
13 de junho, de 2017 | 09:10
Diálogo e o poder da transformação
Débora Patrícia Nemer Pinheiro
O seriado americano 13 Reasons Why” e o jogo da Baleia Azul” causaram comoção e discussão, tanto nas redes sociais quanto na imprensa. Nos dois eventos, o tema suicídio esteve em destaque, com argumentos favoráveis e desfavoráveis ao seriado e horror ao provável aumento de casos de suicídio entre adolescentes em todo o mundo.Causou-me especial interesse por compreender essas reações controversas, já que o suicídio não é assunto inédito na experiência humana. Ao contrário, é um tema próprio à espécie, tendo ocorrências em todos os períodos da história da humanidade. É fato também que não há consenso no campo científico sobre seriados, filmes, livros e mídias sociais influenciarem diretamente no suicídio.
De todo modo, podemos buscar a anuência do leitor em torno de uma resposta possível para tamanha discussão social nos tempos atuais, afirmando que boa parte da população mundial sente algum tipo de mal-estar com relação à própria vida, a ponto de se identificar com a personagem Hannah do seriado ou de obedientemente” seguir os passos indicados por um desconhecido no jogo Baleia Azul” (sendo que tirar a própria vida é o último e fatídico desafio).
Alguns estudiosos sugerem que tal ato seja fruto de transtornos mentais. No entanto, teremos de reconhecer que, independente de qualquer transtorno, a ideia sobre a morte acompanha lado a lado a história de vida das pessoas.
Desde quando reconhecemos nossa finitude, percebendo o tempo que passou, até pensamentos indiretos quando alguém acometido de grande tristeza que passou por alguma decepção, pensou: Se eu estivesse morto, não estaria sentindo essa dor”.
Em 13 Reasons Why”, a personagem principal vive dilemas fundamentais da existência e evidencia a vida como imprevisível e sem controle absoluto dos fatos. Da mesma forma que ela, seus amigos também sofrem com as mesmas indagações, mas não optam pelo suicídio. E essa é a regra geral: diante das adversidades, a maioria das pessoas resiste e persiste na trajetória da vida.
Sabemos que muitos jovens disseram não ao jogo Baleia Azul” e outros apenas sensibilizaram-se com a história de sofrimento da personagem principal do seriado, Hannah. Aqui temos a prova de que não é possível simplificar o debate e a discussão buscando os culpados pelo aumento do número de suicídios, seja responsabilizando os pais, a escola, os amigos ou mesmo a divulgação destes fatos na mídia.
É necessário resgatar um elemento fundamental: somos seres singulares. Alguns estão vulneráveis, por isso, suscetíveis às identificações com diferentes personagens e pessoas do convívio. Para aqueles que estão vulneráveis, o silêncio solitário demonstra ser de pouca ajuda.
Um dos poucos recursos favoráveis, além de uma avaliação psiquiátrica e psicológica, é a palavra como forma de expressar e compartilhar angústias. Entretanto, necessitamos encontrar interlocutores que possam acolher e compreender as dores humanas, apontando caminhos possíveis.
Nessa perspectiva, os novos tempos estão contraditórios. Por um lado, nunca se falou e se viveu tanto nas redes sociais. E, com isso, na internet, as pessoas têm opiniões sobre tudo e todos, mesmo que desconheçam os assuntos e as pessoas envolvidas. Percebo que a fala é uma boa alternativa para refletir, repensar, rever as certezas e abrandar as dúvidas e angústias.
Mas essa fala precisa ter eficácia simbólica, e isso só ocorre em um encontro binário: de um lado, um ouvinte perspicaz sobre as inquietações humanas, e de outro, alguém disposto a expor com sinceridade sua intimidade. Desse encontro, o produto poderá ser a transformação.
* Psicanalista e professora do curso de Psicologia da Universidade Positivo (UP).
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