso é o que se chama de responsabilização, ou seja, o eleitor vai poder cobrar e fiscalizar seu representante. E o bom parlamentar é sabedor de que precisará prestar contas. Assim, o representante do distrito irá voltar ao seu distrito e poderá explicar aos seus eleitores porque ele votou uma determinada matéria, porque ele defendeu um determinado ponto de vista etc.

Então, essa aproximação é fundamental para resgatar a credibilidade do parlamento que hoje está muito afetada por esse distanciamento com a sociedade.

Outra vantagem do voto distrital é que o grande cacique terá que disputar a eleição localmente com um líder regional, com chances de perder, porque a votação ocorre em um único distrito, o que desfaz a necessidade do postulante percorrer todo o estado atrás de votos.

Outra coisa fundamental, ao dividir o estado em 53 distritos, é que os distritos se tornam de mesmo tamanho, tendo o mesmo peso populacional, o que irá corrigir uma enorme distorção do sistema atual, que é a sub-representação das grandes cidades.

A cidade de Belo Horizonte, assim como outras tantas no Brasil afora, não elege nenhum deputado. Caso tenhamos os 53 distritos eleitorais no estado de Minas Gerais, a cidade de Belo Horizonte teria, aproximadamente, 12 representantes, o que proporcionaria a representação do voto urbano com mais peso no Congresso, fundamental para a modernização das leis.

Dentro do voto distrital existem três grandes variáveis. A que discorremos é uma delas, a que chamamos de voto distrital puro. Outra variável é o distritão, o qual os deputados estão discutindo para votação na Câmara dos Deputados.

Das três variáveis do voto distrital, o distritão é o patinho feio. Para esse sistema, o distrito é o estado inteiro, onde o deputado disputará a eleição como se ele fosse Senador, percorrendo o estado por inteiro. Nesse sistema o deputado não tem a quem prestar contas, pelo fato de ter voto espalhado em toda a região.

Isso destrói o que o eleitorado procura e deseja, ou seja, a responsabilização e a cobrança. Esse sistema tem outro defeito, o qual traz o encarecimento da eleição. Outra contradição ruim neste sistema seria o de como o deputado conciliaria o interesse do interior com o de uma capital, por exemplo.

Dentro desta circunstância, o deputado eleito tenderia a tratar tudo isto, distribuindo emendas parlamentares para todas as regiões, como em obras locais e paroquiais que não tem nenhum impacto a não ser cultivar esse clima de clientelismo local que conhecemos, levando assim à perpetuação do clientelismo, que é o que precisamos combater para melhorar a capacidade de representação.

Por outro lado, a sociedade terá que entender que o distritão deveria valer somente para a eleição de 2018, como parte de uma transição apenas. Outra coisa a entender é que, no sistema distritão, o concorrente mais votado será o eleito. Portanto, pode ocorrer que um partido receba 40% dos votos disputados e não ganhe nenhum distrito.

Assim, esses votos, que não são poucos, iriam para o lixo, por não representarem absolutamente nada. Como terceira variável do sistema distrital, e para corrigir o que acabamos de comentar, precisamos conhecer o voto distrital misto, utilizado na Alemanha.

No voto distrital misto, metade do parlamento seria eleita pelo voto distrital direto. Assim, os 53 distritos eleitorais no estado de Minas Gerais, por exemplo, teriam 26 distritos no sistema distrital direto e as outras 26 cadeiras complementares ficariam com os partidos através de representação partidária em uma lista de deputados a serem votados. O chamado voto em lista.

Nesse modelo, o eleitor votará duas vezes. Uma vez no candidato do seu distrito e outra vez no partido, elegendo 26 assentos, fortalecendo assim os partidos, o que é fundamental, principalmente no sistema parlamentarista.

Precisamos entender que o parlamentarismo não combina com partidos frágeis, como é o caso do presidencialismo. No presidencialismo os partidos praticamente não existem, como ocorre hoje no Brasil. Eles são frentes partidárias que, na realidade, são máquinas eleitorais que ajudam a eleger candidatos para depois disputar ministérios, presidência de estatal, diretoria financeira de estatal, primeiro, segundo e terceiro escalões, e vai por aí afora.

Esse sistema é interessante, porque a preferência partidária conta e o eleitor irá votar em um candidato que considera bom para o seu distrito e em um partido que considere também bom. O eleitor não precisará votar no candidato de ambos os partidos, porém, se a escolha do eleitor for essa, não haveria problema. Na Alemanha, os nomes da lista estão escritos na ordem proposta pelos partidos, normalmente do melhor para o pior.

Outro fato importante, na realidade, é que o sistema de voto distrital misto consegue trazer figuras notáveis da sociedade para a política. Ou seja, promove a vinda daqueles que não tem vocação para disputar votos, para a política. O que possibilita contar com nomes de prestígio em suas áreas de atuação que, evidentemente, irão se misturar com outros políticos, caciques ou não, o que seria importantíssimo e revigoraria a democracia.

* Economista, MBA Executivo em Gestão Empresarial, PG em Administração de Empresas e Organizações, PG em Metodologia do Ensino Superior, Consultor Econômico-Financeiro e autor dos Livros “Economia & Administração” e “Guilhermina de Jesus e a Família Brasileira”. E-Mail: [email protected]. Blog: http://zaibatsum.blogspot.com.
Encontrou um erro, ou quer sugerir uma notícia? Fale com o editor: [email protected]

Comentários

Aviso - Os comentários não representam a opinião do Portal Diário do Aço e são de responsabilidade de seus autores. Não serão aprovados comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes. O Diário do Aço modera todas as mensagens e resguarda o direito de reprovar textos ofensivos que não respeitem os critérios estabelecidos.

Envie seu Comentário