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27 de julho, de 2017 | 09:45

Dos memes que precisamos para rejuvenescer: volta Belchior!

Beto Oliveira

Divulgação
A sociedade sempre teve seus jargões, frases de efeitos, sons, palavras, imagens que se alojam em nossa mente quase sem percebermos. Há alguns dias, a coordenadora de marketing cultural Zenaide Denardi entrou no metrô paulista e entoou a música “Evidências”, sucesso de Chitãozinho & Xororó. Logo foi acompanhada pela maioria dos passageiros.
E circulou nas redes sociais uma frase que dizia que a canção está no código genético do brasileiro e que todos já nascemos com prévio conhecimento dela. A experiência de Zenaide aponta nessa direção.

De fato, o clássico sertanejo lançado em 1990, como frases do tipo “Ser ou não ser, eis a questão”; “E agora, José”?; “Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação...” entre outras, dão a impressão de nunca terem sido aprendidas, é como se já habitassem nossas mentes desde sempre.

Richard Dawkins, inspirado no termo gene, que representa a unidade fundamental da hereditariedade, cunhou em 1976 o termo “meme” para dar conta de algo como uma unidade mínima de informação, que tenha a característica de se propagar facilmente na cultura. O meme seria para a memória mais ou menos o que o gene é para a genética.

Os exemplos acima não deixam de ser unidades desse tipo. Mas os memes mais frequentes da atualidade não são propriamente frases que representam a nossa música, história ou literatura, mas tipos de bufonaria que, ao mesmo tempo em que zombam de algo, também condensam na piada, frase ou imagem a representação de um sentimento social.

Dessa forma, alguns jargões políticos podem também aparecer em forma de memes, como bem exemplifica o famoso “Primeiramente, fora Temer”. Aliás, no campo político, muitos jargões com a palavra “Fora” viram memes – antes e, com certeza, depois de Temer, como as postagens que antecipam o “Fora Maia”, referindo-se a possível chegada de Rodrigo Maia à presidência.

Mas, justamente no meio de tantos “Fora”, é interessante que resista um “Volta”. Refiro-me aqui ao – penso que podemos chamar de meme – “Volta Belchior”. Desde que ele foi considerado desaparecido, os fãs passaram a compartilhar essa pequena frase que concentra, numa unidade mínima de informação, o sentimento de muitos brasileiros. Um grupo de Belo Horizonte chegou a montar um Bloco de Carnaval intitulado “Volta Belchior”, sucesso na folia de 2017.

A morte do cantor, em abril desse ano, não parece ter enfraquecido o jargão. Ao contrário, mesmo sabendo da impossibilidade de o cantor retornar aos palcos e estúdios, muita gente ainda se identifica com o “Volta Belchior”. Isso porque a frase sempre representou mais do que um pedido de retorno da atividade artística do cantor. Tampouco se restringiu a aspectos de sua vida pessoal, controversa mesmo entre os fãs (por conta não apenas do sumiço, mas também das dívidas, pensões alimentícias e de sua relação com os filhos).

A frase “Volta Belchior” brada por um retorno do afeto que suas músicas provocavam e ainda provocam em nosso corpo biológico, mental e político.

Dono de aforismos certeiros, verdadeiros memes do Cancioneiro Popular Brasileiro, como “Viver é melhor que sonhar”, “Amar e mudar as coisas me interessa mais”, “Enquanto houver espaço, corpo, tempo e algum modo de dizer não eu canto”, “Não quero o que a cabeça pensa, eu quero o que a alma deseja” e muitos outros, o compositor, cantor, desenhista, pintor e caricaturista de Sobral (CE) acabou se tornando, para muitos brasileiros, o símbolo de um rapaz latino americano, sem dinheiro no bolso, sem parentes importantes e indo do interior para o mundo.

Esse personagem que Belchior criou através de suas músicas parece ser o verdadeiro espírito do “Volta Belchior”. E é pelo retorno da força rejuvenescedora dessa voz latina que nossa vida artística e política tanto clama. Volta Belchior...

* Psicólogo, mestre em Estudos Psicanalíticos pela UFMG. Coordenador do Centro de Estudos e Pesquisa em Psicanálise do Vale do Aço. Autor do romance “O dia em que conheci Sophia” e da peça teatral “A família de Arthur”.
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