14 de março, de 2017 | 09:18
Dia Mundial dos Direitos do Consumidor
Fábio Torres de Sousa
Desde 1983, no dia 15 de março, comemora-se o Dia Mundial dos Direitos do Consumidor. A data não foi escolhida a esmo. Decorre de ter sido o dia em que, no ano de 1962, o então presidente dos EUA, John F. Kennedy, em mensagem ao Congresso Americano tratando da proteção dos interesses e direitos dos consumidores, reconhecendo que as leis eram inadequadas para a correta e eficaz proteção dos direitos, exortou uma verdade intransponível: Todos somos consumidores”.Naquela mensagem, Kennedy indicava os seguintes direitos do consumidor: o direito à segurança; o direito de ser informado; o direito de escolher e o direito de ser ouvido. Essa constatação histórica impeliu diversos países para uma preocupação constante de proteção às relações de consumo. O consumidor é parte indispensável no sistema econômico, sem o qual não há desenvolvimento econômico. Por isso era imperioso a criação de normas de amparo e proteção ao consumo.
A visão de Kennedy repercute e repercutirá sempre na vida social. Não há dúvida que consumidores somos todos. Do nascimento ao túmulo, vivemos inúmeras relações de consumo. Por isso, o Estado teve que se preocupar com essa realidade e o Direito buscou normatizar as relações de consumo, visando assegurar o melhor equilíbrio entre os consumidores e os fornecedores.
O Brasil não ficou distante dessa realidade. Na década de 1970 surgiram os primeiros órgãos de defesa do consumidor, como a Associação de Proteção ao Consumidor de Porto Alegre (APC), a Associação de Defesa e Orientação do Consumidor de Curitiba (ADOC) e o de Proteção ao Consumidor (atual Fundação Procon/SP). Na década de 1980, o tema continuou ativo com a expansão dos Procons, mas a ausência de legislação específica de proteção ao consumidor limitava, e muito, a proteção que o Estado queria garantir.
Em 1988 houve uma mudança importante com a Constituição Federal. A Constituição Cidadã consagrou a proteção do consumidor como direito fundamental e princípio da ordem econômica (arts. 5º, XXXII, e 170, V), cabendo ao Estado a promoção da defesa do consumidor, na forma da lei. Ao mesmo tempo, o art., 48 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias impôs a elaboração de um Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Assim, em 11 de setembro de 1990, por meio da Lei 8.078/90, surgiu o CDC. A legislação foi feita com o objetivo de equilibrar as diferenças entre o fornecedor, parte economicamente mais forte, e o consumidor, parte hipossuficiente, e, por isso, merecedora de proteção do Estado. O que se buscou, em obediência ao princípio constitucional, foi criar um conjunto de normas que permitisse ampla proteção, regulamentação adequada do consumo e fácil acesso dessa proteção, ao Judiciário, quando violada.
O CDC mudou a realidade jurídica brasileira. Transformou o consumo em mais que um mero ato de consumir, mas em uma relação econômica e jurídica que preste ao país e, principalmente, ao cidadão, ao mesmo tempo que permitiu um amplo e eficaz acesso à justiça.
Poucas leis foram tão eficazes e efetivas na sua aplicação e na concretização do seu ideal de Justiça, adquirindo aquele conceito popular da lei que pegou”, cujo cumprimento é perseguido pela maioria dos agentes econômicos da relação de consumo, pelo Estado, pelos órgãos de proteção ao consumidor e pelo próprio consumidor.
Todavia, apesar de todos os avanços na legislação, muito ainda há que se fazer para a proteção do consumidor no Brasil.
A nova realidades econômico-social e as novas tecnologias impuseram a necessidade de atualização do Código de Defesa do Consumidor. Um projeto já aprovado no Senado Federal, tramitando, atualmente, na Câmara dos Deputados, busca criar normas para a proteção do comércio eletrônico e da situação, cada vez mais comum, do superendividamento do consumidor.
Ao lado da reforma legislativa, o aprimoramento da atuação dos Órgãos Administrativos de Proteção, do Ministério Público, da OAB e do Poder Judiciário, é fator indispensável para que o consumidor brasileiro possa continuar a ter efetivado o preceito constitucional de proteção.
Essa órbita de proteção passa pela valorização da Secretaria Nacional do Consumidor Senacon (criada pelo Decreto 7.738, de 28 de maio de 2012), na esfera da União, e pela atuação na proteção do consumidor pelos Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios.
Neste contexto, é indispensável a valorização dos Procons Municipais, com a estruturação adequada, quadro capacitado e nomeação de profissionais competentes para sua Direção. A atuação dos Procons nos Municípios é forma eficaz de aproximar do consumidor a cadeia de proteção fixada na Constituição e no CDC.
O Dia Mundial é uma data para celebrar, mas, acima de tudo, é uma data para reforçar a defesa do consumidor. A atualidade apresenta temas preocupantes para o consumidor, como cobrança de bagagens nas viagens aéreas, questões envolvendo financiamento imobiliário, diferenciação de preço de pagamento à vista e no cartão de crédito, publicidade infantil, planos de saúde, exploração do consumidor idoso, crédito consignado, superendividamento, dentre outros.
Por isso, é importante destacar que, conquanto o consumidor seja indispensável no sistema econômico do Brasil, diante de sua vulnerabilidade e hipossuficiência, se não protegido, jamais gozará do desenvolvimento econômico ou social que o país persegue.
De 1962 a 2017 são passados 55 anos. A lição de Kennedy persiste, e na celebração do Dia Mundial do Consumidor, a melhor homenagem é a determinação em busca de uma proteção equilibrada, correta e eficaz, qual feita pelo Código de Defesa do Consumidor. A efetivação de seus princípios e a garantia de suas normas são a correta via para se cumprir a Constituição Federal, a qual determinou ao Estado promover a proteção do consumidor.
* Juiz de Direito, membro do BRASILCON e do IAMG.
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