01 de março, de 2015 | 00:00

Legado do caso Rodrigo Neto

Jurista destaca intolerância da sociedade com chacinas. “Crimes cessaram, mas é preciso avançar mais”, resume


IPATINGA – No dia 8 de março completou dois anos que dois homens em uma motocicleta decidiram que o repórter Rodrigo Neto não relataria mais os fatos ao público.

Passados 24 meses da execução, até hoje a Polícia Civil de Minas Gerais não definiu quem foram os mandantes e a motivação do homicídio. Em meio a dúvidas, dois homens estão presos, um já condenado pelo crime, e outro prestes a sentar-se no banco dos réus.

Rodrigo Neto de Faria, 38 anos, morreu com três tiros que lhe acertaram a cabeça, peito e costas. Um amigo, que tinha saído com o repórter de um bar, na avenida Selim José de Sales, bairro Canaã, também foi alvejado por tiros, mas não foi atingido. O repórter era casado e deixou a mulher um filho, na época com sete anos.

Decorridos dois anos do crime, o investigador de Polícia Civil, Lúcio Lírio Leal, atualmente com 24 anos, foi o único a sentar-se no banco dos réus. O Tribunal do Júri o considerou culpado na acusação de ter dado apoio informando a localização da vítima ao atirador.

No dia 28 de agosto de 2014, o ex-policial civil foi sentenciado a cumprir 12 anos de cadeia pelo crime. A defesa recorreu da sentença, mas o TJMG negou provimento ao recurso, informou ao Diário do Aço um dos advogados que atuou na defesa do condenado, Silvestre Antônio Ferreira. 
TV Record/ Reprodução


délio gandra


Falta o julgamento de Alessandro Neves Augusto, o Pitote, homem que atuava nos bastidores da Polícia Civil na região, mesmo sem pertencer aos quadros da instituição. Para o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e o Ministério Público, Pitote puxou o gatilho contra Rodrigo Neto, na madrugada de 8 de março, e contra o fotógrafo Walgney Carvalho, em 14 de abril, em Coronel Fabriciano, em uma “queima de arquivo”.

No caso do repórter assassinado em Ipatinga, indagações como “quem mandou matar?”, “por que motivo?”, “quem pilotava a moto que levou o atirador?”, permanecem sem respostas.

Questionada sobre o assunto na semana que passou, a assessoria da Polícia Civil em Belo Horizonte limitou-se a repetir a resposta que diz o seguinte. “Existe em andamento um inquérito complementar no DHPP para apurar o caso, sob a responsabilidade do delegado Emerson Morais. Nada pode ser revelado, porque o caso encontra-se sob sigilo”.

Intolerantes

Wôlmer Ezequiel


Rodrigo Márcio

Para o jurista Délio Gandra, não há que se questionar as provas que permitiram a condenação do ex-investigador Lúcio Lírio e vão condenar o falso policial Alessandro Neves, o Pitote. Na avaliação do advogado, o grande exemplo deixado com o caso é a intolerância da sociedade para com crimes dessa natureza.

“As pessoas já não suportavam mais os ilícitos praticados por agentes que tinham a obrigação de coibir o crime, policiais civis e militares, que executavam pessoas de forma sumária, sem julgamentos. E tanto é que, do Caso Rodrigo Neto, vários dos envolvidos com as execuções foram investigados, denunciados, afastados de suas funções e estão sendo processados, como nunca antes havia acontecido”, afirmou.

Délio Gandra acrescenta que não ficou surpreso ao ser informado, recentemente, que apesar da redução da ação dos grupos criminosos, ainda há ingerências sobre a divulgação de determinados assuntos relacionados aos agentes de segurança.

“É lamentável, porque o ato de informar é um direito democrático e uma atribuição do jornalista. Os profissionais e os diretores não podem aceitar esse tipo de imposição. Em Ipatinga, o índice de crimes foi tão crescente que isso só poderia ter participação de pessoas poderosas dentro das corporações e fora delas. Cessou, mas precisamos avançar mais”, destacou.

Gandra acredita que Pitote vai pegar uma pena muito maior do que a imputada ao ex-investigador Lúcio Lírio. Condenado a 12 anos de prisão, o ex-policial não tinha antecedentes graves, embora respondesse por infrações junto à corregedoria. “Não é essa a realidade de Pitote, que tem antecedentes de crimes contra a vida, fazia se passar por policial, dava buscas em pessoas, usava documento falso de policial e tinha trânsito livre dentro de uma delegacia”, concluiu.

Wôlmer Ezequiel


Pitote
Defesa mantém a negativa de autoria

O advogado que atua na defesa de Alessandro Augusto Neves confirma que o seu cliente deverá ir a julgamento a qualquer momento, na Comarca de Ipatinga, onde é acusado de homicídio qualificado contra Rodrigo Neto e tentativa qualificada de homicídio contra L.H.O.O., que estava com o radialista. Com questionamento das provas, o advogado Rodrigo Márcio do Carmo Silva recorreu da pronúncia. O TJMG negou provimento e o processo está nos trâmites finais que precedem o agendamento do julgamento.

“Nós mantemos a tese da negativa de autoria. Já apresentamos ao Judiciário as provas do envolvimento de outra pessoa nesse crime, que foi investigado no calor dos fatos, diante de uma comoção popular e um cenário político desfavorável a uma apuração bem feita. Temos um crime grave, com dois acusados e sem definição do mandante e da motivação. Nunca perdi a esperança de uma reviravolta em tudo isso”, detalhou Rodrigo Márcio.

Carvalho

Em Coronel Fabriciano, onde Alessandro Neves Augusto responde processo pela acusação de homicídio qualificado no assassinato do fotógrafo Walgney Assis Carvalho, o juiz da Vara Criminal responsável pelo caso, Vitor Luís de Almeida, também expediu a pronúncia de sentença, no dia 17 de setembro, o que significa que o processo está pronto para mandar o réu ao julgamento popular.

Pitote alegou que é inocente, mas o magistrado acatou a denúncia do Ministério Público e cita indícios de autoria, como laudo de necropsia, gravações em telefone celular e o exame de balística que aponta o uso da mesma arma da qual saíram os tiros que assassinaram o repórter Rodrigo Neto, 38 dias antes.

"Também recorremos da pronúncia de sentença ao TJMG, que deverá julgar o nosso pedido nos próximos dias. Esperamos a anulação porque também no Caso Carvalho o meu cliente nega a autoria", explica o advogado.

Wôlmer Ezequiel


Francisco angelo
Para MP, há mais executores no crime

O promotor de Justiça, Francisco Ângelo Silva Assis, lamenta que, passados dois anos, os dois acusados não tenham mudado a postura no sentido de mostrar arrependimento e relatar os demais envolvidos no caso. “Pior ainda é ver essa insistência de versões fantasiosas para tentar ludibriar a opinião pública”, afirma o promotor.

Francisco Ângelo também observa que, a partir do trágico caso do jornalista, não se registrou no Vale do Aço mais nenhuma chacina ou execução sumária com suspeita de envolvimento de policiais. “Acreditamos que, a partir desse caso, o que temos é o trabalho policial comprometido em combater o crime, mas sem admitir qualquer ato criminoso ou de abuso. O MP acredita que a maioria dos policiais é formada por agentes íntegros e cientes do seu dever, inclusive, que seus atos públicos se sujeitam à fiscalização popular”, enfatizou.

O promotor também lembrou que muitos policiais, tanto civis, quanto militares, respondem administrativamente ou no âmbito penal por ações indevidas no passado. “Percebemos que temos comandos nas duas polícias, intolerantes com relação aos desvios e isso acabou com os atos ilícitos tão comuns no passado”, destacou.

Questionado se não há incômodos em atuar em um caso em que não se conhece até hoje o mandante e a motivação, o promotor admitiu a possibilidade de não existir um mandante, mas afirmou que, certamente, o crime tem outros executores, inclusive, o condutor da motocicleta que levou o assassino até Rodrigo Neto.  

LEIA MAIS SOBRE O CASO:

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