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18 de fevereiro, de 2017 | 11:30

Reforma, Mick Jagger e a realidade da Previdência Social brasileira

Murilo Aith

Divulgação
Trabalhar pra sempre.

Sim, essa é a máxima defendida pelo Governo Federal, que está atuando fortemente nos bastidores para empurrar goela abaixo do povo as propostas atuais da reforma da Previdência. Um capítulo recente dessa ofensiva foi a capa da revista Exame que estampou o lendário e bilionário vocalista da banda Rolling Stones, Mick Jagger, como modelo de pessoa que trabalha após os 65 anos, idade mínima exigida para se aposentar na visão da equipe econômica de Michel Temer.

A publicação, em resumo, veiculou uma matéria que defende que o brasileiro deve se preparar para trabalhar até o fim de seus dias. Na chamada para a matéria nas redes sociais, a revista disse que não devemos mais pensar que se aposentar é ir descansar na praia. Um discurso no qual a equipe de Temer investe pesado para tornar sólido. A artilharia do Governo Federal vai de uma ampla publicidade na TV, na internet e nas redes sociais, a números maquiados da atual situação do sistema previdenciário brasileiro.

Mas apesar de todas as falácias governamentais, a comparação da revista do aposentado brasileiro com Mick Jagger é, no mínimo, irresponsável. É lógico que o vocalista de uma das maiores bandas de rock de todos os tempos só trabalha por que quer. Jagger acumula uma fortuna de bilhões de dólares e, conforme circula pela internet, recebe, desde 2008, 91 libras semanais, o equivalente a R$ 285 reais, como aposentadoria do governo britânico.

Só esse valor de aposentadoria já superaria, sem dúvida, a realidade de maioria dos aposentados, pensionistas e trabalhadores brasileiros. E, obviamente, não dá para comparar a estrutura social – saúde, emprego, educação etc. – dos brasileiros com os britânicos.

O Brasil tem hoje pouco mais de 19 milhões de aposentados pelo INSS, segundo a Secretaria da Previdência Social. Atualmente, o brasileiro se aposenta, em média, aos 58 anos. E de cada três aposentados, dois ganham um salário mínimo. E, certamente, a maioria deles não vive dignamente, pois um salário mínimo não garante o sossego, de acordo com a revista Exame, de viver tranquilamente na praia. Isso porque não temos uma estrutura social que permita que qualquer cidadão tenha um mínimo de qualidade de vida com um benefício mensal de R$ 937,00.

E o mais absurdo é que a proposta atual da reforma propõe que, no caso das pensões por morte, por exemplo, sejam pagos benefícios abaixo do salário mínimo. Você consegue imaginar os filhos de Mick Jagger sobrevivendo com menos de R$ 937,00 por mês?

O Governo Federal deveria, ao invés de tentar acelerar e aprovar a fórceps a reforma da Previdência, revelar de forma transparente os números do sistema previdenciário brasileiro. Ao contrário do que é “vendido” pela equipe econômica aos meios de comunicação – que compram o engano -, a Previdência brasileira é superavitária. Não existe déficit. Estudos da ANFIP e de acadêmicos, como a professora Denise Gentil, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, constatam que, nos últimos dez anos, a Previdência Social brasileira é superavitária.

Além disso, porque em um sistema deficitário e com rombo bilionário, o Governo Federal enviaria uma proposta ao Parlamento, fazendo com que a Desvinculação das Receitas da União (DRU) subisse de 20 para 30% da arrecadação tributária e previdenciária, que em si implica em uma renúncia aos cofres da previdência na ordem de R$ 110 bilhões ao ano? Exatamente porque o sistema tem uma arrecadação positiva, sem contar que o governo também não cobra os grandes devedores da Previdência.

Precisamos, portanto, deixar às claras que o brasileiro pode e deve sonhar com uma aposentadoria digna, após décadas de trabalho. E não ter que trabalhar por, no mínimo, 65 anos de vida, e 49 anos de contribuição com o INSS para receber um benefício integral. Isso não condiz com a realidade do país. Devemos endurecer e manter a luta, de pé, para que as propostas da reforma sejam amplamente debatidas com a sociedade. E que a reforma, nos moldes atuais, não seja aprovada em prol do futuro de uma geração de brasileiros que correm o risco de morrer em seus postos de trabalho.

* Advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
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