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04 de abril, de 2017 | 10:50

Indústria alimentícia. Esconder-se no desespero?

Amadeu Garrido

Divulgação
Triste, a conduta adotada pelas autoridades brasileiras no terremoto de alto grau que abalou nossa indústria de alimentação. Os jornais mais importantes do país - não há como negar - deram o mínimo espaço possível às consequências da operação da polícia federal "carne fraca", que são lancinantes para nossa exportação de produtos alimentícios.

Talvez não se tenha tanta preocupação em relação às carnes que consumimos. Afinal, o brasileiro é um companheiro biológico do sofrimento. Mas a economia tem de voltar aos trilhos e, nesse campo, nem trilhos há.
Não discordamos de preservar o país num de seus momentos mais críticos. O problema é que mentiras têm pernas curtas, e a União Europeia, cujos habitantes ficaram neuróticos após o episódio da "vaca louca", não nos dará tréguas e a verdade ofuscante virá à tona.

Pode-se supor a próxima ocorrência de todos os tipos de cautelas a serem adotadas por nossos compradores e consumidores do exterior. Quer-se investigar a fundo, sem essa conversa fiada de "foro privilegiado" e outras perfumarias jurídicas. Pedirão inspeções periciais jamais vistas no país.

Os frigoríficos serão devassados de cabo a rabo. Não adianta falar em soberania, em confinar as investigações às autoridades brasileiras, em quebra de soberania, porquanto a soberania é efetivamente quebrada, quando os maiores adquirentes de certos produtos acenaram com suspensão imediata.

Fazer tudo sob o mínimo eco, a exemplo da reunião ministerial de domingo com os embaixadores, e o ínfimo destaque dado ao tema pelos órgãos de comunicação, nos salvará? Já se viu que não, com a suspensão de importações desencadeada na manhã de segunda-feira, obviamente previsível. Esse jogo será longo e aumentará nossos batimentos cardíacos.

Começarão verificando as condições reais de funcionamento das grandes unidades produtoras, nos pontos cujas mazelas compuseram o escândalo mais tonitruante, dadas a suposta idoneidade das marcas envolvidas. Em cotejo, estarão declarações oficiais de poderosos grupos econômicos, que poderão ser prestigiadas ou não.

Caso não o sejam, se constatado que o problema é maior e mais intenso, é possível que se abra o caminho de sua decomposição e de suas substituições no plano industrial brasileiro por outros grandes conglomerados mundiais, visto que a qualidade dos alimentos é problema de toda a humanidade, e não apenas dos brasileiros.

À parte isso, uma investigação de proporções formidáveis, rigorosamente analítica, nas pequenas e médias empresas que atuam no setor, às centenas ou aos milhares. Aí a coisa pega de modo dantesco. Há informações seguras das péssimas condições de higiene e segurança alimentar sob as quais se processa a industrialização alimentícia nesses nichos econômicos menores. Sem exagero, constatações repugnantes serão em grande número.

É um quadro nada alentador, mas que se formou ao longo de nossa história industrial, portanto há mais de meio século. E, muito provavelmente, não teremos forças para o enfrentamento do problema. Não podemos ser xenófobos e não abrir nosso parque industrial de alimentação a essa reciclagem drástica e fatal aos países e organismos internacionais, como a ONU. Não há porque temermos perder mercado, a longo prazo, considerada a extensão do território e nossa capacidade quase única de sustentação do agronegócio.

Não se trata de alarmismo e tampouco de politicagem. Claro que pescadores de águas turvas, sem nenhum compromisso com o país, ficam contentes com o estouro da bomba sob o governo Temer. Mas não há outra direção senão fazer o jogo da verdade.

Das trevas nasce a luz, da admissão e superação dos problemas atuais do mundo, a recuperação do planeta, que chegou a um ponto tal, nos mais diversos segmentos da atividade humana, que devemos buscar o renascimento contemporâneo, uma nova etapa de nossa ética e de nossa história.

* Sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados, com uma visão sobre política, economia, cenário sindical e assuntos internacionais.
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