10 de fevereiro, de 2017 | 14:16

Somos todos Usiminas

Olavo Machado

Não há, por certo, um único brasileiro que não conheça a Usiminas e não saiba de sua importância para o Vale do Aço, para Minas Gerais e para o Brasil. Os mais antigos, que viveram no final dos anos 50 do século passado, começo dos anos 60, acompanharam o nascimento da empresa na gestão do então presidente Juscelino Kubitschek. A Usiminas, com certeza, é fruto da tenacidade e obstinação de lideranças empresariais e políticas de Minas Gerais e de uma vitoriosa parceria com os japoneses da Nippon Steel. À sua fundação, seguiram-se anos e décadas de crescimento, modernização e diversificação da economia e da indústria mineira, com efetiva participação da Usiminas.

Pelos livros de história econômica e pelas lições nos bancos escolares, os mais jovens também conhecem a história da Usiminas. Nos anos recentes – "ao vivo" – tiveram a oportunidade de acompanhar o ingresso dos ítalo-argentinos da Techint/Ternium (T/T) no grupo de controle da empresa, ao lado da Nippon, no final de 2011. Foi um momento de euforia, pois são bem conhecidas a liderança e competência do grupo T/T na produção de aço, sem contar que já eram parceiros da Usiminas há vários anos. A crise mundial deflagrada em 2008 começava a se agravar no Brasil. Neste cenário hostil, a chegada da Techint/Ternium constituiu-se em um reforço e tanto para a nossa Usiminas.

Hoje, mineiros de todas as idades se unem para lamentar a postura belicosa dos sócios controladores da Usiminas e, sobretudo, para cobrar solução para um conflito que vai se transformando em confronto e ameaça gravemente a saúde econômica, financeira e técnica de uma das maiores empresas do Brasil, de Minas Gerais e do mundo. De fato, Minas Gerais e os mineiros não aceitam que em nome de interesses incompreensíveis do ponto de vista econômico se coloque em risco um patrimônio cuja construção exigiu grandes sacrifícios dos mineiros e cuja preservação é vital neste momento em que a crise econômica atinge fortemente a economia do estado, levando ao fechamento de empresas e à extinção de centenas de milhares de empregos.

Na busca de uma solução, a análise dos fatos recomenda considerar que hoje, na composição acionária da empresa, o maior acionista é o Grupo Techint/Ternium, seguido pela brasileira CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) e, em seguida, pela Nippon. Também é preciso observar que 60% da dívida total da empresa é financiada por bancos brasileiros: BNDES, Banco do Brasil, Bradesco e Itaú. E é natural que, considerando a importância da empresa e do negócio, os bancos contribuam para viabilizar o capital necessário, mesmo correndo riscos. Vale dizer: somos parceiros efetivos da Usiminas e a contrapartida que se exige dos seus acionistas controladores é compromisso. Em outras palavras: eles não têm o direito de colocar em risco, em consequência de seus desentendimentos, uma empresa do porte e da importância econômica e social da Usiminas, com prejuízos evidentes para o nosso país.

Neste imbróglio que precisa ser resolvido com urgência, é positivo constatar que a Nippon e a Techint/Ternium estão tentando avançar na busca do entendimento, que lhes permita recuperar a competitividade da joia que têm em mãos e, ao mesmo tempo, construir um modelo de governança que assegure o resgate da personalidade de empresa-cidadã que a Usiminas sempre se orgulhou de ter ao longo de sua história. Este é o caminho correto para devolver ao Brasil, a Minas Gerais, ao Vale do Aço – e também à sociedade mineira e brasileira – um pouco do muito que lhes tem sido proporcionado há mais de meio século (Nippon) e nos últimos anos (Techint/Ternium). Com bom senso e efetiva disposição para o entendimento, será possível chegar a um acordo que seja bom para todos.

As últimas notícias indicam que os controladores da Usiminas estão se acertando em pontos que até muito pouco tempo eram motivo de discórdia: a Nippon defende um modelo em que representantes de cada um dos grupos se alternariam no comando da empresa – a Techint/Ternium está de acordo (1); a Techint/Ternium quer indicar um nome de sua preferência para a presidência, e propõe um profissional que está na empresa há 40 anos, conhece bem a área comercial e que, na recente oportunidade que teve de presidi-la por curto período, mudou positivamente os seus resultados financeiros – e a Nippon concorda com a indicação. Esta performance foi possível em razão do trabalho desenvolvido por seu antecessor, indicado pela Nippon, que também é funcionário de carreira da Usiminas, com larga experiência (2); e, como deseja a Nippon, o Grupo T/T concorda que o atual CEO continue como conselheiro da Nippon (3).

Como se vê, há avanços reais e importantes, mas ainda existem pedras no caminho. Nas negociações recentes, visando assegurar que os bancos credores renegociassem os financiamentos, foi acordado que os acionistas capitalizariam a empresa (R$ 1 bilhão) e que, para isso, seria utilizado o capital da Usiminas aplicado na Mineradora Usiminas (MUSA), cuja produção é, praticamente toda, vendida à própria empresa. São R$ 700 milhões que a Usiminas tem no capital da Musa, empresa que tem como sócio outro grande grupo japonês, que também retiraria seu capital na Musa. O sócio japonês discordou e novamente emperrou as negociações. A Nippon muito ajudaria se atuasse para concretizar essa operação.

Há outras "pedras" no caminho. Falta consenso em questão bastante razoável e que merece reflexão: a Nippon explicita dificuldades para aceitar a inclusão, no acordo de acionistas, de uma cláusula de "resolução de conflitos", também chamada "cláusula de saída", proposta pelo Grupo T/T. Mais uma vez, é preciso bom senso e boa vontade para pôr fim a uma guerra que já dura quase três anos e posterga a solução de problemas, com visível desgaste e prejuízos para os grupos controladores, para os demais acionistas, investidores, funcionários, clientes, fornecedores e toda a comunidade do Vale do Aço, de Minas e do Brasil. Insensíveis aos interesses de todos, os gigantes do aço só pensam na sua briga particular – e isso, exatamente, é o que não pode continuar acontecendo.

O que os mineiros e brasileiros esperam é que os grupos Nippon e Techint/Ternium terão boa vontade e sensibilidade para, por exemplo, rever a cláusula do acordo de acionistas, antecipando a sua validade de 2031 para 2022. A Usiminas, Minas Gerais e o Brasil não podem esperar indefinidamente. Para a empresa, além dos compromissos financeiros a quitar, paira a ameaça da obsolescência de suas máquinas e equipamentos. Certamente, na era da tecnologia e da inovação, estes ativos não podem esperar o final da validade do acordo – terão que ser descartados antes. Este é o cenário que não podemos mais aceitar, pois nele todos perdem.

Além de colocar em risco o conceito de empresa-modelo que a Usiminas construiu ao longo de mais de meio século de exemplar existência, o conflito também ameaça centenas de micro, pequenas e médias empresas fornecedoras dela, sobretudo no Vale do Aço. São todas empresas criadas em razão direta da existência da Usiminas, em todos os setores da economia – no comércio, no setor de serviços, no agronegócio e muito especialmente no setor industrial. É um prejuízo imensurável, que atinge milhões de pessoas e diante do qual a Nippon e o Grupo T/T não podem se omitir, sob pena de virem a ser cobrados severamente.

A expectativa é que a próxima rodada de negociação ocorra em um ambiente de boa vontade e de real interesse em encerrar uma contenda estéril que já se arrastou por tempo demais. Temos plena confiança que, pela grandeza que têm e por sua história, a Nippon e o Grupo Techint/Ternium caminharão nessa direção. Afinal, não pode restar dúvida: nesta disputa, que nem deveria ter começado, somos todos Usiminas.

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